Blocos econômicos

Ingresso de novos países bagunça organização dos Brics, mas Brasil poderá se beneficiar, defende especialista

Cúpula do Brics decidiu convidar formalmente Arábia Saudita, Argentina, Emirados Árabes Unidos, Egito, Irã e Etiópia para se tornarem novos membros dos Brics

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Adriana Guarda

Publicado em 25/08/2023 às 19:33
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A partir de 1º de janeiro de 2024, os Brics - grupo de países formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul - vai dobrar de tamanho. Na quinta-feira (24), a Cúpula do Brics decidiu convidar formalmente Arábia Saudita, Argentina, Emirados Árabes Unidos, Egito, Irã e Etiópia para se tornarem novos membros do bloco. 

Desde que foi criado, em 2001, com o ex-economista do banco Goldman Sachs, Jim O’Neill, nomeando o grupo pelo acrônomo Brics (palavra que resulta das iniciais dos países), o único novo nome a ingressar no bloco foi a África do Sul, em 2011. Essa será a primeira vez que um grande número de nações entra no grupo ao mesmo tempo.

Um dos questionamentos que se faz é se a grande diversidade de interesses deixará os Brics cada vez mais fragmentado. A Doutora em Ciência Política pela Universidade Federal de Pernambuco, Prescila Lapa, acredita que o bloco econômico não deverá sofrer um processo de descaracterização, mas uma indefinição de interesses e uma dificuldade de consenso. 

NÁDIA TUDE/DIVULGAÇÃO
A cientista política Priscila Lapa, que participa do programa Corrida Eleitoral, nos canais do SJCC, e é articulista deste JC - NÁDIA TUDE/DIVULGAÇÃO

"A ideia inicial de expansão dos Brics seria de fortalecimento, de criação de novos mercados, de fortalecimento dessas economias. O problema é que não se tem uma agenda clara, específica e precisa. A chegada de novos atores coloca outros interesses e quais desses interesses passam a fazer parte e a compor as prioridades da pauta dos Brics?", questiona. 

A cientista política também indaga como se constroem consensos entre tantos países, com interesses tão diversos e com permanência de tempo diferente dentro do grupo (fundadores e novatos).

"Outra questão importantíssima quando se fala de blocos econômicos é compreender quais são os pontos de consenso. Porque, mesmo formando um bloco, cada país tem seu conjunto de interesses e especificidades, que muitas vezes se confrontam com aqueles que fazem parte do mesmo bloco. A chegada desses novos atores bagunça um pouco, podemos dizer assim, os consensos que podiam já estar estabelecidos, de olhar para o mesmo horizonte, olhar para as mesmas pautas", diz, citando como exemplo a questão ambiental. 

DITADURAS ÁRABES E ARGENTINA

O novo desenho dos Brics também é criticado pelo ingresso de ditaduras árabes no grupo e pela sempre em crise Argentina. A entrada dos árabes foi 'patrocinada' pela China, que tem interesse em fortalecer o bloco para ampliar sua influência geopolítica e fazer frente ao arquirrival Estados Unidos. 

Com a expansão, os Brics ganharão três ditaduras árabes (Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos e Egito), além de dois países em situação de crise econômica aguda: a Argentina, mergulhada em inflação alta, endividamento e desemprego; e a Etiópia, recém-saída de uma guerra civil.

O Brasil relutou em apoiar a ampliação dos Brics, mas foi minoria. Agora terá que se explicar ao mercado internacional pelo fato de se juntar a países em estágios atrasados de desenvolvimento da democracia. 

"O fato de ter ditaduras no bloco vai puxar essa discussão democrática para baixo. Isso coloca o Brasil numa situação delicada perante outras democracias e outros mercados importantes. Se já existe uma visão de que o Brasil adota posições dúbias em relação a essa questão das ditaduras internacionais, a participação do País num bloco integrado por ditaduras que não têm vergonha de esconder que fazem essa apologia a governos não-democrático traze um problema para dentro de casa. Você começa a ter que justificar sua participação e sua anuência ou não a certas pautas", observa Priscila Lapa. 

PAPEL DE LULA 

Mesmo com os desafios que a nova configuração dos Brics vai trazer a partir do próximo ano, a cientista política Priscila Lapa acredita que o Brasil pode se beneficiar. "Em certas aspectos, o Brasil pode começar a criar caminhos alternativos para o seu crescimento, para captação de investimento e para atração de outros olhares para a economia brasileira. Mas o presidente Lula terá muita dor de cabeça e será exigido um jogo de cintura imenso, maior do que na composição anterior", alerta.

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