Venezuela revoga permissão do Brasil para representar a Argentina
Decisão de Caracas foi tomada depois que a oposição denunciou o "cerco" à embaixada argentina, que está sendo guardada pelo Brasil desde 1º de agosto
A Venezuela revogou, neste sábado (7), a permissão concedida ao governo brasileiro para representar a embaixada argentina em Caracas, onde seis colaboradores da líder opositora María Corina Machado, que Caracas acusa de planejar “atividades terroristas”, permanecem refugiados.
A decisão de Caracas foi tomada depois que a oposição denunciou o “cerco” à embaixada argentina, que está sendo guardada pelo Brasil desde 1º de agosto, após o rompimento das relações com Buenos Aires e vários países da região que questionaram a reeleição do presidente Nicolás Maduro em meio a alegações de fraude.
"A Venezuela tomou a decisão de revogar, de maneira imediata, a autorização concedida ao Governo do Brasil para exercer a representação dos interesses da Argentina e seus cidadãos em território venezuelano, assim como a custódia das instalações da missão diplomática, incluindo seus bens e arquivos", afirma o texto divulgado pelo chanceler venezuelano, Yván Gil.
O governo brasileiro se mostrou surpreso com a decisão e anunciou que seguirá defendendo os interesses da Argentina.
"De acordo com o que estabelecem as Convenções de Viena sobre Relações Diplomáticas e sobre Relações Consulares, o Brasil permanecerá com a custódia e a defesa dos interesses argentinos até que o governo argentino indique outro Estado aceitável para o governo venezuelano para exercer as referidas funções", disse o Ministério das Relações Exteriores em um comunicado.
Segundo Caracas, a decisão foi notificada "por meio de canais diplomáticos".
“A Venezuela é forçada a tomar essa decisão devido à evidência do uso das instalações dessa missão diplomática para o planejamento de atividades terroristas e tentativas de assassinato (...) por fugitivos da justiça venezuelana que permanecem dentro dela”, diz a nota venezuelana.
Cerco
Agentes de segurança do Estado estão cercando a sede diplomática desde a noite de sexta-feira.
Neste “sábado, 7 de setembro, o cerco à residência argentina em Caracas, protegida pelo Brasil, continua. Cada vez mais presença de oficiais encapuzados. Eles fecharam a rua para veículos. Ainda estamos sem eletricidade”, postou no X Pedro Urruchurtu, um dos refugiados da oposição.
A AFP corroborou a presença de pelo menos quatro patrulhas na área, duas do Serviço Bolivariano de Inteligência (Sebin) e duas da Polícia Nacional Bolivariana (PNB), e a instalação de um posto de controle policial onde se verifica a identidade das pessoas que passam pela área.
Em 29 de julho, o Ministério das Relações Exteriores da Venezuela notificou os governos da Argentina, Chile, Costa Rica, Peru, Panamá, República Dominicana e Uruguai que deveriam retirar suas representações diplomáticas devido a suas posições sobre as eleições, nas quais Maduro foi proclamado reeleito para um terceiro mandato de seis anos.
"As alegações infundadas e absurdas, assim como as decisões unilaterais por parte do regime venezuelano, violando convenções internacionais sobre asilo diplomático e imunidade das missões diplomáticas, representam uma grave ameaça contra eles", publicou Machado no X.
"Solicitamos que sejam tomadas as providências necessárias para que sejam emitidos os salvocondutos para nossos companheiros, conforme estipulado pelo direito internacional", ressaltou a opositora.
Condenação internacional
O Ministério das Relações Exteriores da Argentina condenou a revogação do Brasil e disse que “qualquer tentativa de interferir ou sequestrar os solicitantes de asilo que permanecem” na “residência oficial será duramente condenada pela comunidade internacional”.
O governo brasileiro, por sua vez, destacou a “inviolabilidade das instalações da missão diplomática argentina, que atualmente abrigam seis asilados venezuelanos além de bens e arquivos”.
Outros governos da região, como Uruguai, Chile e Paraguai, expressaram sua preocupação.
"Manifestamos nossa rejeição à decisão e nossa solidariedade com os governos da Argentina e do Brasil pela situação que enfrentam no momento", afirmou a chancelaria chilena.
O Uruguai considera que a "situação constitui uma violação da normativa internacional e uma nova transgressão dos direitos dos cidadãos venezuelanos asilados nas instalações da representação diplomática argentina".
A vitória de Maduro foi anunciada pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE) e ratificada pelo Supremo Tribunal de Justiça (TSJ), ambos acusados de servir ao partido governista.
A oposição, por sua vez, está reivindicando a vitória do diplomata Edmundo González Urrutia, de 75 anos, substituto de Machado nas eleições presidenciais devido a uma desqualificação imposta ao líder pela Controladoria, que também é pró-governo. Ambos estão escondidos há mais de um mês.
Os resultados das eleições foram questionados pelos Estados Unidos, pela União Europeia e por vários países latino-americanos, que solicitaram a verificação dos votos. Até o momento, o CNE não divulgou as apurações detalhadas, conforme exigido por lei, alegando que houve um 'hackeamento'.
O anúncio dos resultados provocou protestos em todo o país que resultaram em 27 mortes, 192 feridos e 2.400 prisões.