A proposta da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) de permitir que as empresas de planos de saúde tenham acesso aos recursos de fundos garantidores para custear ações de combate a covid-19 não teve uma grande adesão por parte das operadoras, garante uma fonte do setor. Os recursos, que somam cerca de R$ 15 bilhões, são uma espécie de provisão feita com dinheiro das próprias operadoras, mas que só poderia ser utilizada em caso especiais como o de insolvência da empresa ou para garantir ressarcimento ao SUS por procedimentos feitos na rede pública em benefício de usuários de planos de saúde.
Pela proposta da ANS, as operadoras poderiam usar esse dinheiro também para custear, excepcionalmente, procedimentos em relação ao tratamento de pacientes diagnosticados com a covid-19. Em contrapartida, a ANS exigia apenas que as empresas garantissem o pagamento a fornecedores (mesmo em caso de alta na inadimplência dos usuários) e permitisse aos usuários dos planos, renegociarem parcelas em atraso até o dia 30 de junho próximo, sem perda da assistência médica. A ANS informou através da sua assessoria de imprensa que os termos de adesão estão sendo revistos para que seja feita uma nova proposta as empresas de planos de saúde.
A recusa pelas operadoras da proposta feita pela ANS, na prática, traz insegurança ao usuário do plano de saúde com dificuldades financeiras para manter as parcelas em dia. O advogado especialista na área de saúde Elano Figueiredo é categórico: “A adesão é voluntária, apenas a empresa que aderir é que estará obrigada a atender os inadimplentes”, explica o advogado. Para Elano Figueiredo, a proposta da ANS é falha em vários pontos. Segundo ele, o termo de compromisso diz que só poderão ter acesso aos recursos do fundo as operadoras que não estejam em dificuldades econômicas e tenham constituído todos os seus ativos. “Ora, quem mais vai precisar de ajuda são aquelas empresas que já vinham em dificuldade, especialmente as pequenas, médias e regionais. Várias ainda estão pagando parcelado estas reservas”, explicou Elano.
Outra cláusula que para Elano é de difícil aceitação é a que determina que a operadora fica obrigada a não cancelar nenhum contrato individual ou coletivo, com menos de 30 beneficiários. “O risco atuarial de clientes sem pagar o plano e gerando custos hospitalares altos é difícil de calcular. Além disso, não existe nenhum parâmetro para a negociação que deve ser feita com o consumidor. Sem balizas, as partes podem não chegar a um entendimento e quem vai pagar o prejuízo?”, questiona o advogado.
JUSTIÇA
O resultado da indefinição por parte da ANS em apresentar um plano que seja atrativo para as operadoras e, ao mesmo tempo, ofereça mais garantias aos usuários, colabora para o aumento da judicialização de casos envolvendo a assistência médica durante a pandemia. Segundo o Conselho Nacional de Justiça(CNJ), que monitora todas as demandas que chegam aos tribunais da Justiça Federal e das Justiças estaduais, o número de ações relativas ao covid-19 vem crescendo exponencialmente. No dia 1 deste mês, eram 79 ações em todo o País. Na última sexta-feira (17) o ranking já mostrava 158 ações. Pernambuco é o estado que encabeça a lista, com 41 ações na Justiça (até o dia 17). Nem todas as ações envolvem planos de saúde mas, para Elano Figueiredo, enquanto não houver definições e acordos, a judicialização será uma das consequências.
Para Vera Valente, diretora executiva da FenaSaúde (Federação Nacional de Saúde Suplementar), entidade que representa 16 grupos de operadoras de planos e seguros privados de saúde, afirmou que, por enquanto, não é possível se manifestar sobre o novo termo de compromisso que será proposto pela ANS. “O documento encontra-se sob análise da procuradoria da ANS e, apenas uma vez divulgado, será possível avaliá-lo e posicionar-se a respeito”, afirmou Vera Valente.
A Unimed Recife, uma das maiores operadoras de planos de Saúde no Estado, se manifestou através de nota, afirmando que a proposta da ANS, como foi formulada, é inviável para a empresa. “Após profunda análise em conjunto de nossos departamentos jurídico, financeiro-contábil e de regulação, concluímos não ser viável a movimentação dos ativos garantidores do Fundo de Provisão de Eventos Ocorridos e Não Avisados (PEONA), o qual foi integralizado por essa Cooperativa a duras penas. A inviabilidade se dá em função das contrapartidas anunciadas pela ANS, entre elas, a recomposição dos valores sacados do fundo até 31 de dezembro de 2020 e o incremento do risco de inadimplência”, diz a nota.
A reportagem do Jornal do Commercio procurou ainda as operadoras Bradesco Saúde e Sulámerica Saúde que preferiram não comentar.
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