MÚSICA

Moraes Moreira 'iria às lágrimas' ouvindo disco que celebra sua obra com frevos, diz filho

'Moraes É Frevo' foi idealizado por Pupillo, Davi Moraes e Marcelo Soares, tendo músicos como Maestro Duda, Spok e Henrique Albino; time de intérpretes vai de Maria Rita a Lenine

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Emannuel Bento

Publicado em 23/01/2024 às 15:17 | Atualizado em 24/01/2024 às 11:17
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Moraes Moreira foi um baiano apaixonado por Pernambuco, o que ficou comprovado na sua intimidade com o frevo - ritmo que o artista ajudou a reinventar nos trios elétricos de Salvador. Por isso, é simbólico que o primeiro disco de homenagem póstuma do músico seja dedicado ao frevo da escola de sopros pernambucana.

O disco "Moraes É Frevo" foi idealizado por Pupillo, ex-Nação Zumbi, com Davi Moraes, filho de Moreira, e Marcelo Soares, integrando o projeto Orquestra Frevo do Mundo - que propõe releituras contemporâneas de clássicos do gênero e que já lançou dois volumes, em 2017 e 2020.

O álbum chegou às plataformas em 19 de janeiro, sendo um bom presente para o período pré-carnavalesco de 2024. 

Essa "escola de sopros" é representada por músicos de diferentes gerações: Duda, Nilsinho Amarante, Spok e Henrique Albino. A pluralidade também fica evidente no time de convidados para as interpretações vocais: Céu, Agnes Nunes, Maria Rita, Moreno Veloso, Luiz Caldas, Criolo e Uana.

'Era uma coisa que ele pensava'

Nos últimos anos, Pupillo e Davi trabalharam juntos durante a turnê "Portas", de Marina Monte, como baterista e guitarrista, respectivamente. Moraes Moreira era um dos principais assuntos das conversas.

"Pupillo é uma grande fã do meu pai. Eu contava as histórias e ele se identificava muito com o humor nordestino. Bateu muito forte essa ideia [do disco]. Era uma coisa que ele pensava, quando ainda estava aqui, quando tinha oportunidade: trabalhar com a escola de sopros pernambucana. Ele tinha uma relação muito forte com o Duda e o Spok", diz Davi Moraes.

MAGOO FELIZ/DIVULGAÇÃO
Ilustração da capa de 'Moraes É Frevo' foi feita por Magoo Felix - MAGOO FELIZ/DIVULGAÇÃO

"Moraes ajudou a repaginar o frevo, a modernizá-lo. Na minha visão, ele foi fundamental para a minha geração no sentido de atualizar e contemporaneizar os estilos de músicas que temos no Nordeste. O projeto Frevo Orquestra do Mundo traz justamente essa evolução dos ritmos. Era um sonho dele gravar com maestros, o que nunca aconteceu", diz Pupillo.

'Tenho certeza de que ele iria às lágrimas ouvindo'

Naturalmente, a escolha do repertório foi bastante difícil. "Ele tem umas 30 musicas só falando de Pernambuco", relembra Davi. O resultado final trouxe, inclusive, canções que não eram originalmente frevos, mas que tinha um "encaixe perfeito" pela forma como ele cantava, mostrando o protagonismo do gênero em seu fazer artístico.

As faixas são: "Pernambuco meu" (Lenine); "Festa do Interior" (Maria Rita); "Preta Pretinha" (Criolo); "Coisa Acesa" (Agnes Nunes); "Pombo Correio" (Otto) e "Sintonia" (Céu, com participação de cantoras do Bloco da Saudade").

Ainda integram o disco as faixas "Todo Mundo Quer" (Davi e Moreno Veloso); "Eu Sou o Carnaval" (Uana) e "Vassourinha Elétrica" (Luiz Caldas), encerrando com "Guitarra Baiana", cantada pelo próprio Moraes.

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Lenine - DIVULGAÇÃO
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Criolo - DIVULGAÇÃO
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Céu - DIVULGAÇÃO
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Agnes Nunes - DIVULGAÇÃO

"Tiramos certas músicas que seriam óbvias, com 'Chame Gente' ou 'Chão da Praça', para dar lugar a outras que queríamos resgatar, que mereciam ser trazidas de volta, como 'Todo Mundo Quer'", diz Davi. "Ele iria gostar muito. Eu tenho certeza de que ele iria às lágrimas ouvindo esse disco. As interpretações estão lindas", crava o filho.

"Queríamos mostrar a versatilidade de Moraes através dos intérpretes, com representantes pernambucanos e pessoas que tinham uma ligação com a obra. É interessante ver uma artista tão jovem, como a Ágata Nunes, que conhece a sua obra e ficou tão alinhada com ele", diz Pupillo.

"A ideia era aumentar ao máximo o raio de ampliação do disco, para que não fosse um lançamento nostálgico, mas que fosse uma atualização, para que as pessoas tivessem interesse de buscar a sua discografia, que é fundamental para a cultura brasileira."

'Precisamos que as novas gerações proponham algo novo'

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Pupillo, um dos idealizadores do disco "Moraes É Frevo" - PABLO SAVALLA/DIVULGAÇÃO

Pupillo ressalta que "Moraes é Frevo" é um exemplo de trabalho que busca quebrar as fronteiras regionais do frevo e atualizá-lo. Ele cita, por exemplo, um arranjo de Henrique Albino feito com a própria voz do instrumentista, dando um "aspecto revolucionário ao Carnaval de rua". "Eu nunca tinha visto nenhum arranjo de frevo que tivesse isso."

O músico também fala da importância da renovação dos hinos no carnaval. "Durante um bom tempo, nunca renovávamos o repertório de hinos do Carnaval pernambucano, o que aconteceu com 'Ciranda de Maluco', de Otto. É importante que o frevo não fique sempre naquele mesmo repertório. Para que isso ocorra, precisamos que as novas gerações proponham algo novo", diz.

"Precisamos quebrar essas fronteiras regionais e temporais. Capiba tinha músicas que não eram só ligadas ao Carnaval. É possível abordar qualquer tema no frevo, assim como num forró ou numa ciranda. O Brasil precisa se apropriar dos ritmos que vem do Nordeste, assim como o Brasil se apropriou do samba."

'Frevo vai permanecer sempre como uma referência'

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Davi Moraes, um dos idealizadores do disco "Moraes É Frevo" - PABLO SAVALLA/DIVULGAÇÃO

Para Davi Moraes, o trabalho de introdução do frevo ao Carnaval de Salvador continua vivo através de nomes como Luiz Caldas e Armandinho Macêdo.

"Na época, o meu pai, o Caetano e o Armandinho eram compositores de frevo. Hoje em dia, não temos tantos compositores de frevo lá, mas temos as levadas. As próprias levadas novas que o Timbalada trouxe, por exemplo, tem uma energia dos sopros, do canto rápido e acelerado, que são influenciadas pelo frevo", diz.

"De qualquer forma, o frevo teve importância para o surgimento dessas novas formas, sendo parte importante da história do carnaval e da música eletrizada. Vai permanecer sempre como uma referência".

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