OPINIÃO

Sérgio Gondim: A ciência é chata, mas é bonita

Conclusão apressada pode gerar prejuízos, pânico ou mortes

SÉRGIO GONDIM
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SÉRGIO GONDIM
Publicado em 02/10/2020 às 23:29
FILIPE JORDÃO/JC IMAGEM
Novo coronavírus já infectou milhões de pessoas ao redor do mundo - FOTO: FILIPE JORDÃO/JC IMAGEM

Por Sérgio Gondim

Tem que ser chata, exigente, perfeccionista, rigorosa, protocolar e metódica, caso contrário vai produzir pitacos falsos e não evidências. Tem que provar e comprovar, para que a partir de suas conclusões, o mundo tome o rumo certo. A conclusão apressada, superficial e equivocada, acaba gerando prejuízos, pânico ou mortes.

Durante uma pandemia existe uma pressa compreensível, mas que não deixa de ser inimiga da perfeição, resultando em mais idas, vindas e equívocos.

Quem não sabe que a pressa para obter uma vacina, aumenta o risco de insucesso e problemas depois. Quem não viu a informação sem provas de que assintomáticos não transmitem o vírus, provocando hesitação na formulação de políticas de prevenção. Que divulgar aos quatro ventos um tratamento como muito efetivo, antes dos estudos clínicos, faz a população relaxar na prevenção e sofrer mais contaminação. 

A pressa é justa, mas a boa intenção não é suficiente para atropelar os rituais da ciência.

Há pouco, “conclusões” ganharam manchetes sobre a transmissão e a reinfecção. Notícias de que a detecção do RNA viral (RT-PCR) por semanas no mesmo paciente deveria prolongar seu isolamento. À primeira vista faz sentido, mas a ciência é bonita por isso, será verdade se for demonstrado que além da presença do material genético do vírus, estiver ocorrendo replicação e transmissão. Muitos estudos demonstraram que a simples presença do RNA não indica que haja a transmissão, portanto para se chegar à recomendação de prolongar o isolamento, que teria enorme repercussão, seria preciso um passo a mais na pesquisa. Como exemplo, em 108 casos testados RNA positivos de forma persistente, em nenhum foi encontrado vírus infectante em culturas de células.

Com relação à reinfecção, existem critérios para defini-la, exatamente para não permitir que um falso positivo ou negativo em testes tão problemáticos, resultem em conclusão errada. Para afirmar que houve reinfecção não basta ter duas gripes, não basta ter dois testes positivos em tempos diferentes. O sequenciamento genético demonstrando cepas diferentes é exigência fundamental para comprovar a reinfecção. Se não for feito, continua sendo caso suspeito, deve ser publicado, mas não é uma evidência científica de reinfecção.

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