Expectativa

Artistas pernambucanos falam sobre perspectivas para a área em 2021

Criadores enxergam com otimismo o início da execução dos projetos beneficiados pela Aldir Blanc, mas falam em incertezas

Márcio Bastos
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Márcio Bastos
Publicado em 01/01/2021 às 6:00
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Pedro Wagner, Cida Pedrosa, Isaar, Ana Lira e Camilo Cavalcante reforçam a importância do fortalecimento das políticas públicas para o fomento da cultura - FOTO: DIVULGAÇÃO
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Os desafios impostos à área de cultura pela pandemia do novo coronavírus marcaram 2020 e ainda irão reverberar neste ano que se inicia. Mas, com, entre outros, a excecução de projetos aprovados pela Lei Aldir Blanc e a perspectiva de vacinação ao longo do ano, artistas, produtores e técnicos têm torcido por um período mais otimista para os próximos 12 meses, porém ainda marcado por incertezas.

Um dos primeiros setores a paralisar as atividades por conta da pandemia, a cultura precisou se reinventar rapidamente. A cadeia migrou em massa para o universo online e praticamente todas as linguagens encontraram uma forma de se aproximar do público, ainda que isso não tenha se revertido, necessariamente, em uma fonte de renda. E mais: deixou claras as desigualdades que existem há décadas e que afetam com mais ênfase a cultura popular e artistas independentes.

"O impacto não é no umbigo de quem cria, mas é na base de sustentação de todo esse sistema que precisa, sim, de incentivo sério e manutenção, porque articula centenas de milhares de trabalhos — e afeta comunidades no País inteiro. Enquanto a criação e a arte forem vistas apenas como entretenimento passageiro, as pessoas nunca vão ter a dimensão da importância dessa rede e do desmonte causado pela sua precarização", ressalta a artista visual e curadora Ana Lira.

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ARTES VISUAIS Ana Lira, artista visual, aponta a necessidade de fortalecer as ações da Lei Aldir Blanc - PRISCILLA BUHR/DIVULGAÇÃO

Nesse sentido, a aprovação da Lei Aldir Blanc, que direcionou os recursos do Fundo Nacional de Cultura para ações emergenciais, foi considerada uma vitória essencial para auxiliar toda a cadeia produtiva. Agora, grande parte dos projetos aprovados nos editais deve começar a ser executado, movimentando novamente o setor.

"A Lei Aldir Blanc é uma nova proposta de política pública. Foi uma lei discutida a muitas mãos. É a primeira vez que se tem um exercício de execução de recurso do Fundo Nacional executado diretamente por municípios e estados, sem ser via editais da própria União. Acho que esse modelo deve ser copiado para a futura política pública de democratização dos recursos", reforça a escritora Cida Pedrosa. "As incertezas continuam porque a lei não resolve um ano, e sim emergencialmente. Enquanto não houver a vacina e a gente puder estar na rua exercendo o ofício de artista, estaremos nesse pêndulo de dificuldade."

Ana Lira reforça que a cultura precisa ser enxergada como as outras cadeias produtivas e, assim, receber o tipo de estrutura e pensamento a longo prazo que irá necessitar, já que as sequelas da pandemia tendem a se perpetuar por um tempo indeterminado.

"Se, na economia, os especialistas falam que o Brasil vai precisar de anos para se recuperar, como se espera que nas artes, com tantas redes de produtos e serviços afetadas, a recuperação seja imediata diante de uma lei de emergência cultural? A Lei Aldir Blanc precisa ser o começo desse investimento, e não o único. Ela precisa ser fortalecida por diversas outras políticas públicas que atenuem o impacto da pandemia no cotidiano dessas redes. Cultura é saúde, educação e economia também!", destaca a artista visual.

