Mudanças climáticas

Recife adere à campanha "Corrida ao Zero", encampada pelo governo britânico

Prefeito João Campos teve encontro virtual com o embaixador britânico, Peter Wilson, que está divulgando uma campanha para zerar as emissões líquidas de gases de efeito estufa

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Maria Luiza Borges

Publicado em 01/05/2021 às 22:19 | Atualizado em 01/05/2021 às 23:59
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Peter Wilson, embaixador do Reino Unido no Brasil desde julho de 2020, está empenhado em divulgar a Cop26 (Conferência da ONU de Mudanças Climáticas), que será sediada na Escócia em novembro próximo, e também a campanha Race to Zero, que visa zerar as emissões líquidas de gases de efeito estufa até 2050. Na semana passada, após uma conversa virtual em que obteve compromissos ambientais do prefeito do Recife, João Campos, ele concedeu entrevista ao Jornal do Commercio. Wilson já atuou como embaixador nos Países Baixos e foi representante do seu país na Organização para a Proibição de Armas Químicas (OPCW) até 2020. Também exerceu funções diplomáticas na Missão do Reino Unido na ONU, em Nova York e em Pequim, Islamabad e Bruxelas. Fala fluentemente mandarim e francês e tem se dedicado a aprender o português. É mestre em administração pública pela Kennedy School de Harvard e formado em história moderna pela Universidade de Oxford.

Jornal do Commercio - O senhor está realizando uma série de conversas com autoridades nordestinas. Qual o propósito desses encontros? 

Peter Wilson - Tenho encontros virtuais com os prefeitos do Recife, João Pessoa e Maceió para fortalecer as relações entre o Reino Unido e suas respectivas cidades. Gostaria também de incentivá-los a aderirem formalmente à Campanha Race to Zero (Corrida ao Zero). O prefeito do Recife, João Campos, assinou durante nosso encontro a adesão à campanha. Este ano o Reino Unido receberá a Conferência da ONU de Mudanças do Clima (COP26) e estamos trabalhando com todos os países, incluindo o Brasil, mas também com estados, cidades e empresas para encorajar compromissos e ações ambiciosas pelo clima. Essas visitas virtuais fazem parte de meu primeiro engajamento com a região neste sentido.

JC - Como foi a conversa com o prefeito do Recife, João Campos?

PW - A conversa com o prefeito foi muito produtiva. Fiquei feliz em acompanhar a adesão oficial da cidade de Recife à campanha Race to Zero, campanha global da ONU para reunir compromissos voluntários de governos subnacionais, empresas, e sociedade para alcançar emissões líquidas zero de gases de efeito estufa até 2050. O Reino Unido foi o primeiro País no mundo a se comprometer a zerar emissões e compartilhamos com Recife a visão de que ser pioneiros nos abre oportunidades de desenvolvimento e empregos para nossas populações na nova economia global verde. Falamos sobre a cooperação que já temos entre o governo britânico e a cidade do Recife e, como ambos assumimos o cargo recentemente, a nossa a vontade mútua de fortalecermos esses laços ainda mais.

O Reino Unido foi o primeiro País no mundo a se comprometer a zerar emissões. Compartilhamos com Recife a visão de que ser pioneiros nos abre oportunidades de desenvolvimento e empregos

JC  - Que projetos de parceria existem entre Prefeitura do Recife ou o Estado de Pernambuco com o governo britânico?

PW - Temos alguns projetos com a cidade e o estado: um deles visa melhorar a eficiência da gestão dos serviços de água e saneamento na Região Metropolitana do Recife, através do uso de tecnologias inovadoras para controlar as perdas de água na rede de abastecimento, melhorando o acesso destes serviços para toda a população. Recife também será a sede do UK-Brazil Tech Hub, que tem como objetivo apoiar o desenvolvimento do ecossistema digital brasileiro através da formação de habilidades digitais, empreendedorismo e parcerias globais. Outro projeto é voltado ao desenvolvimento do Port Community System (PCS), plataforma que visa facilitar o fluxo de informações entre os diversos atores da comunidade portuária, a fim de agilizar a execução dos processos do Porto de Suape e aumentar o fluxo de comércio. Na área da educação, ficamos contentes em ver muitos pernambucanos que tiveram a oportunidade de estudar no Reino Unido através do nosso programa de bolsas de estudo, o Chevening, e queremos aumentar ainda mais a participação dos representantes nordestinos.

