Recifense Sofia Freire mergulha nos sintetizadores em 'Ponta da Língua', seu terceiro álbum
Artista deixa de lado o piano, que norteou a sua criação musical, em disco com sonoridade próximo do dark pop e trip hop
A autonomia sempre foi uma marca de Sofia Freire, cantora, compositora e produtora recifense que, dentre os seus feitos artísticos, ficou conhecida por executar vários instrumentos enquanto canta no palco. Em seu terceiro disco de estúdio, a artista deixa de lado o piano, que sempre norteou a sua criação musical, para abraçar de vez os sintetizadores.
Uma relação um tanto solitária entre Sofia e os teclados do synth deram origem ao "Ponta da Língua", que chega às plataformas digitais nesta sexta-feira, 1º de março.
"Foi um processo bem legal, lúdico e solitário. Eu estive muito sozinha, mas não solitário num lugar ruim. Foi algo de muita expansão. Estando sozinha, você também se permite a experimentar, dar liberdade e vasão para muitas coisas e ideias", diz, ao JC.
Sintetizadores
Os seus dois primeiros discos, "Garimpo" (2015) e "Romã" (2017), já traziam experimentações com o piano, beats eletrônicos e camadas de vozes. Com esses álbuns, ela circulou por diversos festivais, como Coquetel Molotov, Rec-Beat e Bananada, e chegou a participar de um show Gilberto Gil em sua turnê "REFAVELA 40".
Agora, Sofia se aproxima de uma sonoridade próxima do dark pop e trip hop - influenciada por nomes como Björk, Cocteau Twins e Cibo Matto.
"O piano é o meu instrumento de formação, que guia todo o meu pensamento musical. Os dois primeiros discos foram construídos em cima do piano", diz Sofia Freire.
"Agora, deixo o piano um pouco mais de lado para ser conduzida pelos sintetizadores e pela voz também. Vou encontrando outros espaços nos synths não apenas como veículos, mas como instrumentos mesmo", conta.
Produção
"Ponta da Língua" também marca um aprofundamento ainda maior de Freire com o processo de produção. "Sempre estive muito envolvida no processo dos álbuns, mas esse foi o disco que mais tomei as rédeas, digamos assim. Ganhei uma autonomia técnica", diz.
"Estive conduzindo todas as etapas dele. Isso para mim é massa, pois estou entendendo esse lugar mais técnico da produção musical, que é realmente muito masculino. Acho que faz parte desse meu processo de empoderamento e emancipação enquanto artista e mulher que tem total autonomia do trabalho", continua.
O show do projeto, que ainda está sendo idealizado, contará com um 'power trio': Sofia (vocal e teclados), Homero Basílio (percussão e beats) e Miguel Mendes (teclados).
Composições
Ainda existe uma mudança na forma de pensar a narrativa do álbum. No disco "Garimpo", Sofia reuniu poemas musicados de diversos autores. Em "Romã", trouxe parceras com diversas autoras para narrar a jornada de uma heroína.
"'Ponta da Língua' é menos contemplativo, tem um discurso mais direto mesmo. Mais 'terreno', digamos, focando na materialidade das coisas, mais próximo de vivências cotidianas. Ele é mais 'pé no chão', isso acaba refletindo na sonoridade também", diz Freire, que assinou todas as composições.
Faixas
A síntese do que a artista quis expressar nessa obra está em "Ponta da Língua", que encerra e nomeia o álbum: "É pela língua que escolhemos o que vamos ou não ingerir. Também é o órgão da comunicação, da palavra, expressão. E esse disco é muito sobre isso: discernir e expressar", conclui.
Já em "Big Bang", Sofia tece um fio imaginário para conectar esses dois elementos - corpo e universo - que funcionam sob a mesma lei espacial: a constância.
Em "Mormaço", a compositora combina vocais mais agudos com versos sobre os mais altos astros do céu. E continua com sua autoreflexão e questionamentos de canção a canção, em uma narrativa coesa e contínua.
"Acho que esse álbum tem um potencial de atingir um público mais amplo por conta do seu discurso, de ser algo mais direto e dançante. Pode ser que muitas pessoas se identifiquem, que ele seja mais abrangente", finaliza.
Audiovisual
"Ponta da Língua" também ganhará um vídeo exclusivo para cada faixa. Com uma estética low-fi e elementos de ficção científica, os clipes conduzem o ouvinte por uma viagem através do universo pop e dark proposto por Sofia neste trabalho.