HUMBERTO REIS/DIVULGAÇÃO
MÚSICA Isaar visualiza um início de ano movimentado para o setor - HUMBERTO REIS/DIVULGAÇÃO

Para a cantora Isaar, com a execução das políticas emergenciais, os artistas poderão começar este ano com algum tipo de segurança. No caso do setor da música, a possibilidade de criação de conteúdo para as plataformas digitais foi essencial para amenizar os efeitos da crise em 2020, o que deve permanecer, já que não há previsão do retorno efetivo e seguro dos show presenciais (ainda que várias apresentações de pequeno, médio e grande porte estejam acontecendo em todo o País, provocando aglomerações e falta de respeito aos protocolos).

"O ano de 2021 já começa cheio de produções. A Lei Aldir Blanc movimenta toda a cadeia, estúdios, técnicos... e, principalmente, ideias e projetos. Se os governos apenas mantiverem de forma remota seus eventos e organizarem para que os fundos já previstos para a cultura cheguem nas mãos dos fazedores desse setor, será um ano muito próspero, abrindo possibilidades criativas em vários aspectos da sociedade", enfatiza.

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LITERATURA Cida Pedrosa espera que hábito de leitura permaneça - DIVULGAÇÃO

Em relação à literatura, Cida Pedrosa, que em 2020 venceu na categoria de Poesia no Prêmio Jabuti, chamou a atenção para o crescimento do hábito de leitura durante a pandemia, refletido também no aumento das vendas de livros online.

PRESENÇA

As artes da cena, pautadas na presença, talvez tenham sido as que mais precisaram se adaptar e, no processo, criaram híbridos com outras linguagens. Foi o caso do experimento cênico do Grupo Magiluth, que utilizou as plataformas digitais para criar um produto novo, que não era teatro nem audiovisual. Essas experiências devem permanecer ocorrendo enquanto o retorno aos teatros não for possível.

"Existindo uma vacinação, a gente volta [para a cena], e volta explodindo, porque essa necessidade do fenômeno de presentificação da arte, que exige a presença tanto do espectador quanto do artista, está mais gritante. A quantidade de novas dramaturgias e possibilidades, o tipo de teatro que será feito após a pandemia, me instiga. Sou extremamente positivo quanto a essa volta. Acho que voltaremos fortemente, mas para isso precisa de uma vacinação efetiva. O teatro é imprescindível", endossa Pedro Wagner, integrante do grupo pernambucano, que torce para que 2021 seja um ano mais voltado para questões da coletividade.

GIOVANA SOAR/DIVULGAÇÃO
TEATRO Pedro Wagner torce para que 2021 se paute na coletividade - GIOVANA SOAR/DIVULGAÇÃO

No audiovisual, algumas produções começaram a retomar lentamente, mas devido às características do setor, que em geral exige uma equipe técnica mais volumosa, a dinâmica vem sendo repensada para garantir a segurança dos envolvidos. Para o cineasta Camilo Cavalcante, que ano passado foi premiado no Festival de Gramado com o filme King Kong en Asunción, apesar da popularização dos serviços de streaming e da venda online de filmes, só com a imunização coletiva é possível visualizar um retorno de fato.

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CINEMA Camilo Cavalcante, cineasta, prevê normalização do campo audiovisual apenas após vacina - MÁRIO MIRANDA FILHO/AGÊNCIA FOTO

"O que se espera é que quando tiver uma vacina, as salas voltem a atuar com todo o seu potencial. Muitos filmes deixaram de ser lançados, o que vai haver é um grande engarrafamento de estreias. Os streaming são importantes, mas não suprem a demanda, até porque têm interesses específicos em relação aos conteúdos e muitos documentários, obras mais experimentais e alternativas só encontram espaço no circuito do cinema de arte", pontua. "Comecei a trabalhar com audiovisual em 1994, quando o governo Collor acabou com a Embrafilme e o cinema ficou sem nenhum incentivo. Não tenho dúvida de que hoje, com a tecnologia cada vez mais avançada e disponível, muita gente vai se expressar através do audiovisual de forma independente. A arte sempre vai resistir e se expressar."


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