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Joaquim Cardozo vem sendo muito esquecido, sobretudo em sua terra

É justo que receba todas as homenagens, inclusive as mais humildes, como esta que faço neste artigo, que é mais a do ex-aluno da Escola de Engenharia do que a dum intérprete

ROBERTO PEREIRA
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ROBERTO PEREIRA
Publicado em 02/04/2023 às 9:10
YACY RIBEIRO/ JC IMAGEM
Joaquim Cardozo é considerado um dos nomes mais influentes na Arquitetura Moderna internacional - FOTO: YACY RIBEIRO/ JC IMAGEM

Corriam os longes de 1974, quando fui visitar Joaquim Cardozo, numa casa simples na Av. João de Barros. Sorrindo, recebeu-me com palavras e gestos, presenteando-me com o seu livro – esgotado – Poesia completa, com um oferecimento escrito com a tinta da generosidade.

Encontrei um homem ainda abatido pela perfídia, quando sobre ele caíram as injustiças diante de acusações que insinuavam haver errado o cálculo da Gameleira, um prédio de Belo Horizonte, que, vindo abaixo, provocou quase 80 mortes. O laudo dos engenheiros que apuraram o fato isentou-o de culpa, numa comovente unanimidade.

Quem calculou o Conjunto Pampulhas, prédio que o credenciou ao cálculo de grandes obras da construção da Capital Federal, da Catedral de Brasília, do Palácio do Planalto, do Palácio da Alvorada, da Igreja N. S. de Fátima e do Congresso Nacional, todas de grande complexidade, somente deveria merecer o respeito do Brasil e do mundo.

Ele e o projetista renomado, Oscar Niemeyer, considerado um dos nomes mais influentes na Arquitetura Moderna internacional, pioneiro na exploração das possibilidades construtivas e plásticas do concreto armado.

Em Cardozo confluíam – e fluíam – matemática e poesia. Tímido, exclamou: “Eu não sou bem um poeta. Minha vida é que é cheia de hiatos de poesia.”

Se acompanharmos a sua poesia, desde “As Alvarengas,” de 1925, até o seu desenlace, veremos que a sua inspiração foi sempre o Recife. Recife de velhas ruas “cúmplices das trevas e dos ladrões,” ainda lírica sob a luz antiga dos lampiões mortiços: “Trêmula, dos lampiões / Desce uma luz de pecado e remorso, / e o Cais do Apolo acende os círios / Para velar de noite o cadáver do rio.”

Em 1925, ele sente a trepidação das ruas tumultuosas. Mas persiste o “Recife romântico dos crepúsculos das pontes / E da beleza católica do rio.”

Não podemos encontrá-lo fora dessa legenda – a do Recife. O Recife dos cajus de setembro, dos ares macios que veem passar as almas dos fidalgos holandeses, onde as almas dos heróis antigos vêm rezar.

Esta visualização nunca mais deixou Cardozo, até instalar nesta cidade o seu Congresso dos Ventos, que sopram e conduzem as alvarengas dos seus versos, velas soltas até Olinda, que o poeta celebra e na qual tem essa visão mística: “Neste silêncio, neste grande silêncio, / No terraço da Sé, / Sentindo a tarde vir do mar, tão doce e religiosa, / Como a alma celestial de S. Francisco de Assis.”

Cardozo vem sendo muito esquecido, sobretudo em sua terra, todavia, é justo que receba todas as homenagens, inclusive as mais humildes, como esta que faço neste artigo, que é mais a do ex-aluno da Escola de Engenharia, em cuja formatura o teve como patrono, do que a dum intérprete – que eu jamais poderia ser – da sua alta Poesia, tão do Recife, quanto de qualquer dimensão humana e intelectual.

Esse poeta vive e viverá, como num dos seus livros, “sob o signo estrelado”, na eternidade que alcançaremos no espaço poético, para onde fugimos em busca de paz interior e de beleza.

Roberto Pereira, ex-secretário de Educação e Cultura de Pernambuco e membro da Academia Brasileira de Eventos e Turismo (Abevt). (robertop@elogica.com.br)

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