política econômica

Chefe do Banco Central diz que 'economia não gira em torno da taxa Selic'

Ao ouvir de um empresário, no evento Lide Brazil Conference, que o elevado nível dos juros atrapalha o crescimento do Brasil, respondeu que só 20% do crédito é ligado à Selic; o restante é relacionado a taxas longas

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Publicado em 22/04/2023 às 8:47
2020-09-24/Raphael Rbeiro/BCB
O dirigente lembrou que a Argentina aumentou a meta e a taxa de juros caiu, mas a inflação disparou - FOTO: 2020-09-24/Raphael Rbeiro/BCB

O presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, disse em Londres que a economia não gira em torno da taxa Selic. Ao ouvir de um empresário, no evento Lide Brazil Conference, que o elevado nível dos juros atrapalha o crescimento do Brasil, respondeu que só 20% do crédito é ligado à Selic; o restante é relacionado a taxas longas.

"Se a gente não conseguir fazer um movimento na Selic com credibilidade, a taxa longa não cai", justificou ele.

O presidente do BC afirmou ainda que o que move o Brasil não é a taxa de juros de um dia, mas a taxa de juros de três, cinco, dez anos. "Para fazer com que a queda da Selic gere um movimento de queda prolongada de juros, precisa ter credibilidade. O BC está esperando o melhor momento para fazer que isso tenha um ganho real para as pessoas. A economia não gira na Selic."

Para justificar a necessidade de se manter a Selic no patamar em que se encontra, Campos Neto comparou a política monetária a uma tubulação de água que se encontra entupida. Ou seja, para se atingir o fluxo de água desejado numa tubulação entupida, e neste caso pelo elevado porcentual de crédito, o BC precisa elevar a pressão da água.

"Uma das coisas que explicam a tubulação de política monetária entupida é o elevado porcentual de crédito direcionado", disse, explicando que quando isso ocorre e a política monetária muda, o BC não tem influência sobre o porcentual.

De acordo com ele, para se ter o efeito desejado, o BC aumenta a pressão de juro na "tubulação congestionada". "É o efeito que a gente chama também da meia entrada. Se você tem a meia entrada, a principal tem de ser mais cara para compensar", disse acrescentando que, enquanto no Brasil há 40% de direcionamento de crédito, em outros países o índice é de, em média, 4%.

"Isso explica, em parte, o porquê de às vezes o nosso juro ser mais alto. É porque um componente de crédito subsidiado mais alto faz com que a política monetária tenha menos efeito".

Campos Neto insistiu que, estruturalmente, a taxa de juro tem de ser maior quando o componente de crédito subsidiado é também maior. "Isso não é porque eu acho A ou B correto ou errado. Isso é um estudo que sai da relação entre potência da política monetária e o espaço que a gente tem."

Sobre os argumentos de que a taxa de juro real no Brasil é muito alta, o presidente do BC diz que se for comparar a taxa real de um país que já aumentou a taxa nominal com países que ainda estão subindo a sua taxa nominal de juro, o resultado da comparação das taxas reais será distorcido.

Presidente do BC fez um discurso amparado em números

"A gente precisa medir contra o núcleo da inflação, dado que nossa inflação cheia tem a contaminação da desoneração dos preços de comunicação, gasolina e energia elétrica. Isso afetou a inflação cheia. Mas ela é alta, mas não está muito distante das dos outros."

O presidente do BC fez um discurso amparado em números, no qual defendeu com veemência o sistema de metas de inflação e a autonomia do BC. "O anseio pela queda de juros é político, mas nosso trabalho é técnico."

O dirigente lembrou que a Argentina aumentou a meta e a taxa de juros caiu, mas a inflação disparou. Segundo ele, se o BC não tivesse aumentado a taxa de juros na eleição, hoje a Selic seria de 18,75%. "Quando a inflação sai do controle, as empresas e o ricos se adaptam, mas os pobres não. Inflação é desigualdade e aumento de pobreza. Quem tem menos recursos não consegue se proteger."

O economista frisou que, se for feito um ajuste de juros "sem as condições", o resultado pode ser "desastroso" para o crédito. "Países que abandonaram o sistema de meta entraram num sistema inflacionário muito alto", completou.

No momento mais aguardado do evento, Campos Neto respondeu à "súplica" feita ontem pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) pela redução "imediata" da taxa de juros.

"O Banco Central é um órgão técnico, que toma decisões baseadas em critérios técnicos. O timing técnico é diferente do timing político", disse. "Por isso que a autonomia (do BC) é importante: para dar à sociedade a garantia de que a gente tem funcionários técnicos e que tomamos decisões sem viés político".

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