'Propriedade', aguardado filme de Daniel Bandeira, tem pré-estreia no Teatro do Parque; conheça o longa
Exibido em festivais renomados, filme usa conflito entre estilista (Malu Galli) e trabalhadores rurais como alegoria para refletir sobre raízes das desigualdades e polarização
Após ser exibido nas programações do Festival do Rio, da Mostra Internacional de Cinema em São Paulo e do Festival de Berlim, o longa-metragem "Propriedade", do pernambucano Daniel Bandeira, chega ao circuito comercial no dia 21 de dezembro.
Antes, nesta sexta-feira (15), o filme terá duas sessões de pré-estreia no Cineteatro do Parque, o Recife. Uma outra sessão também foi realizada no Cinema da Fundação, na quinta (14).
O longa-metragem acompanha um conflito entre a estilista Tereza (Malu Galli) e os trabalhadores da fazenda de sua família. Para proteger de uma revolta, ela se enclausura em seu carro blindado. Os universos desses personagens, separados por uma camada de vidro, estão sempre prestes a colidir.
A premissa inicial do filme era registrar a claustrofobia. Contudo, ao decorrer das cenas, o longa-metragem transforma-se em uma alegoria sobre a polarização e as raízes das desigualdades brasileiras.
Contornos políticos
"Propriedade acaba sendo um comentário também sobre como a violência que acontece na cidade tem suas raízes muito profundas, que retrocedem no espaço. No campo e no tempo, porque são questões muito antigas, muito históricas", diz o diretor Daniel Bandeira, diretor de "Amigos de Risco" (2007) e "O Nó do Diabo" (2017).
"Então, no final de contas, a gente acaba vendo somente o efeito imediato dessa opressão na cidade, muitas vezes não se dando conta de que a origem disso está no campo, está na história".
O filme foi ganhando esse contorno político ao longo das filmagens, realizadas na Fazenda Morim, de São José da Coroa Grande, município de Pernambuco. Ele foi rodado entre 11 de setembro e 7 de outubro de 2018, período da eleição presidencial que levou Jair Bolsonaro ao poder.
"Havia aquele gráfico da apuração das eleições, do Norte Vermelho e do Sul Azul. Então, essa ideia original acabou sendo infiltrada por essa percepção de que o Brasil estava dividido. Ele sempre esteve dividido, na verdade, mas isso acabou me afetando de forma inédita", diz Bandeira.
Desigualdades
No núcleo dos trabalhadores, destaca-se a personagem Dona Antônia (Zuleika Ferreira). Nessa dicotômia entre Tereza e Antônia, o diretor buscou representar a incomunicabilidade de duas integrantes de diferentes esferas sociais.
"Eu acho que a gente vive em um momento em que é muito difícil se colocar no lugar do outro, de entender as motivações do outro. E, com isso, a gente acaba perdendo as nuances, as motivações, coisas que a gente poderia usar para tentar resolver nossas diferenças."
"Eu acho que é nisso que reside a grande tragédia, não só da história do filme, mas da história dos nossos tempos. E que só quando rompemos essa blindagem, ou quando abrimos a porta, ou quando descemos o vidro para poder falar com o outro, que nós temos uma condição de iniciar um diálogo, de estabelecer um clima de resolução de diferenças, resolução de problemas. Até lá, a incomunicabilidade é o motor da nossa tragédia", reflete.
Mais festivais
Além dos festivais já citados, "Propriedade" esteve no do 17º Fest Aruanda do Audiovisual Brasileiro, da 26ª Mostra de Cinema de Tiradentes, da 17ª CineBH – Mostra Internacional de Cinema de Belo Horizonte, Rio Fantastik Festival 2023
No circuito internacional, ainda esteve no Edimburg International Film Fest, o MotelX (de Lisboa, Portugal), o espanhol Sitges, os americanos Brooklyn Horror Fest e Fantastic Fest (vencedor de Melhor Filme em ambos), o holandês Leiden International Film Festival, entre outros.
Está também agendada uma exibição em 20 de dezembro no MoMA, o Museu de Arte Moderna de Nova York, dentro do programa The Contenders 2023, um recorte com as obras mais influentes e importantes dos últimos 12 meses.
"Propriedade tem conseguido se comunicar com plateias estrangeiras, tanto na Europa quanto nos Estados Unidos, não somente em termos de impacto ou linguagem. Eles conseguem fazer essa relação entre a nossa história recente e a tensão que acontece no filme. Pensado numa realidade específica, eu acho que ele também ativa alguns botões, também puxa algumas cordinhas nos conflitos de classe da forma como existem nos países onde ele é exibido", diz o diretor.
"O projeto apresenta essa característica de ter uma penetração muito grande nos cinemas do Brasil, alcançando diversas realidades e camadas da sociedade brasileira. Interessa-me muito saber como cada camada vai interpretar, o que cada camada vai trazer de si, vai ver refletida de si própria no filme."