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Trump inelegível? Suprema Corte decide futuro do ex-presidente dos EUA

Suprema Corte julga caso relacionada à legitimidade de Trump de participar das prévias republicanas

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Estadão Conteúdo

Publicado em 08/02/2024 às 17:16
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A Suprema Corte americana foi arrastada para o centro das eleições. Desde esta quinta-feira, 8, os juízes decidem se Donald Trump - que lidera a disputa para ser o candidato do Partido Republicano - pode ser impedido de voltar à Casa Branca por participar de uma insurreição contra o governo americano. No caso, o ataque ao Capitólio de 6 de janeiro de 2021.

O que está em discussão, na prática, é uma decisão da Justiça do Colorado, onde Trump teve o nome barrado das cédulas para as primárias. O veredicto, no entanto, terá repercussão mais ampla já que outros Estados aguardam o parecer da Suprema Corte para saber o que fazer com ações similares. E são dezenas delas pelo país.

A tese que foi acatada pela Justiça do Colorado se baseia em um trecho da Constituição raramente usado na história americana, a seção 3 da 14ª emenda, criada após a Guerra Civil para evitar que secessionistas derrotados no conflito fossem eleitos novamente. Por 4 votos a 3, a Suprema Corte do Estado entendeu que Donald Trump se envolveu em uma insurreição naquele 6 de janeiro. Portanto, ele estaria desqualificado para voltar à Casa Branca e, sendo inelegível, não poderia constar como candidato nas prévias.

O líder republicano recorreu e a Suprema Corte dos EUA aceitou discutir o caso porque a votação se aproxima: em 5 de março, os republicanos do Colorado vão escolher quem será o candidato à presidência. E o líder do partido, que venceu todas as prévias até aqui, está fora da disputa por enquanto.

A Suprema Corte decidir sobre a seção 3 da 14ª emenda também é um fato inédito e, por isso, os resultados são imprevisíveis. Os juízes, no entanto, podem relutar em entrar na disputa política e parece improvável que adotem uma decisão tão explosiva como tornar Trump inelegível.

Quais são as possibilidades para o julgamento?

É esperado que os juízes decidam rápido tendo em vista que as prévias do partido Republicano estão em curso. Nesta quinta, por exemplo, enquanto a Corte ouve os argumentos sobre a inelegibilidade de Donald Trump será a vez de Nevada.

O que eles vão decidir, no entanto, é difícil de prever, mas estas são algumas possibilidades.

Os juízes poderiam, por exemplo, decidir que a 14ª emenda não se aplica ao caso. Isso manteria o líder republicano nas primárias do Colorado e encerraria as dezenas de ações semelhantes pelo país.

A maior parte delas, inclusive, já foi rejeitada, mas ainda cabem recursos e uma decisão da Suprema Corte nesse sentido encerraria a discussão. Além do Colorado, só o Maine decidiu barrar o ex-presidente das prévias e o processo de apelações está em modo de espera pelo parecer que virá de Washington.

Em caso de uma decisão surpreendente que retire Donald Trump da corrida à Casa Branca, analistas alertam para o risco de violência política nos Estados Unidos. Isso mesmo que seja difícil alegar de partidarismo na Corte de maioria conservadora e com três juízes indicados pelo próprio Trump enquanto presidente.

Foi o que destacou o diretor do Projeto de Salvaguarda da Democracia da Universidade da Califórnia Richard Hasen em entrevista ao Publico. "Minha maior preocupação relativa a uma decisão que desqualifique Trump não é o impacto na legitimidade do tribunal, mas sim o potencial de violência", disse ele.

"A ideia de que a Suprema Corte removeria da cédula um candidato, que tem milhões de seguidores fervorosos, em meio a uma eleição corre o risco de provocar agitação social durante um período de intensa polarização política. Isso não é motivo para o tribunal evitar fazer o que é correto. Mas é motivo para estar preparado para qualquer coisa, especialmente dada a história de Trump de incentivar a violência quando não consegue o que quer - o que nos trouxe a este ponto em primeiro lugar", concluiu.

Existe ainda a possibilidade de a Corte simplesmente não tomar uma decisão, o que poderia reacender aquelas ações já rejeitadas e dar impulso a outras novas que contestem a presença de Trump nas eleições. Caso o republicano vença nesse cenário de indefinição, a discussão poderia se arrastar até 6 janeiro de 2025 e recair sobre o Congresso no momento de certificar o resultado das urnas.

Afinal, o que diz a 14ª emenda?

Em suma, a seção 3 da 14ª emenda afirma que nenhuma pessoa que prestou o juramento de apoiar a Constituição e depois se envolveu em insurreição ou rebelião contra a mesma deverá ocupar qualquer cargo público nos Estados Unidos. Ainda segundo a Constituição, esse veto pode ser revertido pelo Congresso.

