Opinião

Gesto omisso, covarde, neutro, silencioso ou cúmplice condena seu autor à antecâmara do esquecimento

O Governador Paulo Câmara parece não dispor nem da altivez moral do Rei da Dinamarca naquele momento grave que separaria a liberdade da servidão, nem a coragem política de Miguel Arraes e Hango Trench. Leia a opinião de Flávio Brayner

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FLÁVIO BRAYNER

Publicado em 01/06/2021 às 7:31
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O escritor Émile Cioran afirmou, certa vez, que nós “não escrevemos para os contemporâneos, mas
para nossos antepassados”. Esta frase pode parecer estranha, mas a questão aqui contida é “Sou, ou não, digno do que eles me deixaram?”.

Quando os Nazistas, após a invasão da Dinamarca, forçaram o Rei Christiano X a obrigar os judeus dinamarqueses a usar a estrela de David no peito esquerdo, o Rei respondeu que, neste caso, TODOS os cidadãos – inclusive ele!- a usariam, o que invalidaria completamente a estratégia discricionária nazista. Resultado: os Nazistas desistiram da idéia! Adorno (“A Personalidade Autoritária”) já tinha mostrado que o “autoritário para baixo” (para seus subordinados) é sempre um “covarde para cima” (seus chefes) e é por isso que os CRIMINOSOS DE ESTADO têm sempre o argumento à mão de “estarem obedecendo
ordens!”.

Há (ou não) uma relação entre a altivez moral e a coragem política de dizer “NÃO”? Não sei! O que sei é que Hango Trench, o Coronel da Polícia Militar do Estado de Pernambuco à época do primeiro governo de Miguel Arraes (1962-1964), no momento do golpe de 64, colocou a força policial do Estado de Pernambuco (que se diz herdeira da Insurreição Pernambucana de 1654) à disposição de Arraes
e de seu projeto, que não era nada mais nada menos do que introduzir um pouco de modernidade em nossas relações sociais e fazer com os trabalhadores tivessem, pela primeira vez por aqui, uma política pública que os amparasse.

O Governador Paulo Câmara parece não dispor nem da altivez moral do Rei da Dinamarca (sim, sou obrigado a aceitar, seria exigir muito!) naquele momento grave que separaria a liberdade da servidão, nem a coragem política de Miguel Arraes e Hango Trench (este sim, um herdeiro militar do que Pernambuco mais honrou: uma certa noção de República – hoje perdida que exigia coragem e sacrifício), o mesmo Miguel Arraes que Paulo Câmara, aliás, pretende suceder! O gesto omisso, covarde,
neutro, silencioso ou cúmplice é aquele que condena seu autor à ante-Câmara do esquecimento: é isso o que os espera! Quanto ao nosso Governador e seus subordinados militares, acho que são dignos uns dos outros: digno o patrão dos empregados, dignos os empregados do patrão, dignos ambos da causa moral
e política a que servem!

Flávio Brayner é professor da UFPE

*Os artigos são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a opinião do JC

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