Pobres e ricos não se assemelham nem mesmo quando o assunto é o impacto da inflação no orçamento. Enquanto as famílias de baixa renda estão preocupadas com o aumento nos preços para comer e morar, os mais abastados observam a alta dos serviços. Isso explica porque na pandemia da covid-19, a inflação penalizou (em geral) mais os pobres do que os ricos no Nordeste.
Com um grande número de pessoas da baixa renda (até 1,5 salário mínimo por mês), a região também registrou a maior inflação do País, entre janeiro de 2020 a março de 2023, acumulando alta de 26,46%, enquanto a média das demais regiões foi de 23,51%.
Nesta terça-feira (9), o Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV IBRE) divulgou o Índice de Preços ao Consumidor Regional (IPC-Regional), com destaque para o Nordeste, mostrando que o 'monstro' da inflação ganha aparência diferente, dependendo da região do Brasil ou do nível de renda da população.
Famílias de baixa renda comprometem uma parcela maior do orçamento com alimentos (30,65%) e habitação (28,65%), somando quase 60% do gasto mensal. Já os hábitos de consumo das famílias de alta renda (acima de 11,5 salários mínimos por mês) são diferentes. Quanto mais se ganha, menos se compromete a renda com alimentos. Para os ricos, contam os gastos com transporte próprio (25,4%) e habitação (22,3%).
Entre janeiro de 2020 e março de 2023, os alimentou tiveram aumento de 43,24%, muito acima da inflação. O estudo da FGV aponta dez alimentos que pressionaram a inflação neste período. Aparecem nesta lista óleo de soja (119,02%), arroz (80,41%), milho de pipoca (76,46%), farinha de mandioca (74,45%), açúcar cristal (59,71%), margarina (59,43%), linguiça (58,49%), ovos (56,48%), leite em pó (54,05%) e pão francês (46,37%).
DE VILÃO A ALIADO
Várioas fatores influenciaram a inflação entre janeiro de 2020 e março de 2023. Além da pandemia de Covid-19, teve a crise hídrica e
aumento do preço do petróleo em 2021, culminando com o conflito geopolítico entre Rússia e Ucrânia em 2022, que afetou novamente o preço do petróleo, bem como de importantes commodities agrícolas, como trigo e milho.
Os alimentos foram o maior desafio de 2020, com elevação dos precós por conta do avanço da demanda. Em 2021, foi a vez da crise hídrica afetar o preço da energia e a alta do petróleo impactar o preço dos combustíveis. Por fim, em 2022, os preços dos alimentos sofreram novo impulso por causa da guerra.
Na avaliação do coordenador dos Índices de Preços do FGV IBRE, André Braz, que apresentou o estudo, os alimentos que contribuíram para acelerar a inflação da população pobre nos últimos anos, desta vez servirá como atenuador do impacto.
"Nos últimos anos, a alimentação puxou a inflação da baixa renda para cima, mas para este ano se tem outra perspectiva. Não houve crise hídrica e o País deverá ter uma boa safra de alimentos. Isso vai promover uma descompressão inflacionária para os mais pobres. No caso dos mais ricos a situação é outra", destaca.
As famílias de alta renda deverão se deparar com a aceleração da inflação no segundo semestre, graças à expectativa de padronização do ICMS entre os Estados, do retorno da cobrança do PIS, Cofins e Cide sobre a gasolina e da flutuação no preço do barril de petróleo.
"Diante de tudo isso e das dúvidas sobre o processo de política fiscal no Brasil, o processo inflacionário ainda preocupa e ela deverá ficar acima da meta até 2024. Minha previsão é que feche em 6,2% este ano, superando os 5,79% de 2022. No caso do Nordeste, a estimativa é que a alta de preços para os pobres seja de 5,84% e dos ricos fique em 6,4%", projeta.
NORDESTE
Ao longo deste ano, a FGV vem divulgando uma série de estudos dedicados ao Nordeste, fortalecendo sua presença na região, que será ainda mais relevante com a instalação do Centro de Estudos para Desenvolvimento do Nordeste. Segundo o pesquisador associado do FGV IBRE e futuro coordenador do Centro, Flávio Ataliba, o espaço tem previsão de inaugurar em agosto deste ano, em Fortaleza.
Com recorte regional, a FGV trouxe uma sondagem do mercado de trabalho no Nordeste, um estudo do PIB em 2021 e 2022 na região e agora a inflação.