"Como é difícil cantar Cazuza!", diz Almério, que estreia turnê com repertório dedicado ao poeta da música
"Tudo É Amor - Almério Canta Cazuza" terá uma sessão, domingo (15)
Almério estreia, neste domingo (15), no Teatro do Parque, a turnê nacional "Tudo É Amor - Almério Canta Cazuza". O projeto é um desdobramento do álbum homônimo que o cantor e compositor pernambucano lançou em novembro do ano passado, com a participação de Ney Matogrosso na regravação de "Brasil". A estreia no Recife será em sessão única, às 19h, e os ingressos estão à venda na plataforma da Sympla - custam R$ 80 (inteira) e R$ 40 (meia).
"Por que cantar Cazuza?"
"Tudo É Amor" nasceu de uma ideia da empresária carioca Ione Costa, que, revisitando o repertório de Cazuza, botou na cabeça que faltava um cantor nordestino interpretando a obra do artista falecido em 1990. E tinha de ser Almério, que relutou: "Fiquei muito reticente, meio inseguro também. Por que cantar Cazuza? Pra mim já tinham feito trabalhos relevantes e competentes, eu não tinha nada a acrescentar", disse em entrevista por telefone.
Almério acabou convencido quando Ione e seu empresário e produtor, André Brasileiro, argumentaram que há uma geração que ainda não conhece Cazuza. Daí ele partiu para uma viagem nas próprias memórias, a fim de encontrar um sentido para cantar a obra do cantor e compositor carioca que faleceu em 1990, em decorrência de complicações da aids.
Descobriu que, menino, imitou Cazuza na escola em Altinho, no Agreste de Pernambuco, onde nasceu. E lembrou que o artista era constante no seu repertório cantando em barzinhos de Caruaru, para onde foi tentar a carreira na música quando deixou a cidade natal.
"Vai à Luta"
Almério relembrou, também, que, ali pelo fim dos anos 80 e início dos 90, quando era uma criança indo para a adolescência, chegou em casa o CD "Só se For a Dois", de Cazuza, comprado pelo irmão mais velho. Por um bom tempo, só o encarte daquela novidade — feita de capa de acrílico e disco metalizado — pôde ser aproveitado pela família. Até que, uns dois anos depois, conseguiram comprar um CD Player.
Naquele Agreste — às vezes muito seco —, a faixa "Vai à Luta" foi a que mais sensibilizou Almério. "Me curava das dores, quando eu passava pelo bullying de quem não aceitava a criança 'viada' que eu era, o adolescente viado que eu era, sem eu adoecer com a minha sexualidade. Eu sentia o peso de uma sociedade em cima do que eu nem sabia o que era", rememora, e cantarola um trecho — "Eu te avisei/ Vai à luta/ Marca teu ponto na justa/ O resto deixa pra lá". "Isso me dava uma força... me enchia de coragem."
"A poesia dele atravessou as barreiras e chegou até o coração de uma criança de uma cidade do interior. Isso é muito forte, é de uma beleza sem nome", analisou com emoção. "As pessoas precisam passar por essas canções para passar por sensações e transformações, como eu passei."
"Como é difícil cantar Cazuza!"
O repertório do show "Tudo É Amor" é 100% Cazuza — Almério confessa que tentou encaixar umas e outras do seu álbum anterior, "Desempena", mas há um conceito bem amarrado pelo diretor artístico Marcus Preto — que tem trabalhos com artistas como Gal Costa, Erasmo Carlos e Nando Reis.
"Tudo É Amor — Almério Canta Cazuza" tem direção musical de Juliano Holanda (no disco, a função foi de Pupillo) e se impõe como um trabalho desafiador ao artista como intérprete. "Eu tive que reaprender a cantar sucessos de Cazuza... e como é difícil cantar Cazuza, minha deusa do céu! A voz dele é muito presencial; ele sabia o que 'tava' dizendo, querendo. Só deus sabe o trabalho que me deu... Quebrei cabeça para deixar algo sobre Cazuza, mas na atmosfera da minha voz."
Carreira de quase 20 anos
Em 2023, Almério completará 20 anos de trajetória na música em 43 de vida. Ele calcula a partir de quando fez seu primeiro show num teatro — no João Lyra Filho, em Caruaru, já depois de muitas letras compostas e horas de barzinhos nas noites da Capital do Agreste, onde foi morar depois que deixou Altinho.
Ali pelos anos 2000, estava Almério com a Banda Zé do Estado, de pífanos, interpretando MPB e pop rock num palco alternativo do São João de Caruaru. Um som-revolução.
"Aquele momento foi muito importante pra mim. Como artista, me tornei outro. Aqueles mestres são muito incríveis. E aquele som que chamam de regional é universal e só existe no nosso Agreste; pra mim é interplanetário — é ancestral e 'modernérrimo' ao mesmo tempo. Eu fui entender sonoridade com as bandas de pífano", comentou.
O artista — que, internamente, foi transformado pelo pífano — passou por outro processo de transformação ali por 2017, quando conseguiu, pelo Natura Musical, a gravação, distribuição e circulação nacional do álbum "Desempena". O trabalho o levou ao País, ao Rock in Rio e ao palco do Theatro Municipal do Rio de Janeiro, onde recebeu o Prêmio da Música Brasileira como Revelação, em 2018.
"Eu já não aguentava mais fazer barzinho, 'tava' desgastado demais, de força e de imagem, a ponto de desistir. Quando chegaram André Brasileiro [o empresário], Juliano Holanda [produtor musical] e o Natura Musical, juntei a sede com a vontade de beber", recordou.
Desde então... "Não tem mais barreira pra mim, porque eu tenho muito respeito pelo que eu faço. E já está concebido por mim: ao que vem eu me jogo por inteiro, porque a minha missão no mundo é fazer arte."