GUERRA

Notícias da guerra da Ucrânia: crianças retiradas de Mariupol lutam pela sobrevivência em hospital

Desde o início do conflito, 121 crianças foram mortas, e 167 ficaram feridas segundo direitos humanos do Parlamento ucraniano

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AFP

Publicado em 23/03/2022 às 20:32
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No hospital pediátrico de Zaporizhzhya, no sul da Ucrânia, Milena, 13 anos, se contorce de dor dias depois de ter sido atingida por um disparo no peito quando tentava sair com sua família de Mariupol, localidade cercada pelas tropas russas.

A bala causou danos na boca, na língua e em várias vértebras, mas essa adolescente de cabelo castanho - liso com tranças - vai se recuperar.

O carro em que fugia de Mariupol, cidade portuária do mar de Azov, que sofre o cerco sem trégua da Rússia desde o fim de fevereiro, carregava a inscrição "crianças", como a maioria dos que tentam fugir da cidade, relata sua mãe. Nenhum outro membro da família ficou ferido. A criança foi levada para o hospital pelos mesmos soldados que a atingiram com o tiro.

Centenas de milhares de pessoas ficaram encurraladas em Mariupol, presas em sótãos e privadas de tudo. Milhares de veículos carregados de civis puderam, finalmente, sair em direção a Zaporizhzhya na semana passada, mas o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, afirmou, na terça-feira à noite, que 100.000 habitantes ficaram na cidade e que as ruas estavam cheias de cadáveres.

Espera-se que Milena se recupere plenamente, o que não ocorreu com muitas outras crianças que se encontram no hospital pediátrico da cidade-refúgio. Situado a 250 quilômetros a nordeste de Mariupol, a instituição acolhe crianças procedentes do leste e do sul da Ucrânia, as regiões onde os combates são mais intensos e onde as forças russas fizeram mais avanço desde o início da invasão em 24 de fevereiro.

No leito junto ao de Milena, Vladislav, 5 anos, está entre a vida e a morte. Foi ferido no abdômen quando sua família fugia do avanço das tropas das forças russas em direção ao seu povoado de Polohy, entre Mariupol e Zaporizhzhya. Seu pequeno torso incha e desinfla com dificuldade, com a ajuda de um respirador artificial. Os médicos temem que ele não sobreviva à noite. Se conseguir, carregará uma bolsa de drenagem por toda vida. Não há familiares para cuidar de Vladislav, já que eles também ficaram gravemente feridos por balas e são tratados em outro hospital.

Deficientes por toda vida

"Temos crianças com lesões na cabeça, amputações, abdômens perfurados e fraturas ósseas", descreve o médico-chefe do hospital, Iouryi Borzenko.

"Acredito que ninguém queira ver o que nós vemos", acrescenta.

Desde o início do conflito, 121 crianças foram mortas, e 167 ficaram feridas segundo a última contagem feita, nesta quarta-feira, por Liudmila Denissova, encarregada de direitos humanos do Parlamento ucraniano.

No momento, a cidade de Zaporizhzhya continua sendo relativamente segura, ainda que haja combates nos arredores e, às vezes, sejam ouvidas explosões de longe. Nas janelas do hospital pediátrico, foram colocadas fitas adesivas amarelas para evitar que os estilhaços voem em caso de explosão nas proximidades. Sacos de areia foram empilhados nas esquinas, e se instalou um abrigo no sótão, com camas de metal onde as mães podem alimentar seus bebês.

Os casos mais graves foram retirados da unidade neonatal de cuidados intensivos e abrigados no sótão, já que os equipamentos dos quais necessitam não podem ser transladados rapidamente. É o caso de Micha, bebê de apenas duas semanas, com o rosto e os punhos fechados como se fosse chorar. Nasceu em Tokmak, cidade ao sul de Zaporizhzhya agora controlada pelas forças russas.

Devido à falta de atenção médica, Micha ficou sem oxigênio após sofrer complicações durante o parto. Tem problemas respiratórios e lesões cerebrais que podem incapacitá-lo para sempre.

Ivan Anikin, responsável pela unidade neonatal, explica que o hospital já acolhia crianças feridas desde 2014, devido ao conflito de Donbass, mas seu número aumentou drasticamente desde a invasão. Agora, o pessoal trabalha sem descanso. Por segurança, ele leva sua filha de 14 anos para o hospital junto com ele, cujos corredores ecoam os gritos de dor dos jovens pacientes.

A maioria das crianças que chegam fica deficiente por toda vida, afirmam os médicos.

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