Lembra do Bar Savoy? Projeto quer reviver icônico bar do Centro do Recife
Instituto Ser Educacional e Instituto Maximiano Campos, que compartilham o acervo do bar, estão buscando uma empresa para parceria de retomada do estabelecimento na Avenida Guararapes
O resgate do imaginário cultural e histórico do Centro do Recife pode ser uma das saídas para a restauração da área, um dos principais dilemas da capital na atualidade. É com esse pensamento que um projeto deseja reativar o antigo Bar Savoy, o mais icônico da capital no século passado.
Localizado no número 147 da Avenida Guararapes, em Santo Antônio, o Savoy funcionou entre 1944 e 1994, sendo reduto de intelectuais, poetas, artistas e políticos. Entre os frequentadores ilustres estavam nomes como Gilberto Freyre, Carlos Pena Filho, Capiba, Osman Lins, Vicente Rego Monteiro, Ascenso Ferreira, Renato Carneiro Campos, Mauro Mota, entre outros.
Ainda passaram por lá nomes como Jorge Amado, Heitor Villa-Lobos e até o casal Simone de Beauvoir e Jean-Paul Satre, durante um congresso de escritores em 1960. Foi esse bar que inspirou o famoso poema "Chope", de Carlos Pena Filho: "Nas mesas do Bar Savoy, o refrão tem sido assim / São trinta copos de chopp / São trinta homens sentados / Trezentos desejos presos / Trinta mil sonhos frustrados".
Em uma iniciativa para a criação de um memorial com cafeteira ou bar no mesmo local, o Instituto Ser Educacional, do Grupo Ser Educacional, e Instituto Maximiano Campos, presidido por Antônio Campos, estão buscando uma empresa para parceria de retomada. As instituições estão em constante contato com o gabinete Recentro para suporte de infraestrutura e serviços.
Esses dois institutos compartilham o acervo do antigo bar. Janguiê Diniz, fundador do Grupo Ser Educacional, é proprietário do edifício Sigismundo Cabral de Melo, onde ficava o estabelecimento - ao lado da atual Caixa Econômica da avenida.
"Voltar a ocupar a Avenida Guararapes com moradias e empresas é revitalizar uma região muito importante tanto para a história, quanto para a economia da cidade. Eu acredito que esse movimento de “reocupação”, não só na Guararapes, mas também em outras áreas vizinhas, promoverá o renascimento do Centro do Recife, trazendo mais vida e segurança", opina Janguiê Diniz.
"São empreendimentos como esses (do Bar Savoy) que dão movimento à região. Eles acabam por gerar um movimento positivo, atraindo outros investimentos e estimulando que o poder público cuide mais da área, garantindo, por exemplo, segurança e uma melhor estrutura viária."
O projeto
O Grupo Ser Educacional deslocou as suas operações para prédios do Centro do Recife, incluindo alguns na Avenida Guararapes, na década de 2000. Em 2011, o grupo se reuniu com o Instituto Maximiniano Campos para lançar um concurso arquitetônico visando a retomada do Savoy. A vencedora do prêmio foi a arquiteta Manoela Pires Soares.
Desde então, os institutos têm procurado um parceiro para a locação, executando esse projeto arquitetônico no espaço, que está sem revestimento de piso, paredes e teto para facilitar o início de uma possível reforma.
A empresa parceira receberia todo o acervo do bar, passando a ser guardião do material. O local deverá obrigatoriamente possuir um nome composto, que seria a soma de Savoy com o nome da empresa parceira. Toda a operação comercial ficará a cargo da empresa parceira, bem como carência de 120 meses de aluguel.
"O Savoy representa um templo cultural e boêmio do Recife. Foi o principal bar do centro do Recife por muito tempo, com a presença de muitos artistas. O Bar de Carlos Pena Filho, o poeta do Recife. Assim como o Leite é um cartão postal, o Savoy também é. A sua volta vai no sentido do resgate do bairro do Recife", diz Antônio Campos.
"Temos as principais placas, imagens e o acervo. A ideia é fazer um café, bar e bistrô, contando a história do Savoy, com a imagem de bronze de Carlos Pena Filho na calçada. Será a Brasileirinha do Recife, fazendo uma comparação do café que homenageia Fernando Pessoa, no Chiado, em Lisboa."
Desafios
De 2011 até a atualidade, algumas intempéries surgiram. O Corpo de Bombeiros exigiu a instalação de uma escada no térreo do edifício Sisgumundo Gonçalves, o que impactou o projeto arquitetônico inicial. Depois, a pandemia fez com que o Grupo Ser Educacional desocupasse os prédios do Centro.
