ARTIGO

Amaro Quintas e Mauro Mota

"Ambos completariam cento e dez anos em 2021. Meu pai, Amaro Quintas, em 22 de março; Mauro Mota, meu maior amigo e, diria, meu segundo pai, em 16 de agosto". Leia o texto de Fátima Quintas

FÁTIMA QUINTAS
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FÁTIMA QUINTAS
Publicado em 01/12/2021 às 6:06
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Difícil escrever sobre os dois. Mas os 110 anos de ambos me trazem insuperáveis reminiscências - FOTO: PIXABAY
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Eis-me diante de um grande desafio. Não sei se conseguirei elucidá-lo. Mas urge dedicar-me à história íntima de dois homens que representam para mim a dignidade na sua máxima expressão. Não somente a dignidade como o afeto. Ambos completariam cento e dez anos em 2021. Meu pai, Amaro Quintas, em 22 de março; Mauro Mota, meu maior amigo e, diria, meu segundo pai, em 16 de agosto. Datas que me comovem.

Momento de intensa saudade. Sensação que não sou capaz de definir. A ausência dos dois se torna uma lembrança indissolúvel de pessoas queridas e amadas, jamais esquecidas. Meu pai simboliza um exemplo de ternura e afeto, alguém que esteve sempre ao meu lado, assim como a mãe, ambos me acalentando com irretocável sentimento de amor, emoção e ternura. Desde criança, aprendi a admirar a dignidade na sua mais alta expressão. Emoções irretocáveis, assim como zelos apaixonados, que se manifestavam todos os dias, ou melhor, todas as horas. Nunca os vi relaxados nessa dimensão tão assídua quanto intensa. A mãe não trabalhava profissionalmente; àquela época, a vida familiar era diferente, uma exagerada discrição para as mulheres, a ponto de ofuscá-las de um mundo mais amplo e mais intenso. Resguardadas, reclamavam muito da solidão imposta. Desde cedo, recebi o incentivo materno para me profissionalizar. Amaro Quintas se excedia em tarefas; historiador, professor universitário, exercitava o ofício com estudos e muita dedicação. Meus pais expressavam o retrato da honradez. Em momento algum os vi em dúvida face a justa e incondicional dimensão do Ser. Símbolos de integridade e absoluta dedicação aos filhos e ao Humano.

Mauro Mota se tornou um dos maiores amigos de meu pai; sempre juntos, em momentos os mais difíceis. Desenvolvi uma ligação muito especial com o poeta. A bela versificação retratava o verdadeiro homem. Afetuoso, alegre por fora, triste por dentro, manejava a duplicidade com esperta sabedoria. Poucos diriam do seu profundo mergulho existencial. Dele recordo momentos indescritíveis. Humor à flor da pele, riso permanente, ao tempo em que a poesia exalava o húmus da emoção.

Difícil escrever sobre os dois. Dificílimo. Mas os 110 anos de ambos me trazem insuperáveis reminiscências. Lembro de tudo como se o tempo jamais tivesse avançado. Foi ontem; o passado faz parte incondicional da minha identidade. Longe de seus ecos não conseguiria aclamar a narrativa existencial.

Fátima Quintas, da Academia Pernambucana de Letras

 

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