Na educação, Pernambuco pode aprender com Pernambuco

É preciso, entretanto, ter vontade política e uma política de continuidade, como no caso das Escolas de Ensino Médio em Tempo Integral

MOZART NEVES RAMOS
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MOZART NEVES RAMOS
Publicado em 16/05/2022 às 4:00
FELIPE RIBEIRO/JC IMAGEM
Alunos da Escola em tempo integral Creusa Dornelas - FOTO: FELIPE RIBEIRO/JC IMAGEM
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O estado de Pernambuco logrou êxito quando, em 2004, iniciou a implementação de uma política de Escolas de Ensino Médio em Tempo Integral (EMTI), que o tornou uma referência nacional. Não se trata apenas de mais tempo na escola – pois costumo dizer que mais tempo numa escola chata é castigo para o aluno –, mas uma escola de educação integral em tempo integral.

O jovem quer uma escola que caiba na vida, e ele a encontra nesse modelo pedagógico no qual o aluno é o centro do processo. Essa política tirou Pernambuco das últimas posições do ranking nacional de ensino médio e o colocou nas primeiras posições. Um avanço extraordinário e de vários governos. Hoje é uma política de estado, e não de governo.

Apesar dessa exitosa política de um ensino médio de qualidade para nossa juventude, muitos jovens pernambucanos nem sequer conseguem chegar ao ensino médio; ficam pelo caminho do fluxo escolar, e muitos não chegam nem mesmo a concluir o ensino fundamental.

Esses jovens fazem parte do grupo de alta vulnerabilidade social, engrossando a fileira dos chamados “nem-nem”, que nem estudam nem trabalham.

Outra parcela de jovens que engrossam esse grupo é constituída daqueles que, apesar de terem concluído o ensino médio, não desenvolveram as habilidades necessárias para se inserir no mundo do trabalho ou não foram suficientemente preparados para ingressar no ensino superior – ou ainda lhes faltou uma política de pós-médio. Para esses jovens, o ensino médio representa o teto.

Se, por um lado, Pernambuco foi capaz de há dezoito anos mudar a cara do ensino médio com as escolas de tempo integral, tornando-se, como disse, uma referência nacional, contraditoriamente, é um dos estados da federação que apresenta um dos maiores percentuais de jovens no grupo dos “nem-nem”.

Uma pesquisa feita pela IDados para o jornal Valor Econômico mostrou que o estado de Pernambuco tem 31,5% de jovens na faixa etária de 15 a 29 anos nesse grupo, ocupando a 5ª. posição. A média nacional é de 23,7%, enquanto Santa Catarina é o estado brasileiro com a menor taxa, de 13,1%.

Infelizmente, a tendência é que quanto maior for a taxa de jovens “nem-nem”, maior será a taxa de homicídios juvenis. Os dois estados brasileiros que apresentam as maiores taxas de homicídio entre jovens, em pesquisa publicada na UOL, são o Rio de Janeiro (102,8 mortes por 100 mil jovens), seguido de perto pelo estado de Pernambuco (101,5). A taxa média nacional é de 51,7.

Há em curso, por outro lado, uma mudança importante na pirâmide demográfica, na qual a base de jovens deve diminuir substancialmente até 2030. Se não investirmos agora na juventude, vamos perder o bonde da história.

Este nosso primeiro texto é apenas um alerta para os próximos governantes pernambucanos sobre o que fazer. Pretendemos continuar a explorar esse assunto no próximo artigo, a ser publicado neste JC de 30 de maio.

Penso que Pernambuco pode aprender com Pernambuco. É preciso, entretanto, ter vontade política e uma política de continuidade, como no caso das Escolas de Ensino Médio em Tempo Integral.

Mozart Neves Ramos é titular da Cátedra Sérgio Henrique Ferreira da USP de Ribeirão Preto
e professor emérito da UFPE.

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