LITERATURA

Finalista do Jabuti, Luna Vitrolira prepara livro sobre ancestralidade na Zona da Mata de Pernambuco

'É a busca dos ossos da família para curar e libertar os ancestrais ainda presos, enterrados vivos, sob o mar de cana-de-açúcar', diz poeta e escritora

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Emannuel Bento

Publicado em 05/03/2024 às 17:19 | Atualizado em 05/03/2024 às 20:00
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Finalista do Prêmio Jabuti de 2019 por "Aquenda: o amor às vezes é isso" (2018, Selo Livre), a poeta, escritora e performer Luna Vitrolira está se preparando para lançar o seu segundo livro, "Memória tem Águas Espessas", que será um mergulho na ancestralidade canavieira da Zona da Mata de Pernambuco. O lançamento ocorrerá neste ano, pela Diadorim Editora. 

Essa foi uma das principais regiões geopolíticas produtoras da cana-de-açúcar do País, tendo viabilizado o projeto colonial no Brasil. Na visão de Vitrolira, esse processo promoveu um apagamento étnico-estético cultural do povo, "que vive em exílio dentro do território do país que lhe confere nacionalidade."

"É a busca dos ossos da família para curar e libertar os ancestrais ainda presos, enterrados vivos, sob o mar de cana-de-açúcar. A memória é a base e o princípio da história de um indivíduo ou indivídua, do povo ou comunidade. Sem ela não existe o tempo, seja passado, presente ou futuro", diz, sobre o livro.

"E isso se torna mais severo quando estamos falando de uma população que foi ceifada da convivência com os parentes, da relação com o sagrado e também da possibilidade de dizer e contar a partir de suas narrativas."

'Parte apagada da minha história'

ESTÚDIO ORRA/DIVULGAÇÃO
Luna Vitrolira - ESTÚDIO ORRA/DIVULGAÇÃO

Para chegar nesse olhar macro, Luna se volta para a própria trajetória, a partir do retorno a um território repleto de pertencimento e memórias.

"O livro é uma parte apagada da minha história e vida sobre a qual nunca tive conhecimento ou contato. Escrevo sobre o peso do sentimento de não ter família, nem passado, o que é comum na vida das pessoas brasileiras devido ao processo de colonização e ao sistema escravocrata que dispersou a genealogia do povo preto e dos povos originários", conta.

A partir da experiência na Zona da Mata de Pernambuco, Luna elabora e revela processos de autorreconhecimento da própria história, imagem, origem, território, ancestralidade, herança imaterial e simbólica.

"Acredito que o livro 'Memória tem Águas Espessas' contribui para a representatividade na Literatura Brasileira Contemporânea, destacando a importância da poesia enquanto espaço criativo, artístico e político para a construção de uma literatura e uma estética de pertencimento para povos não brancos desse território”, ressalta a autora.

Carnaval do Recife

Na abertura do Carnaval de 2024, Luna Vitrolira levou a sua poesia para o palco do Marco Zero. A artista realizou o sonho de recitar poesias no maior palco carnavalesco do Recife.

"Antes de poeta, sou brincante e foliã. Tive a oportunidade de aprender a tocar percussão nas oficinas de Naná e de crescer vendo o nosso mestre reger o Tumaraca. Foram cerca de 700 batuqueiros e batuqueiras homenageando o percussionista Naná. Estive também ao lado da mestra Joana e de mais 12 mestres. A poesia é a minha vida, a minha guia e essa conquista é para toda a nossa literatura e para o poder da palavra poética", celebra.

Após o lançamento de "Aquenda: o amor às vezes é isso", a artista gravou seu primeiro disco homônimo (Selo Deckdisc), iniciando também carreira musical, em 2021. Com dez faixas autorais, o álbum une poesia e música. No mesmo ano, ela lançou o filme curta-metragem de mesmo nome - que também tem a Zona da Mata como cenário.

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