OPINIÃO

Política, economia e o caminho da democracia

À parte questões teóricas, o fato é que Política e Economia estão na origem da vida social, cada vez mais correlacionadas, ora em percursos paralelos, ora em rota da colisão.

GUSTAVO KRAUSE
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Publicado em 12/02/2023 às 0:00 | Atualizado em 12/02/2023 às 9:24
Marcello Casal JrAgência Brasil
"O ideal seria que os políticos acreditassem que, em princípio, "orçamento bom é orçamento equilibrado". - FOTO: Marcello Casal JrAgência Brasil

Política e Economia são práticas e experiências que remotamente acompanham a espécie humana.
Levar comida à boca tanto é um fato prosaico de sobrevivência quanto a ação terminal de sofisticada cadeia produtiva.
Mandar e obedecer é um ritual do poder e, consequentemente, afirmação da Política com base em nobres princípios ou no impulso tirânico e destrutivo da própria Política.
À parte questões teóricas, o fato é que Política e Economia estão na origem da vida social, cada vez mais correlacionadas, ora em percursos paralelos, ora em rota da colisão.
Na atualidade, o foco na correlação, entre elas, tem sido uma preocupação constante. Aos entrechoques, não faltam menções irônicas e contraproducentes. O Implacável Thomas Carlyle pespegou à economia o termo depreciativo “ciência sombria”.
Em 1992, o marqueteiro de Clinton, James Carville eternizou o bordão colérico “É a economia, estúpido!” para a comunicação entender a conjuntura e conquistar o eleitor americano.
A expressão ganhou o mundo e se adaptou à fórmula espectral: “É a política, estúpido!” para vencer eleições.
“Os economistas, diz Todd Buchholz, não são a causa das más notícias, mas simplesmente seus mensageiros”. E não se alimenta, sadicamente, da severa escassez, apenas, mostra que escolhas têm consequências.
Por sua vez, a Política não é a alegre utopia da abundância. É um forte vínculo entre a economia e o mundo. Não é um teatro de ilusões. Trata-se de ampla atividade que, em momentos decisivos, deve contar mais com heroísmo do que com ambiguidades. O ideal seria que os políticos acreditassem que, em princípio, “orçamento bom é orçamento equilibrado”.
Neste sentido, o terremoto que aterrorizou a sociedade brasileira gerou aparentemente oportunidade histórica para buscar consensos entre Política e Economia: a primeira, defendendo a centralidade da democracia, em ambiente de serenidade ideológica, capaz de assegurar, pragmaticamente, o equilíbrio macroeconômico; a segunda, superando os falsos dilemas das “responsabilidades fiscal x social” e construindo uma prosperidade sustentável que é o alicerce da estabilidade democrática.

“A passagem da renda média para a renda alta está associada ao aperfeiçoamento democrático”, frase de autoria de Edmar Bacha que faz jus à excelência de uma notável geração de economistas ao escrever magnífico artigo (Valor Econômico, edição de 18?12023), sob o título Democracia, autocracia e crescimento econômico.
O autor, além da cultura humanista, associa sólidos conhecimentos acadêmicos à realpolitik tanto que mereceu o apelido de “Senador” como negociador da equipe do Plano Real e, com exímia mineirice, convencer o senso comum do Presidente Itamar sobre sofisticados conceitos que embasaram o mais bem-sucedido plano de estabilização econômica da história contemporânea.
Artigo mais oportuno, impossível. Atropela acenos demagógicos, diatribes populistas e enxerga horizontes estratégicos a partir de consistentes pesquisas e dados.
Começa jogando luz no crescimento anual do PIB no período da ditadura brasileira (1964-1988) de 6,3% e 7,1% na democracia (1946-1963). Por sua vez, a taxa média anual da inflação no regime militar foi 58% contra 22% do período democrático.
A partir de então, vai fundo aos problemas, senão para explicar, explorar a relação da democracia com a renda média que aprisiona o PIB per capita (2013-2022) na América Latina, Ásia e Europa Oriental .
Com base na classificação adotada pela Democracy Matrix da Universidade de Würzburg, o autor maneja cinco tipos de regimes: democracias funcionais, democracias deficientes (Brasil), regimes híbridos (elementos autoritários e democráticos), autocracias moderadas e autocracias plenas.
Em seguida, associa 162 países por nível de renda (World Development Indicators do Banco Mundial) em três grupos:
Grupo 1 – 54 países com PIB per capita de até US$ 7,3 mil; Grupo 2 – 54 países de mais de US$7,3 mil até 22,1 mil; Grupo 3 – 54 países de mais de US$22,1 mil.
Ao associar os regimes políticos e o PIB per capita, temos: a democracia funcional dominante no Grupo 1 de renda alta; Grupo 2, renda média, prevalece democracia deficiente; Grupo 3, renda baixa, convivem democracia deficiente, sistema híbrido, autocracias moderadas e plenas.

Outros dados relevantes estão demonstrados no Relatório do Crescimento, em 2008, tendo Bacha como coautor. Toma, como ponto de partida, 12 países, no pós-guerra cujos PIBs cresceram 7% ou mais por 25 anos.
Entre as cinco características comuns, ressalta a dos “governos comprometidos, capazes e críveis”. A maioria é democrática com duas autocracias China e Omã.
Para finalizar, o autor revela estudo feito em doze países, no pós-guerra que venceram armadilha da renda média, entre eles, os tigres asiáticos. Ricos e democráticos.
Com governo crível, sociedade crítica e vigilante, a democracia e a prosperidade saciarão grande a fome e sede de Justiça dos brasileiros.
A conferir.

Gustavo Krause, ex-governador de Pernambuco

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