De Roma à Olinda e Recife: caminhar juntos
Sinodalidade é uma palavra que tem ganhado cada vez mais atenção em paróquias e comunidades católicas, e ela significa basicamente caminhar juntos

GABRIEL MARQUIM
A essa altura dos acontecimentos, é muito provável que toda pessoa que acompanha com maior atenção a vida da Igreja Católica já tenha percebido que o papa Francisco deu início a processos decisivos no caminho dessa mesma Igreja. Um dos mais recentes foi convocar um Sínodo sobre sinodalidade. Verdade, aqui é preciso fazer uma pausa e explicar algumas coisas. Vamos a elas, portanto.
Sinodalidade é uma palavra que tem ganhado cada vez mais atenção em paróquias e comunidades católicas, e ela significa basicamente caminhar juntos, fazer um percurso conjuntamente. Trata-se de uma palavra – e mais ainda de uma prática – que esteve muito presente nos primeiros séculos do cristianismo, mas foi perdendo a sua força por motivos dos mais diversos. Na segunda metade do século XX, com o Concílio Vaticano II, os papas revigoraram essa prática, que Francisco agora ousou dar contornos inéditos. Por exemplo, antes, essas reuniões congregavam apenas bispos, depois foram inseridos leigos, mas sem direito a votar; agora, participam bispos, homens e mulheres leigos, com direito a voto. É um passo considerável.
Para o papa Francisco, as motivações para essa escolha são muitas. Em primeiro lugar, ancoram-se nas Sagradas Escrituras, depois, como já dito, nos primeiros séculos daquelas primeiras comunidades cristãs, e de uma máxima que ele gosta de repetir, muito cara no primeiro milênio da Igreja Católica: “o que diz respeito a todos deve ser discutido por todos”. Ou seja, em temas que se referem ao povo de Deus, deve-se convocar este mesmo povo para um caminho que envolve basicamente três etapas: escuta da voz de Deus, discernimento comunitário, decisões e práticas em conjunto.
Francisco tem levado isso tão a sério que, na conclusão da reunião deste último sínodo – iniciado em 2021 e concluído agora – decidiu não fazer uma declaração própria após a divulgação do texto aprovado pelo conjunto dos seus participantes. Como papa, teria o direito de ter a última palavra, mas abdicou dela como um sinal: quer uma Igreja mais participativa, responsável e comunitária. Deixando de falar por último, falou mais alto. É o modo de proceder de um papa que fala mais pelos gestos do que por palavras.
Tal processo é tão relevante que tem se tornado, felizmente, uma prática mais recorrente em dioceses pelo mundo. É o caso da Arquidiocese de Olinda e Recife. Dom Paulo Jackson, na esteira da sinodalidade franciscana – do papa e do santo de Assis – convocou um sínodo arquidiocesano, iniciado agora, e que deve ser concluído em 2026, na celebração dos 350 anos da Diocese de Olinda. Será um momento realmente importante para os católicos se debruçarem sobre o caminho que tem sido feito em um território onde habitam mais de 4 milhões de pessoas e que, portanto, deverá escutar, além dos próprios fiéis, aqueles de convicções religiosas distintas e mesmo sem um referencial de fé, além dos poderes públicos e outros setores.
Ou seja, promete ser um momento decisivo, claro, para a Igreja Católica em si, mas, por que não, também para todos os 19 municípios onde esta Arquidiocese está presente. Afinal, se sinodalidade significa “caminhar juntos”, ninguém pode ser deixado de lado. Ganham todos os lados. Que assim seja.
Gabriel Marquim é jornalista, professor universitário, fundador da Comunidade dos Viventes, e presidente da Comissão de |Redação do Sínodo da Arquidiocese de Olinda e Recife.