Autor de artigo polêmico sobre Marília Mendonça na Folha é professor da UFPE
O historiador Gustavo Alonso publicou o artigo "Marília Mendonça, rainha da sofrência, não soube o que é o fracasso", criticado por menções ao corpo do artista
Um artigo de análise da carreira da cantora Marília Mendonça publicado no jornal "Folha de S. Paulo", no último sábado (6), gerou revolta nas redes sociais. Intitulado "Marília Mendonça, rainha da sofrência, não soube o que é o fracasso", o texto assinado pelo historiador fluminense Gustavo Alonso foi criticado, principalmente, por trechos em que ele discorre sobre a estética corporal da artista, que faleceu num trágico acidente aéreo na última sexta-feira (5). Leitores acusam o autor de misoginia e gordofobia.
"Marília Mendonça era gordinha e brigava com a balança. Mais recentemente, durante a quarentena, vinha fazendo um regime radical que tinha surpreendido a muitos. Ela se tornava também bela para o mercado. Mas definitivamente não foi isso que o Brasil viu nela", diz o trecho. Ainda antes desse parágrafo existe outro trecho bastante comentado: "Nunca foi uma excelente cantora. Seu visual também não era dos mais atraentes para o mercado da música sertaneja."
Desde a publicação, as redes sociais de Gustavo Alonso vêm sendo bombardeadas por críticas. Como respostas, a Folha de S. Paulo também publicou os artigos "Mulheres são julgadas pela aparência até quando morrem", de Mariliz Pereiras Jorge, e "Gordofobia não perdoou Marília Mendonça nem no dia da sua morte", de Bianka Vieira.
Nas redes, há até quem sugira a "demissão do jornalista da Folha". Contudo, a principal ocupação do autor não é no jornal, visto que ele colabora com artigos de opinião, quase sempre sobre a sua especialidade: a música sertaneja. Gustavo Alonso é professor efetivo da Universidade Federal de Pernambuco no Centro Acadêmico do Agreste, em Caruaru, onde leciona no curso de Comunicação. No campus do Recife, também atua no curso de Pós-Graduação em Música (PPGM-UFPE).
Ele é doutor em história pela Universidade Federal Fluminense (UFF), tendo escrito a tese "Cowboys do Asfalto: Música sertaneja e modernização brasileira", apresentada em 2011 e publicada ampliada em livro pela editora Civilização Brasileira, em 2015. A obra resgata histórias e polêmicas sobre o gênero musical.
Alonso também é autor de "Simonal: Quem não tem swing morre com a boca cheia de formiga" (Record, 2011), que aborda o artista que foi acusado de ser dedo-duro da ditadura dos anos 1970. Esse livro foi resultado do seu mestrado em história, obtido em 2007, também na UFF.
No Instagram, onde vem recebendo uma enxurrada de comentários por conta do artigo na Folha, Alonso publicou uma capa do livro sobre Simonal e escreveu: "Para quem gosta de patrulha ideológica, recomendo o livro "Simonal: quem não tem swing morre com a boca cheia de formiga", de minha autoria. Publicado em 2011, ANTES, MUITO ANTES dessa onda de cancelamentos bobos e simplistas!".
A reportagem do JC entrou em contato com Gustavo Alonso, que preferiu não dar entrevista.
Além do artigo, ele participou do podcast "Café da Manhã”, da "Folha de S. Paulo", onde discorreu mais sobre a afirmação de que "ela não era uma boa cantora". "A Marília Mendonça não era uma excelente cantora como era a Maiara e Maraísa, que são cantoras, inclusive, que estudaram e fizeram universidade de música. Marília Mendonça faz parte de uma tradição de cantautores, que na MPB é muito forte. São cantores que eram compositores, na verdade, e que por uma composição histórica, determinados motivos pessoais, ou da sua época, se tornaram cantores também da própria música", explicou.
Em entrevista ao canal de YouTube "MyNews", com Juliana Braga, ele voltou a discorrer sobre a temática do corpo, mas afirmando que ela quebrou padrões imposto pela mídia. "Gradualmente, ela foi cavando esse lugar aí né, que não era natural para ela, entre aspas, porque ela não correspondia a esses ditames mais óbvios, quase sempre da música mais mercadológica, de beleza, de padrão de magreza e tudo mais. Ela foi cavando aos poucos, muito em função das músicas, da poética da música dela, de tocar em temas sensíveis, muito populares, mas muito sensíveis".
No último sábado, o Diretório Acadêmico de Comunicação Social Álvaro Lins, da UFPE do Agreste, publicou uma "carta aberta" a Gustavo Alonso. "Nosso curso, professor, é composto majoritariamente por mulheres, alunas e professoras no qual você convive todos os dias, alunas que você deveria ensinar e educar. O nosso DACO inclusive, é composto em sua maioria por mulheres, e é justamente por isso que escrevemos sobre a nossa indignação e decepção quanto a sua postura. Como professor, o senhor deveria saber o quanto o que o senhor escreveu foi errado, insensível e preconceituoso."
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"Deixamos aqui, a indignação dos alunos do Curso de Comunicação Social da UFPE do CAA, o senhor nos decepcionou imensamente. Afirmamos ainda que não compactuamos com este seu pensamento machista e gordofóbico. Esperamos que o senhor repense suas atitudes e falas, porque nós não aceitaremos um professor insensível e preconceituoso", encerra o texto.