ÚLTIMO SHOW

Em show de despedida, Milton Nascimento chora, canta com amigos e homenageia Gal Costa

Nesse domingo (13), no estádio do Mineirão lotado, Bituca colocou um ponto final em suas apresentações ao vivo, depois de uma carreira de seis décadas

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Amanda Azevedo

Publicado em 14/11/2022 às 12:16 | Atualizado em 14/11/2022 às 12:21
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Por Danilo Casaletti, da Estadão Conteúdo 

Visivelmente emocionado, Milton Nascimento dedicou sua última apresentação nos palcos à cantora Gal Costa, que morreu no último dia 9 de novembro. No domingo (13), no estádio do Mineirão lotado - a produção divulgou um público de 60 mil pessoas - Bituca colocou um ponto final em suas apresentações ao vivo, depois de uma carreira de seis décadas.

O ato derradeiro de A Última Sessão de Música, a turnê que percorreu cidades do Brasil, Estados Unidos e Europa durante todo este ano, reuniu os principais sucessos da longa discografia do cantor e compositor carioca/mineiro. Estiveram no roteiro canções como Morro Velho, Travessia, Encontros e Despedidas, Cais, Coração de Estudante, Cálix Bento, Tudo o que Você Podia Ser e Canção da América.

No meio da apresentação que durou mais de duas horas, Milton chamou ao palco companheiros de tempos de Clube da Esquina - neste ano, o volume um do Clube, de 1972, foi eleito o melhor disco da música brasileira por um júri convidado pelo projeto Discoteca Básica.

Os músicos Wagner Tiso, Lô Borges, Beto Guedes e Toninho Horta dividiram com Bituca as músicas Para Lennon e McCartney e Um Girassol da Cor de Seu Cabelo. Ausências sentidas, entre os convidados, foram Joyce Moreno e Alaíde Costa, duas vozes femininas que têm histórias marcantes com o Clube da Esquina e, sobretudo, com Milton.

Outro convidado de Bituca foi Samuel Rosa. Juntos, eles relembraram mais uma do Clube, Trem Azul, composição assinada por Lô Borges e Ronaldo Bastos, este último letrista importante dentro da obra de Milton, assim como Fernando Brant (1946/2015). Para o último, Bituca soltou um caloroso "Eu te amo!"

A última apresentação de Milton Nascimento, transmitida ao vivo pelo Globoplay, encerrou uma semana difícil e de muita emoção para os fãs de música brasileira.

Isso porque a saída definitiva de cena de Gal Costa, aos 77 anos, e o afastamento de Milton dos palcos, aos 80 anos - o artista promete não deixar de compor e nem de cantar, mas as marcas do tempo já se tornam evidentes em seu corpo físico - colocam em marcha uma mudança de cenário inédita no que se convencionou chamar de MPB - a música popular brasileira.

A MPB e as novas gerações

A geração pós-bossa nova, da qual Gal e Milton fazem parte, não está acostumada às despedidas. As últimas que causaram impacto foram de Elis Regina (1982) e Clara Nunes (1983). Já se passaram 40 anos. Elza Soares, morta em 2021, foi conectada injusta e tardiamente como referência para a geração atual.

Milton e Gal, assim como Gilberto Gil, Caetano Veloso, Maria Bethânia, Paulinho da Viola, Chico Buarque, Edu Lobo, Nana e Dori Caymmi, Ney Matogrosso e tantos outros têm carreiras mais longevas que a geração do rádio ou da própria bossa.

Dalva de Oliveira e Angela Maria, divas que influenciaram Gal, Bethânia, Elis e até Milton, não ressoam diretamente na geração atual. Gal e Milton ficarão por muito tempo na cabeça dos futuros músicos e cantores.

No último show de Milton, o jovem Zé Ibarra, um dos vocalistas da banda Bala Desejo, é um dos seus discípulos. Ele esteve presente na maioria dos shows de Milton como músico e vocal de apoio. Ibarra e seu grupo também se espelham claramente em Gal, Gil, Caetano e Bethânia.

No velório de Gal, o cantor e compositor Silva, gravado pela baiana no disco A Pele do Futuro (2018), rendia homenagem a uma de suas influências musicais. Maria Gadu, que gravou vocais em Cuidando de Longe, canção lançada por Gal também em 2018, sabia do caminho que a cantora baiana abriu para que sua geração pudesse se mostrar livre e inteiramente.

No Mineirão, o público e a equipe de Milton colocaram em prática o mantra das redes sociais: ninguém solta a mão de ninguém. Na despedida de Gal, faltou isso, sobretudo de seus pares da classe artística.

As histórias musicais de Gal e Milton se cruzaram tardiamente, em 1978, quando a cantora gravou Paula e Bebeto, parceria de Bituca e Caetano Veloso. Era a primeira vez que ela gravava Milton, depois de mais de dez anos de carreira. A música é uma celebração ao amor. "Eles partiram por outros assuntos, muitos/ Mas no meu canto estarão sempre juntos, muito", diz a letra. A mais pura tradução deste momento.

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