O impacto da Renda Básica Emergencial (RBE) sobre a economia do Nordeste é maior do que o geral para o País, o que pode colaborar para que a região atravesse melhor a crise econômica provocada pela pandemia do coronavírus. É o que se pode avaliar no estudo feito pelo economista Écio Costa, professor pesquisador da Universidade Federal de Pernambuco, junto com Marcelo Freire, gerente de desenvolvimento da Secretaria de Desenvolvimento Econômico de Pernambuco. A pesquisa mostra o impacto do auxílio emergencial no PIB nominal de cada Estado. Com as cinco parcelas de R$ 600 por pessoa, a injeção de recursos no Nordeste chega a R$ 65 bilhões, o que representa R$ 6,3% do PIB da região. No Brasil, serão R$ 178,6 bilhões, equivalente a 2,5% do PIB nacional. Só em Pernambuco serão alocados R$ 10,9 bilhões, ou 5,5% do PIB do Estado. Para efeito de comparação, o montante destinado a São Paulo é três vezes maior (R$ 29,7 bilhões), mas o impacto no PIB paulista é de 1,3%.
“No Norte e Nordeste o impacto é maior porque você tem uma população mais pobre, de renda mais baixa”, simplifica Écio Costa. O economista diz que apesar do valor individual parecer pequeno, a pulverização na economia é muito grande. “O impacto não é apenas nos itens básicos como alimentos ou roupas, o efeito é multiplicador. O dono do mercadinho vai vender mais, o que vai obrigá-lo a comprar mais no atacado, o que por sua vez vai favorecer a indústria e a logística. É uma reação em cadeia”, explica Écio Costa.
Como efeito direto do isolamento social as pessoas consomem menos, até por terem renda menor, principalmente os informais. Com o auxílio, essa renda é complementada ou, em alguns casos, multiplicada. É o caso de quem recebe Bolsa Família, onde o auxílio representa mais de duas vezes o valor médio que eles normalmente recebem. Isso causa um estímulo muito forte na economia dos municípios porque tem uma grande participação desses beneficiários”, pontuou Costa.
COMPENSAÇÃO
Para Marcelo Freire, gerente de desenvolvimento da Secretaria de Desenvolvimento Econômico de Pernambuco não é possível dizer ainda que o montante de recursos também funcionaria como uma espécie de compensação para a perda de arrecadação dos estados. “É certo que boa parte desse dinheiro não vai ficar nos bancos, vai se transformar em consumo. Agora, o quanto desse consumo vai gerar de arrecadação é o que precisamos avaliar. Levando em conta também aquelas empresas que fecharam as portas e deixaram de faturar”, observou Marcelo.
O economista Écio Costa pondera que ainda não é possível dizer que o impacto da Renda Básica Emergencial vai representar para o Nordeste uma saída mais rápida da crise, em relação às regiões Sul e Sudeste. “Isto é uma outra avaliação que vamos fazer mais adiante levando em conta como ficaram alguns índices dessas regiões como o PIB e o IDH”, referindo-se ao Índice de Desenvolvimento Humano.
Écio acredita que a experiência com a RBE poderia ser usada para a criação de um programa social mais aperfeiçoado, mesmo porque, está custando caro ao governo. “O pagamento do auxílio vai fazer com que o endividamento do governo federal, em relação ao PIB, aumente para cerca de 95% este ano. Ano passado já foi alto, de 75%. Esse custo não dá para se manter eternamente!”, diz Costa. Para o futuro, Écio Costa projeta uma convergência de programas sociais focados, mais uma vez, na transferência direta de recursos. “Por exemplo, o imposto de renda negativo, onde os mais ricos pagam mais e os mais pobres recebem, ao invés de pagarem. O importante é que a política pública caiba no orçamento federal para que ele seja contínuo, permanente, sem levar a União a falência”, conclui.
Após anunciar a prorrogação do auxílio emergencial de R$ 600 por dois meses, o governo abriu um crédito extraordinário de R$ 101,6 bilhões para o Ministério da Cidadania executar a medida. Com isso, a previsão do custo total do programa passa a ser de R$ 254,2 bilhões. O auxílio emergencial é a mais cara das medidas anticrise tomadas pelo governo durante a pandemia e seu custo já representa mais que o dobro do déficit primário registrado pelo governo em 2019 (rombo de R$ 95 bilhões). Até agora, os recursos para o auxílio emergencial foram liberados por meio de quatro MPs (medidas provisórias) desde abril, que abriram créditos extraordinários (instrumento que não entra na conta do teto de gastos e pode ser usado em momentos de calamidade). Ainda é incerto, no entanto, o custo final do programa, visto que não se sabe por quanto tempo ele vai durar. O ministro da Economia, Paulo Guedes, sinalizou em comissão no Congresso uma possível prorrogação extra se os números da pandemia do coronavírus não caírem.
CRÍTICAS
O prefeito de Afogados da Ingazeira, no Sertão de Pernambuco, José Patriota (PSB), diz que os recursos do auxílio emergencial no município são utilizados pela população, basicamente para a compra de alimentos. Ele lamenta que na cidade de 40 mil habitantes, onde cerca de cinco mil recebem Bolsa Família, muita gente cadastrada ainda não recebeu, e está esperando a aprovação do benefício. “É muita gente na incerteza”, lamentou. Já o prefeito da cidade de Triunfo, também no Sertão do Estado, João Batista (PSB), criou uma espécie de auxílio emergencial municipal, para contemplar aqueles que foram “rejeitados” pelo auxílio federal. “O auxílio emergencial é importante e atendeu principalmente os informais, mas não a todos que precisavam”.
Cerca de 100 moradores da cidade, de 15 mil habitantes, começaram a receber no mês passado a parcela de R$ 300 do auxílio pago pela prefeitura. A ajuda vai até esse mês de julho, mas pode ser ampliada, diz João Batista. “A principal atividade do nosso município é o turismo e o auxílio municipal está ajudando principalmente os guias de turismo, condutores de vans, donos de bares e pequenos restaurantes, essa gente que ficou sem atividade e sem renda por conta do isolamento social”. O prefeito defende ainda que o benefício do governo federal seja ampliado e se torne permanente para a região. “Há um déficit para com o Nordeste em relação a investimentos e distribuição de renda, então seria uma preocupação legítima manter esse benefício”, afirmou Batista.
FRAUDES
Reconhecido como uma medida importante para proteger os mais vulneráveis, o auxílio chega a mais de 64 milhões de beneficiários e tem diversos registros de fraudes. Uma triagem do TCU (Tribunal de Contas da União) identificou 17 mil mortos entre os beneficiários. De acordo com a apuração da corte, ao menos 620 mil pagamentos foram feitos indevidamente até abril, no valor total de R$ 427,3 milhões. Os recursos gastos com mortos chegam a R$ 11 milhões.
Em maio, foram identificados pagamentos do auxílio a mais de 73.242 militares, pensionistas, dependentes e anistiados cadastrados na base de dados do Ministério da Defesa. A estatal Dataprev é a responsável por averiguar se as pessoas cadastradas podem receber o auxílio e repassar a lista de aprovados à Caixa e está criando um núcleo antifraude para atuar em parceria com demais órgãos do governo. Mesmo assim, a Dataprev deixou de informar por que as falhas ocorreram e o que está sendo feito para que elas não se repitam, que funcionários aprovaram os pagamentos e se estão sendo alvo de alguma apuração, e o que a empresa pretende fazer para os recursos pagos indevidamente retornarem aos cofres públicos.
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