JC - Recentemente um grupo de 24 governadores tomou a iniciativa de enviar carta ao embaixador americano com críticas ao governo Bolsonaro sobre a forma como lida com as questões climáticas e também propondo um acordo diretamente com os governos estaduais com o objetivo de promover a proteção ao meio ambiente. Houve alguma gestão semelhante junto à Embaixada Britânica? Caso houvesse, que encaminhamento seria dado?

Como anfitrião da COP26, estamos em diálogo com os governos em todos os níveis - federal, estadual e municipal, bem como o setor privado e a sociedade civil.  Entendemos que enfrentar as mudanças do clima é um dever de todos, e não uma pauta de um governo ou outro, e só conseguiremos efetivamente avançar se todos estiverem a bordo. Posso exemplificar nossa relação próxima com o Consórcio da Amazônia, no sentido de entender os desafios da região e apoiar ações de combate ao desmatamento e apoio ao desenvolvimento econômico sustentável nesses estados. Além disso, nos últimos meses firmamos acordos de cooperação com os governadores de Minas Gerais e São Paulo para apoiar a descarbonização das economias do estado e também seus engajamentos com esta mesma campanha, a Race to Zero.

JC - Como o governo britânico tem tratado a questão climática? E nesse contexto, como está a relação com o governo brasileiro, que tem recebido críticas internacionais com relação a questões relativas ao meio ambiente?

PW -  O Reino Unido acredita que as mudanças do clima são um dos maiores desafios que precisamos enfrentar enquanto civilização. Por isso, como presidência da próxima COP, queremos contribuir com a ampliação do debate público sobre as mudanças climáticas aqui no Brasil, trabalhando com atores em todos os níveis – governos, setor privado, academia, sociedade civil e a imprensa – para dar visibilidade a esta discussão baseado em evidências científicas. Como presidentes da COP26, poderemos considerar que ela foi bem-sucedida se conseguirmos concluir bem as negociações dos trechos finais do Acordo de Paris, mas, principalmente, se conseguirmos dar uma guinada para implementação e ação no mundo real, tirando o Acordo de Paris do papel. Esse é o nosso principal objetivo. 

Foi importante ver o anúncio do Brasil na Cúpula de Líderes do Clima dos Estados Unidos que aconteceu recentemente, onde o país antecipou a sua meta de zerar emissões de gases de efeito estufa até 2050, antecipando em dez anos a sinalização anterior, e eliminar o desmatamento ilegal até 2030. É importante avançar na implementação de ações concretas e vamos continuar colaborando com o Brasil rumo à COP26. Entendemos que a cooperação internacional é vital para avançar o tema das mudanças climáticas. O Brasil é um parceiro importante nesta empreitada e não pode ser deixado de lado pois tem um papel fundamental a desempenhar.

Foi importante ver o anúncio do Brasil na Cúpula de Líderes do Clima dos Estados Unidos, onde o país antecipou em dez anos a sua meta de zerar emissões de gases de efeito estufa até 2050.

JC - Apesar de todos os discursos, as nações desenvolvidas não alçancaram a promessa de atingir repasse de US$ 100 bilhões anuais até 2020 para ações climáticas nos países pobres, segundo relatório divulgado pela ONU. Como será possível compensar essa lacuna? E que ações são consideras emergenciais para deter as mudanças climáticas?

Financiamento é uma das questões principais da presidência do Reino Unido na COP26. Trabalharemos para fortalecer o compromisso político e, ao mesmo tempo, melhorar o acesso ao financiamento nos países em desenvolvimento. Mas os financiamentos não são apenas dos países. Queremos aumentar e facilitar todas as formas de financiamento. Neste sentido, o financiamento privado tem um papel crítico a desempenhar em uma transição bem-sucedida para uma economia de carbono zero. E vamos trabalhar com setores privados e financeiros e investidores para garantir que todas as decisões financeiras levem em conta as mudanças climáticas.

Em relação ao setor público, o Financiamento Internacional para o Clima (ICF) do Reino Unido já apoiou mais de 100 países, incluindo o Brasil, e está ajudando a reduzir ou evitar um total de 16 milhões de toneladas de emissões de gases de efeito estufa. Isso equivale a tirar 3,3 milhões de veículos de passageiros das estradas por um ano. Mas faremos muito mais. Nos comprometemos a dobrar o valor do ICF para £11,6 bilhões nos próximos cinco anos para apoiar os países em desenvolvimento. Somente no Brasil, executamos programas importantes com o objetivo de combater o desmatamento, melhorar os meios de subsistência e reduzir as emissões totalizando £ 259 milhões.

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