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Nota sobre a coragem política

"A CORAGEM POLÍTICA não é sinônimo de heroísmo, não é necessariamente sacrifício da própria vida em função de uma causa: é um alerta". Leia a opinião de Flávio Brayner

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FLÁVIO BRAYNER

Publicado em 08/06/2021 às 6:12
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Quando George Politzer (1903-1942), filósofo, membro da Resistência Francesa e fundador da Universidade Popular nos anos 30, estava diante do pelotão de fuzilamento nazista que o executou, suas últimas palavras foram "- Idiotas, eu estou morrendo por vocês!". Independentemente do sacrifício "salvacionista" que aquela época inspirava e produzia, o que estava subjazendo àquela frase era "o que é a CORAGEM POLÍTICA?".

Quando aquele rapaz, na Praça Tiananmen (Pequim, 1989) se postou diante de tanques de guerra que iriam massacrar as multidões que exigiam instituições mais abertas e oxigênio democrático, ele passou para a História como símbolo de um tipo de "coragem", a política!

Quando Louise Michel (1830-1905), professora e poetisa que participou da Comuna de Paris, empunhou a Bandeira Negra do libertarismo popular, escreveu poemas dedicados à luta por direitos (inclusive das mulheres) e terminou condenada ao exílio na Nova Caledônia, ela estava praticando um tipo de "coragem", a política!

Quando a vereadora recifense Liana Cirne, minha colega de UFPE, se dirigiu sozinha e armada apenas com a consciência de seu direito à resistência, a uma viatura de polícia no meio de uma manifestação pacífica, ela reencarnava ali, na ponte Princesa Isabel, a dois passos do Palácio do Governo, os homens e mulheres que, através da História, disseram que nós não queríamos ser governados assim: não por estes homens, não com estes métodos, não com estes fins! A CORAGEM POLÍTICA não é sinônimo de heroísmo, não é necessariamente sacrifício da própria vida em função de uma causa: é um alerta. No gesto "politicamente corajoso" (nada a ver com o "politicamente correto"), o ATOR que o pratica nos chama a atenção para a indissociável relação entre Moral e Política, nos mostra que aquele que assume a responsabilidade de dirigir o destino dos cidadãos não precisa abrir mão da própria vida, mas precisa assumir o imperativo categórico de ser DIGNO DA CIDADE (que não é o conjunto das praças, ruas e casas, mas um passado e um destino comum e ao mesmo tempo plural) e, assim, inscrever seu nome na memória dos homens. Foi isto o que Liana Cirne fez naquele gesto, um gesto do qual nos lembraremos.

É isto a "CORAGEM POLÍTICA": o alerta que homens e mulheres - em tempos sombrios- nos fazem para que não esqueçamos os predicados que nos tornam Homens e sem os quais não passamos de ratos!

Flávio Brayner, professor Titular da UFPE

  *Os artigos são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a opinião do JC

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