Opinião

As voltas que a política dá

"Acompanhar o noticiário político nas últimas semanas (para não dizer nos últimos anos) é exercitar a memória e ir buscar na História, na Filosofia, nos clássicos, o 'socorro' para as aberrações que se apresentam como 'naturais' e 'legítimas'". Leia a opinião de Priscila Lapa

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PRISCILA LAPA

Publicado em 06/12/2021 às 6:46
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Por que voltamos a discutir obviedades, se o assunto é política, quando, diante de uma realidade socioeconômica cada vez mais complexa, poderíamos estar construindo e implantando uma agenda antenada com as demandas do século XXI? Acompanhar o noticiário político nas últimas semanas (para não dizer nos últimos anos) é exercitar a memória e ir buscar na História, na Filosofia, nos clássicos, o "socorro" para as aberrações que se apresentam como "naturais" e "legítimas". Os conceitos estão distorcidos, deteriorados pelas paixões e ilusões que a política proporciona.

Exemplos não faltam. Um partido decide pagar de democrático e realiza prévias para a escolha do seu candidato a presidente. Aí surgem milhares de denúncia de compras de votos, o sistema escolhido para a votação "cai" e interrompe o processo. Daí em diante, só confusão e falas desencontradas dos candidatos, até que a escolha se concretiza e o partido, sem dúvidas, sai dividido e sem uma proposição clara para o eleitor. Vencem nomes e não projetos.

Por falar em partido, o presidente da República finalmente escolheu aquele pelo qual disputará as eleições em 2022. Filiou-se ao PL - Partido Liberal, a nona legenda em seu histórico político. Nesse percurso, tentou fundar seu próprio partido, o Aliança Brasil, mas não teve sucesso. Foram acordos e conversas - explícitos e outros tantos desconhecidos - que agora posicionam, oficialmente, o presidente como membro do Centrão. Uma "nova política" tão defendida por ele e seus seguidores, agora abrigada no berço das forças que são experts em barganhas, tanto quanto o presidente é em adequar a realidade para caber em seus discursos.

Há também a costura para se ter uma chapa Lula-Alckmin, como forma de agradar gregos e troianos, nem que, para isso, cada um abra mão dos seus ideais originários, a fim de enfrentarem, juntos, os inimigos comuns. Se de fato se concretizar, será sem constrangimentos, ao que parece. Na cena pré-eleitoral, ainda temos a construção da candidatura de Sérgio Moro, com um método mais brasileiro impossível: primeiro se escolhe o nome, em torno de algumas coisas que ele pensa ou já fez; depois se escolhe um partido para abrigá-lo; segue-se coletando apoiadores e, por fim, se discutem ideias e uma plataforma eleitoral.

E a cereja do bolo é a definição, enfim, do nome de André Mendonça para o STF. Volta todo aquele debate sobre indicações com viés político para as Cortes incumbidas de julgar justamente os políticos. Mas o pior é a celebração pela vitória de um nome "terrivelmente evangélico", que fez a linha de defender o Estado laico para sagrar sua vitória na sabatina no Senado. O problema original é o critério de escolha, que antes era sutil, agora é escancarado, mostrando que a política é espaço de disputa, seja pelo que for, por quem for.

Priscila Lapa, cientista política

*Os artigos são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a opinião do JC

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