ARTES VISUAIS

Potencial pedagógico do lambe-lambe é tema de cartilha lançada nesta quarta (28)

Material instiga uso das artes urbanas como ferramentas no processo de aprendizagem. Live de apresentação acontece às 19h, no Instagram

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Nathália Pereira

Publicado em 28/04/2021 às 10:00 | Atualizado em 28/04/2021 às 11:47
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Vinte anos atrás, líderes de 164 nações reuniram-se por três dias durante o Fórum Mundial de Educação de Dakar, no Senegal. O evento tinha por objetivo traçar metas e elaborar políticas públicas de investimento na educação básica de qualidade, e acabou dando origem ao Dia Mundial da Educação, comemorado em 28 de abril. Este ano, a data ganha simbologia ainda maior para dois artistas urbanos residentes no Recife e que têm a educação como um dos pilares norteadores de suas criações. Milla Serejo e Tacio Russo lançam hoje, às 19h, a cartilha Lambe-lambe como dispositivo pedagógico, com live transmitida pelo perfil @lambesbrasil, no Instagram.

Voltada a educadores, a cartilha apresenta, em 28 páginas, tópicos que vão da conceituação do lambe-lambe, passando por contextualização histórica e cultural da difusão deste tipo de arte, culminando com a parte prática, na qual papeis, tintas, recortes de jornais e demais insumos são convocados para dar forma aos pensamentos criativos. O objetivo é estreitar o laço entre este setor da arte urbana e a pedagogia, chamando atenção para o potencial de comunicação e inventividade contida em tal aproximação.

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"O lambe-lambe é uma forma de expressão artística característica do ambiente urbano, também conhecido como cartaz ou pôster urbano. A técnica é utilizada para propagar uma ideia, seja ela artística ou comercial, através de frases, ilustrações ou qualquer outra forma de expressão que possa estar sobre um papel (...) podem ser produzidos à mão ou por técnicas de impressão, como a serigrafia (...)", diz trecho de um dos textos da sessão descobrindo a arte do lambe.

Participaram como consultores para a elaboração do material Ariana Nuala, educadora e curadora; Patrícia Naia, professora, escritora e produtora cultural; Luana Félix, atriz, professora de teatro e produtora cultural; Altino Francisco, arte educador, e Alberto Pereira, artista visual e criador da Lambes Brasil, plataforma que há cinco anos fomenta e divulga técnicas e práticas de lambe dentro do contexto artístico nacional.

"Luana, por exemplo, fez um paralelo muito bom entre a cidade e a escola. Foi um estalo para compreender que as escolas, principalmente as de educação integral, são quase o universo inteiro de muitas crianças e adolescentes. Isso acaba fazendo com que tenham pouco contato com a cidade - andar, experienciar. Esse contato, tão importante para a formação como pessoa, é ainda mais distante se você for um jovem periférico" conta Milla Serejo por telefone. As hierarquias existente no ambiente escolar e no acesso - ou na falta de - à cidade, se assemelham, destaca a artista.

A live de lançamento terá conversa com Milla e Tacio sobre o processo de criação da cartilha, que conta com apoio do Edital da Lei Aldir Blanc Pernambuco. A mediação será de Bruna Alcântara, da Lambes Brasil, revisora textual do projeto. Logo após a estreia, o conteúdo completo estará disponível para leitura e download gratuitos no site www.cartilhalambelambe.com.br. Uma tiragem impressa será distribuída exclusivamente para escolas municipais, bibliotecas comunitárias e bibliotecas públicas de todo o Estado. 

LABORATÓRIO LABIRINTO

Lambe-lambe como dispositivo pedagógico é o primeiro grande projeto encabeçado pelo Laboratório Labirinto, espaço de pesquisa e criação artística encabeçado por Milla Serejo e Tacio Russo há pouco mais de um ano. A ideia de criá-lo partiu da afinidade profissional entre ambos, apurada já pouco tempo depois de Milla, que é potiguar, ter chegado por aqui.

"Milla é designer, eu escrevo bastante sobre teatro, corpo e texto (Tacio é formado em audiovisual pela OiKabum! Escola de arte e tecnologia e atualmente estuda licenciatura em teatro na Universidade Federal de Pernambuco - UFPE), então passamos a trocar bastante informação e a fazer intervenções na rua", conta Tacio Russo à reportagem. "Percebemos que a coisa do ambiente urbano, do espaço público, era algo que tocava a nós dois e que esses ambientes podem ser mais do que o grafite, o mural, ou do que [espaços] pensados apenas por urbanistas e arquitetos. Chegamos nesse lugar de pensar educação, arte e pesquisa voltadas para e influenciadas pelo ambiente urbano".

Antes da execução da cartilha, o Laboratório Labirinto realizou, a convite do coletivo de urbanistas Massapê, uma ação de revitalização na comunidade Entra Apulso, na Zona Sul da capital. Valorização da memória e ampliação da noção de pertencimento foram o mote do exercício, muito bem recebido pelos moradores, apesar das restrições de proximidade necessárias por conta da pandemia. "Foi muito rico, quase uma residência", destaca Tacio.

Entre as criações, elaboradas em dois momentos, entre o final de 2020 e início de 2021, está um mural de quase três metros de altura retratando Dona Rita, uma das mais antigas moradoras da Entra Apulso e figura fundamental no dia a dia do bairro: é ela quem recolhe e entrega as correspondências onde o serviço oficial dos correios não chega.

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Todo o trabalho da Laboratório Labirinto, incluindo a cartilha que chega hoje ao público, bate na tecla de que as artes urbanas, principalmente as ainda estereotipadas como marginais, muito têm a contribuir com a reivindicação de pertencimento e reflexões sobre ocupação de espaços - físicos ou não. 

"A arte existe, dentre outras muitas coisas, para que possamos refletir a respeito do que acontece entre a gente. Se não fazemos isso com algo que nos é contemporâneo, como a arte urbana, que é vista pelo policial, pelo aluno, pelo professor, perdemos a chance de entender muito do contexto atual. A escola é um núcleo do ambiente urbano, é uma mini cidade. Então, como é que não vamos discutir o macro dentro desse mini?", questiona Tacio Russo.

SERVIÇO

Lançamento da cartilha virtual Lambe-lambe como dispositivo pedagógico + conversa ao vivo com os realizadores - mediação de Bruna Alcântara. Quarta-feira (28/4), às 19h, no perfil @lambesbrasil (Instagram). Acesso gratuito.

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