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Diferença de opinião é muito diferente de desconsiderar evidências científicas

A divulgação de dados equivocados ou falsos sempre existiu, mas repercutia pouco. Com as redes sociais, mesmo com poucos dando origem, o impacto é muito maior e transmite a ideia de verdade absoluta.

SÉRGIO GONDIM
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SÉRGIO GONDIM
Publicado em 04/03/2022 às 6:00
Carolina Antunes/PR
AVALIAÇÃO Análise de medicamentos foi feita sem a presença da Anvisa - FOTO: Carolina Antunes/PR
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Uma publicação do Jornal da Associação Médica Americana (JAMA) sugeriu que a divulgação de notícias médicas deveria ser disciplinada. Essa foi a opinião da maioria pesquisada, considerando que a disseminação, por médicos, de informações técnicas sem base científica, ameaça a saúde pública, além de comprometer a credibilidade dos profissionais na comunidade.

A divulgação de dados equivocados ou falsos sempre existiu, mas repercutia pouco. Com as redes sociais, mesmo com poucos dando origem, o impacto é muito maior e transmite a ideia de verdade absoluta.
Os principais assuntos que sofreram investidas durante a pandemia foram as vacinas contra a covid-19, o chamado tratamento precoce e o uso de máscaras.

Usando uma linguagem técnica convincente, mas direcionada para o público geral, sem capacidade de interpretar e distinguir o falso do científico, uma postagem afirmando que não havia nenhuma razão médica para recomendar a vacinação contra a covid-19 foi retuitada 1500 vezes e houve aumento significativo do número de seguidores de quem a postou.

Uma pesquisa onde foram apresentadas afirmações falsas sobre vacinas avaliou o impacto sobre quem acreditava nelas. Só 15% dos que acreditaram que a vacina implantava um microchip para monitorizar e controlar as pessoas, aceitou se vacinar. Entre os que não acreditaram, a procura por vacinação foi de 85%.
A ciência tem muitas áreas de penumbra, mas a divulgação de informações para o público geral, por médicos, não deveria ser baseada em crenças, pitacos e muito menos em mentiras. A população ainda acredita nos médicos e deles espera um mínimo de responsabilidade.

Os conselhos de classe são mais voltados para a relação médico-paciente e tem pouca capacidade de fiscalizar as redes sociais com opiniões direcionadas a seguidores. Em alguns países tem havido cobranças para que ampliem a atuação e se posicionem de forma mais clara e enérgica com relação à divulgação de notícias falsas que tanto repercutem sobre a saúde coletiva, ainda mais quando as decisões estão misturadas, como nunca, com a opção política do cidadão.

Diferença de opinião é muito diferente de desconsiderar evidências científicas.

O direito constitucional à liberdade de expressão não se aplica ao que se diz profissionalmente. Pode falar, mas deve ser responsabilizado. O sujeito não tem o direito de propagandear impunemente que a hipertensão arterial não deve ser tratada, que um tal chá é a cura de diabetes ou um vermífugo é o tratamento precoce contra o câncer, por mais atrativo que seja.

Isso é má prática e não liberdade de expressão.

Sérgio Gondim, médico

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