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Rastilho de pólvora está lançado e aponta para um paiol prestes a explodir em conflito fratricida

"Se uma pessoa veste uma camisa do Brasil para passear, alguém imagina, é bolsonarista. Se outra usa uma camisa com a hashtag #vivaosus, alguém pensa, é esquerdalha". Leia a opinião de Otávio Santana do Rêgo Barros

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OTÁVIO SANTANA DO RÊGO BARROS

Publicado em 11/09/2021 às 6:00
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Passava da meia-noite. Havia desligado a televisão após a cerimônia de premiação paralímpica da prova de arremesso de peso classe F57, na qual Thiago Paulino obtivera o primeiro lugar com recorde mundial, mas filigranas técnicas de cartolas (sempre eles) o reposicionaram na terceira colocação.

Uma gritaria preencheu o silêncio da noite. Pensei tratar-se de um transeunte em um surto por abstinência de droga. Aos poucos, percebi que era uma discussão para além de acalorada, no ambiente de reunião familiar, em um outro prédio da quadra.

- Ele é ladrão! Só você não enxerga. Desde a faculdade sempre soube de sua tendência para apoiar a esquerda oligofrênica.

- Ladrão? A justiça já anulou todos os processos. Condenado injustamente, cumpriu pena calado para não tumultuar o país.

- Vai te catar, o uísque tá te fazendo mal. Tu tá igual a um zumbi de The Walking Dead. Tá falando besteira prá C!@#$%&.

- Posso ser zumbi, mas não sou fascista. O teu queridinho e a família vivem às custas de rachadinhas. Aliás, me diz como obter aquele financiamento camarada. A mansão já tenho em mente. Falta grana. Moradores foram até as janelas para acompanhar o que estava acontecendo. Alguns gritaram.

- Calem a boca alienados, quero dormir.

Na sala do entrevero, outra pessoa - um isentão - acalmou os ânimos. Imagino que tenha tirado a bebida alcoólica do ambiente e trazido café bem quente, sem açúcar, para os dois gladiadores noturnos.

Cenas como essa se repetem diuturnamente nos lares, ambientes de trabalho e até de lazer. Se uma pessoa veste uma camisa do Brasil para passear, alguém imagina, é bolsonarista. Se outra usa uma camisa com a hashtag #vivaosus, alguém pensa, é esquerdalha.

Os últimos eventos mostraram que o rastilho de pólvora está lançado e aponta para um paiol prestes a explodir em um conflito fratricida.

Está na hora de baixarmos as armas incondicionalmente, não por dialética na disputa de narrativas, mas por necessidade de sobrevivência do país. As pessoas perderam o senso de harmonia no ambiente de família. A sociedade perdeu o senso de convivência no ambiente cooperativo. Perderam o respeito por respeitar o pensamento adverso.

Os mestres de xadrez no poder precisam oferecer o empate como opção aos adversários e esses, cientes da impossibilidade de vitória unilateral, deveriam aceitar. Se necessário, um isentão tire o uísque da sala e traga café sem açúcar para acalmar os ânimos. O lendário Barroso, o Almirante, vivo diria: "O Brasil espera que cada um cumpra o seu dever." Paz e bem!

Otávio Santana do Rêgo Barros, general de Divisão R1

 

*Os artigos são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a opinião do JC

 

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