O papa Francisco e a crise climática
PADRE MOISÉS FERREIRA LIMA
No dia 21 de agosto, o Papa Francisco, ao receber, em audiência no Vaticano, uma delegação de advogados de países membros do Conselho da Europa, signatários do Apelo de Viena, anunciou que estava preparando uma segunda parte da sua Encíclica Laudato Si’ (Louvado seja) sobre o cuidado da casa comum. No dia 04 de outubro, publicou a Exortação apostólica Laudate Deum (Louvai a Deus), dirigida a todos os homens de boa vontade, sobre a crise climática.
Alertou o papa que se trata de um problema social global que está intimamente ligado à dignidade da vida humana, uma vez que as consequências da mudança climática atingirão a vida das pessoas e famílias, sobretudo as mais vulneráveis, e seus efeitos serão sentidos em termos de saúde, emprego, acesso aos recursos, habitação, migrações forçadas e noutros âmbitos, e é um exemplo chocante de pecado estrutural.
O papa Francisco critica os diversos argumentos que negam as mudanças climáticas, os que alegam que a redução do uso de combustíveis fósseis e o desenvolvimento de formas de energia mais limpa levarão à diminuição dos postos de trabalho e também os que culpam os pobres de terem demasiados filhos. Afirma que a origem humana (antrópica) da mudança climática já não se pode pôr em dúvida e que na base do processo atual de degradação ambiental está o paradigma tecnocrático: modo desordenado de conceber a vida e a ação do ser humano, que contradiz a realidade até ao ponto de a arruinar. Consiste, substancialmente, em pensar como se a realidade, o bem e a verdade desabrochassem espontaneamente do próprio poder da tecnologia e da economia. Contrariamente a este paradigma, a vida, a inteligência e a liberdade do homem estão inseridas na natureza que enriquece o nosso planeta, fazem parte das suas forças internas e do seu equilíbrio.
Aponta também a fragilidade da política internacional sobre a crise climática e propõe a necessidade de “organizações mundiais mais eficazes, dotadas de autoridade para assegurar o bem comum mundial, a erradicação da fome e da miséria e a justa defesa dos direitos humanos fundamentais”. Reconhece os avanços e as falhas das diversas conferências sobre o clima e manifesta o desejo de que os que intervenham na 28ª Conferência de Mudanças Climáticas da Organização das Nações Unidas (COP28), a ser realizada em Dubai, a partir de 30 de novembro deste ano, “sejam estratégias capazes de pensar mais no bem comum e no futuro dos seus filhos, do que nos interesses contingentes de algum país ou empresa. Possam assim mostrar a nobreza da política, e não a sua vergonha.”
A preocupação com o meio ambiente, diz o papa, tem suas motivações espirituais, tanto para os católicos como para os membros de outras religiões porque a fé autêntica não só dá força ao coração humano, mas transforma a vida inteira, transfigura os objetivos pessoais, ilumina a relação com os outros e os laços com toda a criação. A fé no Deus criador leva à responsabilidade perante a terra que é de Deus e implica que o ser humano, dotado de inteligência, respeite as leis da natureza e os delicados equilíbrios entre os seres deste mundo. Relembra o bispo de Roma que “nós e todos os seres do universo, sendo criados pelo mesmo Pai, estamos unidos por laços invisíveis e formamos uma espécie de família universal, uma comunhão sublime que nos impele a um respeito sagrado, amoroso e humilde”.
Como conclusão da exortação apostólica, o papa justifica o título que deu a sua exortação apostólica Laudate Deum: porque um ser humano que pretenda tomar o lugar de Deus torna-se o pior perigo para si mesmo. Louvai a Deus: um convite ao louvor e um alerta.
Padre Moisés Ferreira Lima éPároco de Nossa Senhora de Fátima, em Boa Viagem,
e presidente da Comissão Arquidiocesana de Pastoral para a Liturgia.