Margem, finda a viagem (Biscoito Fino), é o resumo da ópera de Adriana Calcanhotto. Ou melhor, da trilogia, Margem (2019), (Marítimo) (1998) e Maré (2008). Em maio, ela lançou Só, com nove canções compostas na quarentena, disco atípico na discografia da cantora gaúcha, independente, realizado em 43 dias, entre março e maio, na ficha técnica ela incluiu a hora em que a canção foi feita.
Impedida de voltar para Coimbra, onde é professora na célebre universidade local, ela assumiu o compromisso com si mesma de fazer uma música até o almoço. Ela fez a pré-produção em casa (que teve participação do petrolinense Zé Manoel, ao piano), e a produção a cargo de Arthur Nogueira. Só foi a inusitada sequência de Margem. As imagens e áudio de Margem, Finda a Viagem, que chega primeiro em formato digital, mas que terá DVD e CD físicos, foi gravado em dezembro de 2019, Grande Sala da Cidade das Artes, no Rio de Janeiro, com participação especial de Rubel, em Mentiras e Você me Pergunta.
O repertório enfatiza o álbum Margem, e traz canções de Marítimo e Maré, mais os inevitáveis sucessos de carreira, a exemplo de Devolva-me, que resgatou da era do iê-iê-iê, e a incorporou a seu set-list, uma recriação tão forte que poucos se dão conta de que a música é de 54 anos, e composta por Renato Barros (dos Blue Caps, falecido neste agourento 2020), e Lilian Knapp (da dupla Leno & Lilian).
Com Bem Gil (Guitarra), Bruno Di Lullo (Baixo) e Rafael Rocha (Bateria, MPC e percussão), Adriana Calcanhotto canta 18 canções, abrindo com Maré, e terminando com Maresia. Entre as duas tem algumas novidades, como os duetos com Rubel, e Futuros Amantes, de Chico Buarque, que ela já havia cantado num disco da portuguesa Eugênia de Melo Castro. A escolha desse clássico, do álbum Paratodos (1993) é óbvia. A canção de Chico é de certo modo premonitória, a nossa é a “estranha civilização” que seres do futuro tentarão decifrar.
Adriana Calcanhotto consegue neste show um equilíbrio entre elegância e gentileza, com as quais a sutileza dos músicos se encaixa como uma luva, mesmo nas músicas mais agitadas.Ele jamais vai a tons altos, com o passar dos anos tornou-se cada vez mais econômica, até mesmo no calipso, meio reggae, Porto Alegre, com citação de Diana (Neil Sedaka), e uma sutil lembrança de Louco Por Você (que Roberto Carlos gravou em 1961), ambas calipsos rock, com destaque para a guitarra de Bem Gil.
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