Depois de 24 anos, o Brasil terá um novo sistema de metas de inflação. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, anunciou que o regime deixará de se pautar pelo modelo de ano-calendário (de janeiro a dezembro), que vigora desde 1999, para seguir um objetivo contínuo. A mudança vai valer a partir de 2025, com uma meta estabelecida em 3% - com intervalo de tolerância de 1,5 ponto porcentual para mais ou para menos.
O anúncio foi feito depois de reunião do Conselho Monetário Nacional (CMN), que é integrado pelos ministros da Fazenda e do Planejamento (Simone Tebet) e ainda pelo presidente do Banco Central (Roberto Campos Neto).
Segundo Haddad, ele fez apenas uma "comunicação" ao CMN sobre a alteração do regime de metas por "lealdade" ao BC, já que a decisão é uma atribuição do presidente da República - resolvida por meio de decreto. Nem Haddad nem Simone deram previsão de quando o ato do Executivo será publicado.
"Essa decisão não cabe ao CMN, o que fiz foi comunicar. Até por lealdade ao BC, para que ele não fosse surpreendido por decreto do governo sem ser comunicado. Aproveitei a reunião do CMN, que discute exclusivamente meta, e comuniquei a decisão do governo, que é competência do presidente da República", disse ele, acrescentando que não houve objeção de Campos Neto à alteração.
Pelo anúncio feito ontem, o BC passará a considerar um horizonte maior de tempo para cumprir as metas de inflação - de 24 meses. Mas isso não foi detalhado. Em outro momento, Haddad disse que isso será definido pela autarquia.
Na prática, com o regime contínuo o País vai perseguir uma meta única para a inflação ao longo do tempo, repetindo o modelo que existe hoje na maioria das economias desenvolvidas, como os Estados Unidos. Na avaliação de especialistas, no caso brasileiro a mudança de regime pode ajudar a suavizar os movimentos de baixa e de alta dos juros nos casos de algum choque inflacionário.
Entre março de 2021 e agosto de 2022, por exemplo, o Comitê de Política Monetária (Copom) do BC elevou os juros de 2% para o atual patamar de 13,75% ao ano na tentativa de combater o aumento da inflação depois dos choques provocados pela pandemia. "Os choques de inflação levam tempo para dissipar.
Às vezes, não precisa ter um custo tão alto. (Com a meta contínua) O ciclo poderia ter sido interrompido numa taxa de juros um pouco menor. Não teria impacto negativo tão forte, desacelerando a economia e o crédito", afirma Rafaela Vitória, economista-chefe do banco do Inter.
Um outro ponto destacado é o de que o novo regime reduz o risco de populismo econômico. Para deixar a inflação dentro dos limites estabelecidos pela meta, muitos governantes optavam por segurar tarifas de transporte público, preços de combustíveis e de energia elétrica.
UNÂNIME
A ministra do Planejamento também frisou que não houve objeção para a mudança do sistema, e que a troca está convergente com os indicadores de mercado. "Os votos foram por unanimidade, e não houve objeção. As expectativas do mercado e o Focus, do Banco Central, já mostram que em 2024, 2025 e 2026 estamos dentro da meta (de inflação). Consequentemente, não tinha sentido (mudar esse nível)", disse ela, reiterando que esta também foi a análise técnica do Ministério do Planejamento.
Haddad explicou que a mudança a partir de 2025 foi definida porque será a data em que se iniciará o mandato do próximo presidente do Banco Central (Campos Neto deixará o cargo em dezembro de 2024).
Os alvos para a meta de inflação em 2023 (de 3,25%), 2024 (3%) e 2025 (3%) já estavam estabelecidos pelo CMN, todos com uma banda de tolerância de 1,5 ponto porcentual para cima e para baixo. Com a mudança no regime, a meta de 2026 em diante também ficará em 3%. As anteriores permaneceram inalteradas.