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Uma decisão equivocada de Fux, presidente do STF, no caso boate Kiss

"Essa decisão equivocada de Fux, irá reacender a velha discussão sobre o cumprimento da pena por pessoas consideradas inocentes pela Constituição". Leia o artigo de Adeildo Nunes

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Adeildo Nunes

Publicado em 23/12/2021 às 6:00
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Na quinta-feira passada, 16.12, neste espaço, tratamos da inconstitucionalidade declarada pelo plenário do Supremo Tribunal Federal, em 11/2019, que por maioria de votos proibiu a imposição da prisão, para o cumprimento da pena, quando o réu, na data do julgamento, estivesse respondendo ao processo em liberdade. Na época do julgamento, o pleno do STF entendeu, apreciando o mérito das ações declaratórias 43 e 44, que a prisão do réu, para fins de cumprimento da pena, só poderia ocorrer quando houvesse o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, em exaltação ao princípio da inocência e às disposições contidas no art. 283 do Código de Processo Penal.

Em absoluto desrespeito àquela decisão soberana do STF, a Lei Anticrime (nº 13.964), que entrou em vigor em 20.01.2020, resolveu facultar ao juiz presidente do Tribunal do Júri a possibilidade de iniciar a execução provisória da pena, antes do trânsito em julgado da sentença, quando o réu viesse a ser condenado a uma pena igual ou superior a 15 anos de reclusão. Vale dizer: mesmo respondendo ao processo solto e sem dar causa a qualquer tipo de transtorno processual que pudesse comprometer o seu bom andamento, tornou-se possível ao juiz fazer expedir mandado de prisão, para o cumprimento antecipado da pena, mesmo que a Constituição assegure ao réu o direito de recorrer da decisão em liberdade.

Na mesma semana, findo o julgamento do Júri, os acusados pelos trágicos acontecimentos na boate Kiss, em Santa Maria, em 2013, quando 242 pessoas foram mortas em decorrência de um incêndio, o juiz-presidente do Júri decretou a prisão preventiva dos réus, mas a defesa de um deles tinha em mãos uma ordem de habeas corpus expedido pelo Tribunal de Justiça, garantindo-lhe a liberdade, até que houvesse a apreciação dos recursos.

No dia seguinte à realização do Júri, o ministro Luiz Fux, na presidência da Corte, resolveu desconsiderar a jurisprudência firme do próprio STF e, ao argumento de que os crimes foram graves, suprimindo a jurisdição do Superior Tribunal de Justiça, revogou a decisão liminar do Tribunal de Justiça e resolveu autorizar o cumprimento antecipado da pena por parte dos réus, num incongruente desrespeito à decisão majoritária do plenário da Casa em que preside.

Essa decisão equivocada de Fux, irá reacender a velha discussão sobre o cumprimento da pena por pessoas consideradas inocentes pela Constituição.

Adeildo Nunes, da Academia Brasileira de Ciências Criminais (ABCCRIM)

 

 *Os artigos são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a opinião do JC

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