CNE proclama Nicolás Maduro ganhador sem publicar resultados definitivos

A Venezuela está sendo cobrada pela comunidade internacional para apresentar as atas eleitorais, com as quais é possível fazer a verificação dos dados

Publicado em 29/07/2024 às 18:38

O Conselho Nacional Eleitoral (CNE) proclamou o ditador Nicolás Maduro como o candidato vencedor nas eleições presidenciais realizadas no último domingo (28). "Nicolás Maduro está sendo proclamado presidente da Venezuela", afirmou o presidente do CNE, Elvis Amoroso, pouco depois das 13h locais (14h de Brasília).

O órgão, porém, não apresentou dados definitivos que embasem os resultados. Segundo anunciou ontem o CNE, Madurou teria vencido com 51% dos votos contra 44% de Edmundo González Urrutia, afirmando que os números já eram "irreversíveis" com 80% das urnas apuradas. A diferença entre o número total de votos, porém, foi de um pouco mais de 704 mil votos, o que levantou questionamentos sobre essa irreversibilidade.

A Venezuela está sendo cobrada pela comunidade internacional para apresentar as atas eleitorais, com as quais é possível fazer a verificação dos dados. Desde o fechamento das urnas a oposição denuncia não ter tido acesso aos documentos, apenas 40% deles, os quais endossaria a vitória de González Urrutia por 70% dos votos.

"Os venezuelanos expressaram a sua vontade absoluta de eleger Maduro como líder do país. As eleições decorreram num clima de respeito, paz e participação democrática, embora alguns tenham tentado gerar violência. Houve muitos ataques ao nosso sistema eleitoral, mas a capacidade moral e ética do pessoal da CNE superou todos os obstáculos", afirmou Amoroso.

"Estão tentando impor novamente na Venezuela um golpe de Estado de caráter fascista e contrarrevolucionário", denunciou o presidente esquerdista, reeleito para um terceiro mandato de seis anos, com base nos resultados divulgados pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE), alinhado ao governo.

Nas ruas do país, entretanto, aumenta a incerteza quanto aos próximos passos da oposição liderada por María Corina Machado e seu candidato, Edmundo González, que tentava pôr fim a 25 anos de chavismo na Venezuela e rejeita o resultado eleitoral.

O governo acusou a oposição de querer desestabilizar o país através da violência. O presidente do CNE denunciou um suposto ataque ao sistema eleitoral para "adulterar" os resultados, e o procurador-geral da Venezuela vinculou Machado ao mesmo.

"Contagem total dos votos"

Os Estados Unidos, que foram fundamentais no processo que levou à eleição, e os vizinhos Brasil e Colômbia, os três países que mais receberam migrantes venezuelanos, questionaram a apuração que deu a Maduro um terceiro mandato de seis anos com 51% dos votos, contra 44% de González, segundo o CNE.

O secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, expressou "séria preocupação" com o resultado, pedindo uma contagem "justa e transparente".

Brasília reafirmou "o princípio fundamental da soberania popular, a ser observado por meio da verificação imparcial dos resultados" da votação e assegurou que "acompanha com atenção o processo de apuração".

O governo de Gustavo Petro, o primeiro presidente de esquerda da história da Colômbia e aliado de Maduro, pediu a "contagem total dos votos, sua verificação e auditoria independente".

O presidente chileno, Gabriel Boric, por sua vez, afirmou que os resultados são "difíceis de acreditar", enquanto o Panamá retirou seu pessoal diplomático de Caracas e colocou "em suspenso" as relações bilaterais.

França, Espanha e a União Europeia pediram "total transparência" sobre o processo. E os governos de Argentina, Costa Rica, Equador, Guatemala, Panamá, Paraguai, Peru, República Dominicana e Uruguai exigiram, nesta segunda-feira, a "revisão completa dos resultados".

Além disso, anunciaram que solicitarão uma reunião urgente do Conselho Permanente da Organização dos Estados Americanos (OEA) para emitir uma resolução que salvaguarde a vontade popular.

"Em termos de ganhar alguma legitimidade internacional, que era um objetivo para Maduro, estas eleições foram um desastre", disse à AFP Rebecca Hanson, professora da Universidade da Flórida.

China, Rússia, Cuba, Nicarágua, Honduras e Bolívia parabenizaram Maduro. O presidente do México, Andrés Manuel López Obrador, disse que reconhecerá o resultado.

"Paz e respeito"

No poder desde 2013, Maduro tem a perspectiva de permanecer na Presidência por 18 anos, até 2031. Apenas o ditador Juan Vicente Gómez terá governado por mais tempo que ele, durante 27 anos (1908-1935).

A oposição venezuelana, que tentava pôr fim a 25 anos de chavismo, denunciou fraude na votação e se declarou vitoriosa, com 70% dos votos, contra 30% para Maduro.

"Violaram todas as normas", declarou González, representante da carismática e popular líder opositora María Corina Machado, impedida de disputar as presidenciais devido a uma inabilitação política.

"Isto não é mais uma fraude, isto é ignorar e violar grosseiramente a vontade popular", disse Machado.

A maioria das pesquisas favorecia a oposição, após anos de uma crise que fez encolher o Produto Interno Bruto (PIB) em 80% e levou ao êxodo mais de sete milhões de pessoas, segundo dados da ONU.

Maduro havia descrito esta eleição como uma encruzilhada entre "paz ou guerra" e advertiu que uma vitória da oposição poderia levar a um "banho de sangue".

"Ganha a tirania"

"Não era o que esperávamos", contou à AFP Veruska Donado, uma enfermeira de 34 anos. "Tínhamos esperança de que pelo menos houvesse uma mudança, mas sempre ganha a tirania e sempre ganha a trapaça. Sei que a única saída é ir embora", acrescentou.

Freddy Polanco, um chef de 54 anos, chamou o resultado de "fraude". "Queremos uma mudança para a Venezuela, que nossa família volte para a Venezuela, que as grandes empresas voltem ao nosso país".

A oposição denunciou irregularidades na apuração e a prisão de 150 pessoas ligadas à campanha, 37 delas nos últimos dois dias. Primeiro, porque seus fiscais foram impedidos de acessar os centros de votação para acompanhar o processo, e depois porque não conseguiram obter cópias das atas emitidas pelas máquinas de votação. Por lei, isso é um direito dos partidos e serve para comparar com o resultado oficial.

A coalizão Plataforma Unitária se uniu em torno de Machado após se afastar da eleição de 2018, que deu a reeleição a Maduro, por considerá-la fraudulenta.

O governo acusou a oposição de buscar desestabilizar o país por meio da violência. O presidente do CNE denunciou, de fato, uma "agressão contra o sistema de transmissão de dados que atrasou" a contagem, e pediu uma investigação.

Nestas eleições, estava presente uma pequena delegação do Centro Carter, que pediu ao CNE "que publique imediatamente os resultados das eleições presidenciais por colégio eleitoral". Um painel de especialistas da ONU emitirá um relatório confidencial.

 

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