Abandono do Teatro Valdemar de Oliveira será alvo de protesto; processo de tombamento é aberto
Ato será realizado na Praça Oswaldo Cruz, após uma série de invasões, depredações e furtos; Processo de tombamento tenta impedir que local seja demolido
A situação de abandono do Teatro Valdemar de Oliveira, que vem sendo invadido, depredado e furtado nos últimos anos no Centro do Recife, inspirou um protesto marcado na Praça Oswaldo Cruz, na Boa Vista, onde fica localizado o equipamento.
O "Movimento em Defesa do Teatro Valdemar de Oliveira" será realizado na próxima quarta-feira (27), às 10h. Os nomes à frente da iniciativa são Oséas Borba, José Manoel Sobrinho e José Mário Austregésilo, ligados à comunidade teatral do Estado.
Há 10 anos, o Grupo João Teimoso, do qual Oséas Borba participa, foi responsável por iniciar os atos que pediam a reabertura do Teatro do Parque, já reformado e entregue pela Prefeitura do Recife.
Degradação
Inaugurado em 1971 para ser sede do Teatro de Amadores de Pernambuco (TAP), o Teatro Valdemar de Oliveira é um dos espaços teatrais mais tradicionais da capital pernambucana. Reinaldo de Oliveira, que encabeçou a administração do espaço por décadas, faleceu em 2022.
Nos últimos meses, a imprensa vem relatando um processo de destruição do prédio, que vem sendo invadido por vândalos - sendo utilizado, inclusive, como moradia.
Os associados do TAP, que administram o local, viveram um verdadeiro "cabo de guerra" com os invasores, já que o sistema de segurança eletrônica foi danificado por diversas vezes. Foram roubados troféus, fiações de cobre, telhas de amianto, refletores e muito mais objetos.
A rapidez dessa degradação é impressionante. Em maio, a reportagem do JC visitou o teatro para realizar imagens. Apesar do estado difícil, ainda existia um teto e era possível confirmar que uma reforma mais simples resolveria a situação. Confira as imagens abaixo, feitas em maio:
"A gente fica muito grato pelas manifestações dos artistas. Diante de todas as propostas que estão sendo feitas, estamos vendo a forma de viabilizar a volta do teatro. É importante que fique claro que passamos por três anos de pandemia com o teatro fechado e, mesmo com segurança eletrônica e contas pagas, sofremos mais de sete furtos. Assim, chegou nesse estado. É lamentável que tudo isso tenha acontecido", resumiu Pedro Oliveira, diretor artístico do TAP.
Tombamento
Em meio a toda a polêmica sobre o abandono do local, a Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco (Fundarpe) publicou no Diário Oficial desta sexta-feira (22) uma nota formalizando a abertura do processo de tombamento do teatro.
A medida se amparou na legislação estadual da Lei º 7970/1979. Assim, o espaço seguirá protegido de possíveis demolições até o final do processo. O ofício de solicitação foi entregue pelo Grupo João Teimoso e o Movimento Guerrilha Cultural.
Oséas Borba, do Grupo João Teimoso, ressalta que o tombamento é importante pelos possíveis interesses econômicos no terreno. "Tem uma construtora que comprou uma casa ao lado. O nosso medo era de que uma construtora quisesse comprar o teatro de derrubá-lo. O pedido de tombo iria proibir isso", diz.
Comodato
Em 2022, no final da gestão de Paulo Câmara, a Secretaria de Cultura deu início às tratativas do processo de comodato do Teatro Valdemar de Oliveira ao Governo do Estado.
A proposta inicial era de que o teatro passasse a ser gerido pelo Estado, num sistema de comodato, por um prazo de 19 anos - até 2041, ano em que o Teatro de Amadores de Pernambuco comemora 100 anos. Após esse período, seria feita uma avaliação entre as partes envolvidas para verificar se haveria a continuidade ou não do acordo firmado.
Em maio de 2023, depois que Cristiana de Oliveira, neta de Valdemar, denunciou a situação de degradação à imprensa, novos diálogos foram realizados com o poder público. Naquele momento, a neta expressou a vontade de doar o prédio para acelerar o processo de recuperação.
De acordo com informações de bastidores, a Prefeitura do Recife informou aos familiares que já cuida de diversos equipamentos culturais e não conseguiria abarcar mais um. O Governo do Estado, por sua vez, realizou o comodato de um piano de cauda que ficava dentro do teatro.
Procurada pela reportagem, a comunicação da Secult-PE/Fundarpe lamentou “o ato de vandalismo que destruiu o Teatro Valdemar de Oliveira, uma das salas de espetáculos privadas mais importantes e tradicionais do estado”.
"Os herdeiros do teatro entraram em contato com a Secult-PE e a Fundarpe para solicitação de apoio na transferência do piano, que estava se deteriorando no equipamento cultural, sob risco de vandalismo e roubo. Nesse sentido, a Fundarpe intermediou a interlocução com o Conservatório Pernambucano de Música, que a partir de formalização de comodato viabilizou a transferência do bem para sua sede. Hoje, o bem móvel encontra-se em uso e sob os cuidados de especialistas para que, assim que possível, retorne à Casa de Espetáculos", finaliza a nota.
A Polícia Militar informou, através do 16º BPM, que "vem realizando rondas ostensivas, assim como diversas operações em toda extensão do bairro da Boa Vista com intuito de inibir ações delituosas, como também garantir a tranquilidade daqueles que residem e transitam na localidade".
Espaços
Os organizadores do ato reforçam a importância da preservação de um espaço para as artes cênicas no Recife. "Fiquei bastante atravessado quando eu vi as últimas imagens do teatro totalmente destruído. Me parece um movimento orquestrado, pois aquilo não é um fenômeno da natureza. É muito difícil pensar que um grupo de vândalos fizesse aquilo e ninguém percebesse. Isso me deixou com muitas dúvidas do que realmente está acontecendo", diz José Manoel Sobrinho, que foi gerente de cultura do Sesc e presidente da Fundação de Cultura do Recife.
"O movimento da quarta-feira será de acolhimento, uma devolutiva de tudo o que o espaço precisa. O Recife perdeu muitas casas de espetáculo nos últimos anos: Teatro do Forte, Teatro Clênio Wanderley, Teatro do Derby, Teatro José Carlos Cavalcanti Borges. As artes cênicas estão deixando isso acontecer. Até quando nós, do teatro, da dança, do circo, vamos ver as casas de espetáculos fechando e vamos ficar calados? Não dá mais para perder espaços."