A metade de uma partida de futebol, 45 minutos, será a duração da live que Roberto Carlos apresentará neste domingo (19), quando completa 79 anos. O objetivo do inusitado show virtual, que vai ao ar às 19h45, é conservar os fãs em casa e evitar que se arrisquem em época de coronavírus, aglomerando-se em frente ao prédio onde ele mora, na Urca, Zona Sul do Rio. O parabéns ao Rei é um ritual que acontece há décadas. O mais inusitado ainda é que Roberto Carlos realiza um especial que, a principio excluiria exclusividade de transmissão pela Globo, emissora que tornou os shows que produz do cantor em dezembro o programa mais aguardado da TV.
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Em 1974 foi apresentado o primeiro deles, exibido na véspera do Natal. Erasmo Carlos, Antonio Marcos, o ator Paulo Gracindo e o artista plástico Juarez Machado foram os convidados da estreia. Já no programa inaugural a emissora escalou dois dos seus contratados. Paulo Gracindo era então um dos atores mais atuantes na TV Globo, enquanto Juarez Machado, que fazia cartuns refinados, mantinha um quadro, em que contracenava com seus próprios desenhos.
Roberto Carlos gravará a live em seu estúdio, que fica a 800 metros do prédio onde mora, mas sem interferência da TV Globo. Nada de convidados especiais. Desde os tempos me que dava canjas no Becos das Garrafas, arvorando-se a bossanovista, Roberto fez um show tão básico. Nada de convidados especiais. Estarão com ele apenas o maestro Eduardo Lages e o tecladista Tutuca Borba. Embora não tenha interferido no formato, a emissora teria apelado para cláusulas contratuais que lhe garantem direitos de imagem do artista.
A emissora Pretendia exibir o programa inteiro no horário do Faustão (que vem sendo reprisado). Roberto Carlos teria recusado a permissão. A produção de RC comunicou que a TV iria transmitir as três primeiras músicas. O horário só foi anunciado nesse sábado No entanto, a TV deve ter imposto ao Rei o que deve constar nas cláusulas de um contrato guardado a sete chaves, cujo valor também nunca foi revelado. Além de transmitido no canal de Roberto Carlos no Yiutube, as duas primeiras músicas da live serão vistas no Programa do Faustão, o programa na íntegra passa no Globoplay.
Como a produção do cantor adiantou muito pouco sobre o formato da transmissão ao vivo, a não ser um vago “ele escolheu um repertório que emocionará os fãs”, não se sabe se ele foge ao formato usual. Uma produção que, com o passar dos anos, foi ficando cada vez mais engessada, sobretudo pelos convidados óbvios: astros do segmento popular em evidência como Ivete Sangalo, Michel Teló, sertanejos e pagodeiros, boa parte com discos lançados pela Som Livre.
REI DA JUVENTUDE
Em 2021 ele chegará aos 80 anos, idade ainda mais simbólica porque o epíteto de “Rei” vem do tempo em que era o soberano da juventude brasileira. A carreira de Roberto Carlos entrou na idade adulta há 50 anos. Até então era visto como um cantor de rock, gênero que no Brasil, a partir de 1964, foi chamado de iê-iê-iê (por causa do yeah, yeah, yeah, de She Loves You dos Beatles). A música que fazia não entrava no horário nobre da TV, era coisa para adolescentes. A crítica o esnobava até que os tropicalistas, em 1968, concederam-lhe um upgrade no status.
Maria Bethânia e Caetano Veloso o elogiavam, Gal Costa o gravou no primeiro e segundo discos (três canções da dupla Carlos & Carlos). Em 1970, o recém-adquirido status de Roberto Carlos seria consolidado pelo influente semanário O Pasquim, que passou a elogiá-lo. O jornalista Tasso de Castro, editor do jornal, chegou a passar uma semana acompanhando o dia a dia do cantor. Os adultos referendaram a entrada de RC no primeiro time da música brasileira, quando este realizou uma temporada, em 1970, na requintada sala de concertos Cecília Meireles. Sempre lotada para assistir ao cantor se apresentar com o RC-7 e o Quinteto Villa-Lobos.
Roberto Carlos flertou com o alternativo até metade da década de 70, quando assumiu de vez o modelo da música italiana romântica, que já vinha usando desde que ganhou, como intérprete, o festival de San Remo, com Canzone Per Te, de Sergio Endrigo. É o estilo em que se fixou desde então.
Na prometida live, o Rei pode experimentar o que não lhe é permitido. Ousar com novidades que podem influenciar na montagem de um repertório diferente para quando voltar aos palcos. Seu especial para a TV vem despencando de audiência a cada ano. Em 2019, teve a menor audiência de sua história, apenas 20 pontos. Mesmo com boa parte dos fãs na mesma faixa etária que ele, pessoas que têm dificuldade de circular no mundo digital, a live especial de Roberto Carlos deverá ter uma plateia virtual superior à de qualquer um dos seus programas na Globo.
Já se divulgou que ele canta Jesus Cristo e Emoções, prometendo surpresas. Quem sabe, ele incluiu no repertório canções que há décadas não apresenta em público? Talvez até Amor Y Más Amor (dos cubanos Rogelio Martínez y Lino Frías), bolero gravado pelo porto-riquenho Bobby Capó, em 1950. Foi com esta música que o garoto Roberto Carlos Braga, com nove anos, estreou como cantor na ZYL-9, Rádio Cachoeiro de Itapemirim, sua cidade natal.
PROIBIDOS
Jesus Cristo, lançada por Roberto Carlos em 1970, foi claramente influenciada pelo sucesso do musical Jesus Cristo Superstar, dos ingleses Andrew Lloyd-Weber e Tim Rice. O modismo acabou, mas não para Roberto Carlos. A partir de então ele passou a compor música de cunho religioso. No palco, ele já abrigou no mesmo repertório Jesus Cristo e Que Tudo Mais Vá Pro Inferno (dele com Erasmo Carlos), de 1965, o maior sucesso de RC na era da Jovem Guarda. Ele voltou a gravar a música, em ritmo dançante em 1975, mas dois anos depois a baniu do setlist, e não permite que a regravem.
No site oficial do cantor, divulgando a apresentação de hoje, abriu-se uma página com um quizz: “O que você sente ao receber o convite para a festa de Roberto Carlos? O fã cita um verso e o título de uma canção do Rei, que o remete ao Spotify. Encabeça a lista: “Só tenho você no meu pensamento” e “Quero que tudo mais vá pro inferno”.
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