Depois da anistia aos confederados, em 1872, a lei ficou adormecida. Na história recente americana, foi aplicada apenas uma vez no ano passado para remover do cargo um servidor no Novo México, também pela participação na invasão ao Capitólio. O grupo que moveu a ação foi inclusive o mesmo que agora questiona se Donald Trump pode disputar a presidência, o Cidadãos pela Responsabilidade e Ética em Washington (CREW da sigla em inglês)

Do outro lado, há também quem acuse o presidente Joe Biden de violar outro trecho da seção 3 da 14ª emenda que fala sobre oferecer "ajuda e conforto" aos inimigos do país. Seria uma referência à crise na fronteira com o México, onde o fluxo recorde de imigrantes acirra a polarização entre democratas e republicanos.

O que diz a defesa de Trump?

A defesa de Donald Trump por sua vez explora o texto vago e o ineditismo da situação para refutar a tese de inelegibilidade. Um dos argumentos é que o texto especifica senadores e representantes do Congresso, mas não presidente. Portanto, segundo os advogados do republicano, o genérico "officer", que costuma ser usado para descrever funcionários públicos e autoridades não se aplicaria nesse caso.

O juramento também foi usado como argumento para dizer que a lei não vale para Trump. O argumento é que o presidente jurou "preservar, proteger e defender" a Constituição, não "apoiá-la", como prevê a emenda.

Outro ponto levantado pelos advogados do líder republicano é que a lei não poderia ser aplicada antes de passar por uma regulamentação no Congresso. Isso porque os mecanismos que haviam sido criados no pós-guerra Civil já foram revogados.

A defesa nega ainda que as ações do então presidente no 6 de janeiro sejam equivalentes a insurreição e destaca que esse crime específico não consta entre as acusações que ele enfrenta. Ainda segunda a defesa, mesmo que se argumente que Trump levou horas para conter a crise, uma "mera falha não constitui engajamento em insurreição".

O crime de incitar insurreição foi a base do segundo processo de impeachment que Donald Trump sofreu, no apagar das luzes do governo. O então presidente, no entanto, foi absolvido no Senado das acusações relacionadas ao 6 de janeiro. O republicano responde a duas ações criminais pela tentativa de reverter a derrota para Joe Biden naquele ano, sendo uma federal e outra movida pelo Estado da Georgia. As queixas, no entanto, não falam contemplam insurreição especificamente.

O que diz o outro lado?

Os autores da ação, por sua vez, argumentam que a presidência é um cargo do Estado, como sinalizado em outros trechos da Constituição. E que o juramento de "preservar, proteger e defender" a Constituição não só é equivalente a "apoiar", como é ainda mais abrangente.

Ainda segundo o grupo de questiona a qualificação do republicano para voltar a Casa Branca, a lei é "autoexecutável", ou seja, não precisaria ser regulamentada pelo Congresso, como já decidiu a Justiça em outras ocasiões.

Sobre a insurreição, o professor de direito Gerard Magliocca - chamado pelos autores da ação para testemunhar no Colorado na condição de especialista - destacou que o entendimento do termo era mais amplo na época em que a emenda foi criada.

"Era qualquer uso público de força ou ameaça de força por um grupo de pessoas para dificultar a execução da lei", disse ele ao lembrar, por exemplo, que parlamentar chegou a ser barrado por ter escrito uma carta na Guerra Civil em que defendia o uso da violência caso o seu Estado fosse invadido.

O que decidiu o Colorado?

A juíza distrital do Colorado, Sarah B. Wallace, concluiu em novembro do ano passado que as ações de Trump no 6 de janeiro foram, sim, equivalentes a uma insurreição. Mas ponderou que a 14ª emenda não se aplicaria ao caso e decidiu manter o líder republicano nas cédulas.

"Parte da decisão do Tribunal é a sua relutância em adotar uma interpretação que desqualificaria um candidato à presidência sem uma indicação clara e inequívoca de que tal é a intenção da Seção 3", escreveu a juíza no parecer de 102 páginas.

Naquela mesma semana, os Estados Minnesota e Michigan também decidiram manter o líder republicano na disputa ao responder a ações similares. Entendimento foi seguido por outros tribunais.

Acontece que no caso do Colorado, a Suprema Corte do Estado reverteu a decisão da juíza Wallace no mês passado. "A maioria do tribunal considera que o presidente Trump está desqualificado para o cargo presidencial de acordo com a seção três da Décima Quarta Emenda da Constituição", disse o parecer ao destacar que a decisão não foi tomada de forma leviana.

Donald Trump chegou a ter o nome impresso nas cédulas e agora o impasse no Colorado depende da decisão em Washington.

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