OPINIÃO

Reeleger o presente governo seria suicídio

É hora de enxugar lágrimas, sair da letargia e prosseguir na lida de fazer deste país uma real Nação.

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Tarcisio Patricio

Publicado em 12/04/2022 às 8:00
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Era um bordão de minha vó, analfabeta, cachimbando e conversando sozinha, em uma cadeira de balanço. A cena, gravada na memória, é – penso – de quando eu ainda não chegara aos meus 10 anos. Até hoje o dito ressoa. O envelhecer traz o vezo de autobiografia: lembranças da infância e saudades de certos momentos da vida são recorrentes. Este resgate do baú da memória serve como pré-texto e pretexto para a crônica de hoje. Tomo de minha vó o dito de autocomiseração e autocrítica e derivo: um brasileiro poderia – hoje, e já há algum tempo – dizer: “choro com pena d’eu e do Brasil e mango de mim mesmo e da Nação”. Vejamos.
No nascer dos anos oitenta do século passado, o produto per capita da Coreia do Sul (então tão subdesenvolvida quanto o Brasil) iniciava afastamento da similar e então muito próxima média brasileira, em processo incessante, até hoje. Em 2020, os respectivos produtos per capita (em US$ a preços constantes de 2015 – fonte: Banco Mundial) eram, respectivamente: 31,361.08 e 8,228.78. A nossa média não alcança um terço da coreana (https://data.worldbank.org/indicator/NY.GDP.PCAP.KD?locations=BR). Em educação, conforme o PISA 2018, Coreia e Brasil guardam abismal distância (Leitura, Matemática, Ciências – OCDE, Resultados PISA 2018). Por ordem decrescente de proficiência em leitura (“foco do PISA 2018”), a Coreia está na posição 9 e o Brasil, na 57 – depois de Chile, Uruguai, Costa Rica, México, na mesma ordem. A literatura econômica registra que o Brasil está, há tempos, na “armadilha da renda média” – ou seja, não sai do grupo de países situados no estrato médio. A Coreia alçou o degrau de alta renda, e lá permanece.
Vamos a outros aspectos. O país se destaca, na literatura econômica, por quatro décadas de medíocre crescimento anual (1981-2020), e produtividade em ritmo de quase-estagnação, embora haja “ilhas setoriais” de progresso e êxito empresarial. Mas, incapaz de sequer arranhar mecanismos de captação do Estado pelo renitente patrimonialismo, agora tendo o “orçamento secreto” e o “fundão eleitoral” – haja bilhões de reais – como desmoralizantes excrescências. Tivemos o sucesso do SUS, a reconquista da moeda em 1994, avanços em termos de programas sociais, mas o Bolsa Família (agora, Auxílio Brasil) opera como moeda de troca eleitoral, seguindo sempre-maior programa de combate à pobreza – atestado de que há algo de errado, e muito. E cá estamos, em pântano de corrosão da Democracia, três anos de incompetência no MEC, tornado balcão – impensável! –, afora outros sérios danos. Ademais, o que veio de inovação institucional, a exemplo da autonomia do Banco Central, foi apesar do atual presidente.
Reeleger o presente governo seria suicídio. É hora de enxugar lágrimas, sair da letargia e prosseguir na lida de fazer deste país uma real Nação.


Tarcisio Patricio é economista e professor aposentado (UFPE).

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