"Um pouco antes da pandemia, nós quase conseguimos uma parceria com um grupo de cafeteiras. Estávamos, inclusive, com um contrato pronto. O espaço se chamaria Delta Savoy e seria uma cafeteira com um espaço cultural, incluindo o acervo do Savoy", diz Sérgio Murilo, diretor de governança Ambiental e Social do Grupo Ser Educacional.
"Porém, veio a pandemia e o contrato não avançou por dois motivos: a pandemia e a degradação do Centro, que deixou o locatário receoso. Isso sempre pesou bastante, mas todos os investimentos foram suspensos depois da pandemia."
Apesar dos desafios, os institutos nunca desistiram do projeto. "Queremos demonstrar que o espaço original do Savoy existe, apesar de uma pequena redução de área por conta desse escada de emergência. Ele tem condições de funcionar no mesmo local. Seguimos na busca de algum empresário que queira operar no local, com um bar, restaurante ou café literário que tenha programação para lançamento de livros e saraus. Tudo isso é possível".
Ele ressalta que os investidores interessados podem enviar e-mail para o endereço institutoserprojetos@sereducacional.com.
Poder público
Os envolvidos no projeto reconhecem, é claro, que a chegada de um investidor dependerá também da atuação do poder público. Eles têm conversado com o Recentro, gabinete que tem a missão de desenvolver e gerir ações que buscam a revitalização e modernização da área.
Sérgio Murilo diz que a pasta tem sido bastante solícita em contribuir com o mapeamento das necessidades da Avenida Guararapes. Ele chega a elencar alguns tópicos que iriam contribuir com a revitalização da via.
"O primeiro mote que se precisa discutir é a segurança. Além da polícia, também incluo a Guarda Municipal para cuidar dos equipamentos públicos da Guararapes. Existem algumas medidas que não precisam de aprovação da Câmara, como a ampliação da Zona Azul para estacionamento. Queremos que os estacionamentos dos clientes da Savoy seja na Rua Matias de Albuquerque, pois precisa existir uma proximidade e sensação de segurança. Também é necessária a instalação de um ponto de parada de táxis e veículos de aplicativos, aumento da iluminação pública e revitalização das colunas dos corredores", diz.
"Ainda nos colocamos à disposição para fazer um projeto juntamente aos ambulantes, sobretudo os sapateiros. Muitos estão sem condições de trabalhar por questões de saúde. Maioria idosos. A ideia é que eles indiquem algum familiar que possa assumir suas funções, geralmente uma pessoa jovem que esteja apta a cursar o ensino superior. Esse jovem trabalharia como sapateiro e em troca receberia uma bolsa de graduação EAD da Uninassau. Para tanto, a prefeitura teria de disponibilizar uma nova estação de trabalho, padronizada e com segurança para a guarda do material".
Sérgio Murilo ainda cita a área fiscal do Porto Digital, que oferece redução de Imposto Sobre Serviços (ISS) para empresas, mas que não alcança a localização do Savoy. "A área poderia, de repente, se estender para que outras empresas se instalem, pegando do lado da Guararapes que possui o Trianon, entre outros prédios."
Povoamento
O produtor cultural Paulo Braz, que já teve casas noturnas em áreas consideradas degradadas, foi convidado para fazer uma visita ao local do Savoy. "Eles me chamaram para ver o que poderia dizer. Eu disse que é preciso, primeiro, que aqueles prédios sejam retrofitados para fazer moradia para gente jovem", opina Braz.
O empresário cita, inclusive, o caso do Edifício Sertã, retrofitado pelo proprietário Bruno Castro e Silva, que restaurou e adaptou 16 apartamentos destinados para a locação a inquilinos jovens e estudantes. Todas as unidades estão alugadas. "Isso significa que não é uma coisa impossível”, diz Paulo Braz, que atualmente administra o Frege, no Boulevard Rio Branco.
Sérgio Murilo, do Grupo Ser Educacional, compartilha da visão do povoamento. "Medellín usou muito dessa filosofia para resgatar o seu Centro. Quanto mais gente povoando, menos violência. Órgãos do Governo do Estado também poderiam ser realocados no Centro, pois a máquina pública ajudaria nesse povoamento. A Guararapes tem cinco edifícios fechados e estamos colocando os nossos à venda. Não queremos vender o Bar Savoy. Essa parte, a gente não vende."
Janguiê Diniz aponta que a queda no financiamento estudantil e o impacto da pandemia impossibilitaram a continuidade dos projetos educacionais na Guararapes. "Agora, a intenção é transformar esses espaços através de investimentos públicos e privados. O mais importante agora é fazer com que o centro do Recife seja ocupado, seja por moradias ou mesmo empresas. Precisamos levar vida à Avenida Guararapes e o centro do Recife como um todo. Sou um apaixonado pelo Recife e não medirei esforços para ajudar nesse processo de revitalização."