GUERRA

Lágrimas, medo e raiva em Kiev, na Ucrânia, após disparos de mísseis russos

Ucranianos não escondem a raiva contra a Rússia e os ocidentais, que, segundo eles, não apoiam suficientemente o país

Imagem do autor
Cadastrado por

AFP

Publicado em 14/03/2022 às 22:30
Notícia
X

Lidia Tikhovska olha para a cratera deixada por um míssil russo que caiu sobre Kiev. Entre os escombros, imagina os restos carbonizados de seu filho, que morreu no ataque.

"Ele está estirado ao lado do carro, mas não me deixam passar", sussurra a Lidia, 83. Seu filho, 58, havia acabado de deixar a loja onde comprou comida e outros itens básicos. Foi o segundo míssil do dia.

O buraco negro que ficou no chão é grande o suficiente para caber um carro. Ao redor, um grupo de policiais e socorristas medem a sua profundidade.

O míssil caiu ao lado do prédio onde Lidia mora, mas ela foca apenas no local one, segundo um socorrista, está o corpo de seu filho Vitali. "Dizem que ele está muito queimado, que eu não o reconheceria, mas quero ver mesmo assim", retruca.

Lágrimas escorrem por seu rosto, enquanto ela segura firme no cotovelo de seu neto, para se apoiar. "Agora ficarei sozinha no meu apartamento. Pra que ele me servirá?", questiona. "Desejo à Rússia a mesma dor que sinto agora."

Senhas

Os combates se intensificaram nos últimos dias na Ucrânia. Em Kiev, os confrontos no noroeste são acompanhados agora de ataques de mísseis de longo alcance. Nesta segunda-feira, duas pessoas foram mortas e uma dúzia ficou ferida.

Uma segunda frente se abre nos vastos distritos industriais localizados no nordeste da capital, uma área um pouco mais afastada. Diante do perigo crescente, nos postos de controle, voluntários armados exigem senhas diferentes dos motoristas que passam.

Os soldados alternam a cor das fitas que usam nos cotovelos e panturrilhas, para distinguir os ucranianos dos sabotadores russos. Essa paranoia quase tangível nas ruas desertas é acompanhada de uma atitude desafiadora em relação às forças do presidente russo, Vladimir Putin.

Pânico

O prefeito de Kiev, Vitali Klitschko, está a poucos passos dos restos do filho de Lidia Tikhovska. O ex-campeão de boxe, cercado de seguranças fortemente armados, veste um colete à prova de balas.

"Os russos querem semear o pânico em nossa cidade", exclama. "Mas isso nunca acontecerá. Isso só motivará ainda mais os ucranianos a defenderem a cidade", ressalta.

Subitamente, uma série de explosões é ouvida na frente norte de Kiev e Klitschko volta para o carro. Ao mesmo tempo, moradores tentam entender por que a Rússia decidiu atacar duas vezes, em um intervalo de poucas horas, essa parte adormecida da cidade.

'Querem mais terror'

O deputado ucraniano Oleksiy Goncharenko, que pegou em armas, não esconde sua raiva contra a Rússia e os ocidentais, que, segundo ele, não apoiam suficientemente seu país.

"Aqui não há alvos militares", afirma Goncharenko, 42, após se deslocar para os locais onde os mísseis caíram. "Eles só atacam pelo prazer de atacar. Eles querem mais terror, para aterrorizar ainda mais as pessoas."

Muitos cidadãos, como Vera Rechechkova, 26, têm medo. “Compramos comida neste quiosque outro dia e a pessoa que trabalhava aqui pode não estar mais viva”, diz ela, que trabalha como cabeleireira.

Juntamente com o namorado, Vera observa a situação a uma quadra do local onde o míssil caiu. "É simplesmente horrível. Não desejo mal a ninguém, mas a Putin...", desabafa, segurando um lenço.

Tags

Autor