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Gilberto Gil, o mais novo imortal da Academia Brasileira de Letras

"As academias de letras devem ser e são do povo e não de uma dúzia fechada de intelectuais elitistas encastelados, livrescos e de poderosos governantes de plantão que nada produzem de relevante. Daí as notícias alvissareiras da eleição de Fernanda Montenegro e de Gilberto Gil". Leia o artigo de Arthur Carvalho

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ARTHUR CARVALHO

Publicado em 24/11/2021 às 6:07 | Atualizado em 25/11/2021 às 2:36
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O imbróglio começou há muito tempo, desde a fundação da Academia Francesa de Letras, e, pior do que briga de intelectual, só entrevista de Tite após os jogos. A dúvida era se somente poderia ingressar, no "sodalício", escritor ou também pessoas de destaque na ciência, nas artes, em suas profissões, na sociedade e...na política, como é de lei. Venceu a segunda corrente e assim foi feito.

Quando Machado de Assis e seu amigo Joaquim Nabuco quiseram fundar a Academia Brasileira de Letras, inspiraram-se no Estatuto da francesa - e este quiproquó atravessou o Atlântico e deitou-se aqui em berço esplêndido. Ganhou, outra vez, a decisão final da Academia Francesa, permitindo o ingresso na ABL de Getúlio Vargas e do General Aurélio de Lyra Tavares - nenhum dos dois com bagagem literária relevante.

Enquanto isso, os grandes cronistas João do Rio e Orestes Barbosa foram preteridos. João por ser um empedernido e escrachado carnavalesco, de preferências sexuais "fora da curva", e Orestes boêmio largado e contumaz iconoclasta. No entanto, tanto o primeiro quanto o segundo figuram na ilustre galeria dos maiores cronistas cariocas de todos os tempos, ao lado de Lima Barreto, Rubem Braga, Nelson Rodrigues e do próprio Velho da Montanha. Manual Bandeira dizia que nunca se elevou tanto a figura da mulher quanto em "Tu pisavas nos astros distraída", de Chão de Estrelas, por ele considerado um dos mais belos versos da língua portuguesa.

O pernambucano Marcos Vinícius Vilaça quebrou alguns desses tabus quando presidiu, com sua proverbial competência, a ABL - o mesmo fazendo Margarida Cantarelli, ao comandar a APL, levando, até ela, alguns de nossos compositores populares, superlotando o auditório em evento homenageando o grande Zé Dantas. Nessa tarde, na presença de Yolanda Dantas, viúva do compositor, e sua família, as freirinhas do Colégio Damas cantaram, entusiasmadas, que toda menina que enjoa da boneca é sinal de que o amor já chegou no coração.

Isso prova que as academias de letras devem ser e são do povo e não de uma dúzia fechada de intelectuais elitistas encastelados, livrescos e de poderosos governantes de plantão que nada produzem de relevante. Daí as notícias alvissareiras da eleição de Fernanda Montenegro, nossa rainha do teatro e da dramaturgia, e de Gilberto Gil, temperando o tradicional chá das cinco com a graça, o charme, o talento feminino e da modernidade, inteligência e do molho de pimenta malagueta. Apesar das nuvens carregadas, das chuvas e trovoadas, o Rio de Janeiro continua lindo.

Arthur Carvalho, Academia Pernambucana de Letras - APL

 

*Os artigos são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a opinião do JC

 

 

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