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A PEC da prisão em segunda instância

"Vários parlamentares e seus correligionários ligados ao Centrão poderão ser presos tão logo a emenda constitucional entre em vigor. Dessa forma, é muito difícil que a proposta apresentada seja aprovada". Leia o artigo de Adeildo Nunes

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Adeildo Nunes

Publicado em 16/12/2021 às 6:14 | Atualizado em 16/12/2021 às 11:39
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Os artigos 674 e 283 do Código de Processo Penal Brasileiro de 1941 e o art. 105 da Lei de Execução Penal de 1984, só autorizam o início da execução da pena privativa de liberdade, no Brasil, depois de comprovado o trânsito em julgado da sentença. Para a Constituição Federal de 1988 (cláusula pétrea), só é considerado culpado aquele que tem contra si uma sentença penal condenatória transitada em julgado, vale dizer, quando não cabe mais recursos judiciais. Entre 2016 e 2019, num dos maiores erros judiciários da história brasileira, a Corte Suprema resolveu autorizar a execução da pena antes desse trânsito em julgado, contrariando o princípio constitucional da inocência e que praticamente vigora em todos os países do mundo. Com as ações declaratórias de constitucionalidade nºs 43 e 44, julgadas em 07.11.2019, o mesmo STF refluiu e consolidou o atual entendimento: a pena só pode ser cumprida depois de esgotadas todas as vias judiciais.

É certo que em alguns países o réu é considerado culpado depois da condenação em 1ª instância, de logo iniciando-se a fase de cumprimento da pena. Entretanto, aqui no Brasil é diferente: depois de condenado o réu na 1ª instância, recursos processuais podem chegar até o Supremo Tribunal Federal, quase sempre tornando inútil o cumprimento da pena, posto esgotado o tempo da pretensão executória.

Essa mesma Constituição de 1988, depois da condenação do réu pela 2ª instância, ainda admite o recurso especial para o Superior Tribunal de Justiça e o recurso extraordinário para o Supremo Tribunal Federal, inviabilizando praticamente o trânsito em julgado. A Proposta de Emenda à Constituição que voltou a ser discutida no Congresso Nacional, põe fim aos recursos especiais e extraordinários, por conseguinte, dando causa ao trânsito em julgado da decisão condenatória após o julgamento da 2ª instância.

Muitos estão e sempre foram resistentes às mudanças: se aprovada a PEC em discussão no Parlamento, a nova redação atingirá a todos, indistintamente, inclusive a União, os Estados e os Municípios, que costumam procrastinar o pagamento aos seus credores e, a partir da sua aprovação, terão que se submeter às novas regras. Vários parlamentares e seus correligionários ligados ao Centrão poderão ser presos tão logo a emenda constitucional entre em vigor. Dessa forma, é muito difícil que a proposta apresentada seja aprovada. Eis aí uma faca de dois gumes.

Adeildo Nunes, Instituto Brasileiro de Execução Penal (IBEP)

 

*Os artigos são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a opinião do JC

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