Clara Moreira exercita a liberdade de fabular em exposição na Amparo 60
Mostra é a primeira individual da artista recifense em sua cidade natal
Em seus trabalhos, Clara Moreira trabalha com temas e figuras que evocam elementos oníricos, mas que, mesmo convidando para a abstração, não se descolam do tempo em que foram produzidas. A sensibilidade da artista recifense para o mundo que a cerca está sempre aflorada e, por isso, os trabalhos presentes em Ato-desato são, também, fruto da crise política e de saúde na qual o Brasil está imerso. A mostra, a primeira individual da artista no Recife, é aberta nesta sexta-feira (18), na Amparo 60, em Boa Viagem, dentro do projeto Mirada.
Ao começar a conceber a exposição, logo nas conversas iniciais com a curadora Sofia Lucchesi, Clara percebeu que seria importante fazer um recorte temporal em produções recentes, que capturassem as suas inquietações atuais. Para ela, esses trabalhos são reflexos de um peso que habita o seu cotidiano na pandemia e também o imaginário coletivo, ao mesmo tempo em que carregam uma leveza que é própria da sua maneira de interpretar o mundo.
"Esses trabalhos são feitos dentro desse momento histórico, em que a gente está vivendo todas as contingências de um processo pandêmico, em um lugar como o Brasil, com muita força negacionista e desorganização política. E eu estou mergulhada nesse processo porque vivo, com muita sensibilidade, essa travessia. Os desenhos são filhos desse tempo e desse momento, sem até que eu precisasse falar disso, as pessoas identificariam [se tratar de obras de agora]. Tem uma gravidade, uma pulsão que reflete esse peso do momento", pontua a artista.
Apontada como uma das 20 artistas de destaque no Brasil em editorial da SP-Arte, em 2020, e, no mesmo ano, selecionada pelo programa Convida, do Instituto Moreira Salles, e para o Salão Único de Artes do SESC Pernambuco, Clara tem no desenho sua forma de expressão e, neste conjunto de trabalhos, seu processo criativo é um dos eixos temáticos. Um autorretrato em tamanho real, representando a artista no ato de desenhar, é, inclusive, um dos destaques da mostra.
Entre as obras expostas como polípticos estão ainda figuras das Pássaras, presentes em seu trabalho há alguns anos, e as experimentações com os grafismos de fitas de cetim. Seu uso minucioso do lápis de cor, que fabula corpos híbridos, passeia entre o realismo e o sonho, propõe um convite ao diálogo, questão primordial para a sua criação.
"Cores, composições e geometrias são personagens, elementos de uma gramática que estou friccionando um pouco mais nessa exposição", explica. "Quando estou desenhando, tenho o desejo de conversa com o público."
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