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Xenofobia, ainda o 8 janeiro e a sabedoria de Tom Jobim

Definitivamente, como afirmado por Tom Jobim certa feita, "o Brasil não é para principiantes". Não há marasmo por aqui

Gustavo Henrique de Brito Alves Freire
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Gustavo Henrique de Brito Alves Freire
Publicado em 21/04/2023 às 17:16 | Atualizado em 21/04/2023 às 17:17
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Nosso Brasil mais parece ser o real muso inspirador do famoso brinquedo de parques de diversões, a montanha-russa - FOTO: Reprodução

Dois episódios recentes, o último mais ruidoso que o primeiro, dão sentido ao presente artigo. Em princípio a reflexão estacionaria no evento mais distante (13/4), porém, depois a ela agregou-se o evento mais próximo (19/4), separados entre si por menos que uma semana. Definitivamente, como afirmado por Tom Jobim certa feita, “o Brasil não é para principiantes”. Não há marasmo por aqui.

Comece-se pelo começo. Incidente com características de xenofobia. Mais um, aliás. Momentos que aprofundam feridas que nunca cicatrizam. Dessa vez, a conduta partiu de onde menos se poderia esperar: a Justiça. Chega a ser desolador.

O Alto Comissariado da ONU para Refugiados define a xenofobia como a externalização de atitudes, preconceitos e comportamentos que rejeitam, excluem e frequentemente difamam pessoas, com base na percepção de que elas são estranhas ou estrangeiras à comunidade, sociedade ou identidade nacional. É algo que não dá para tolerar. Não é civilizado. Não é normal.

A propósito, Popper e seu racionalismo crítico, expresso no seu método hipotético-dedutivo, já trazia há várias décadas que, no ambiente social, inevitavelmente, como a experiência histórica ensina, a tolerância infinita leva ao desaparecimento da tolerância e ao caos. Aceitando o intolerante, o tolerante se aniquila, mormente quando a tolerância ilimitada vulnerabiliza à investida camuflada da liberdade de expressão.

Cometido o ato xenofóbico, desculpas tardias são como pílulas de farinha. O racismo é um delito de mera conduta. O que não se pune é a simples elaboração intelectiva. Mas as desculpas extemporâneas, quando premidas pela repercussão concreta do que foi afirmado e suas consequências, não absolvem quem as protagoniza. O resultado já se consumou.

Foi o que ocorreu com um magistrado paranaense de 2ª Instância, em sessão de julgamentos, a pretexto de comentários sobre operações da Polícia Federal e escândalos políticos. Sua frase não merece ser replicada aqui. Seria reviolentar toda a população nordestina.

Propondo cirúrgico, perfeito, contraponto ao padrão das desculpas que, nessas situações, aparecem em notas divulgadas quando as consequências já estão lançadas, o desabafo do advogado sergipano Cezar Britto, ex-Presidente da OAB Nacional, em 18/04, quando de sessão deliberativa do Conselho Federal: “Só sabe a dor do preconceito quem tem a cor, a etnia, o lugar de nascimento. Esse preconceito que se repete não é caso isolado. Ele se repete a todo instante, a todo mundo diz-se que somos raças menores. É o segregacionismo que justifica esse preconceito e é hora de dizer basta”.

Dito isso tudo e ainda nesse nosso Brasil que mais parece ser o real muso inspirador do famoso brinquedo de parques de diversões, a montanha-russa, já que o noticiário por aqui nunca cai no enfadonho, senão pelo contrário, chego ao segundo e derradeiro tópico que gostaria de abordar no artigo, com a brevidade possível, propondo a quem se ocupar da sua leitura uma reflexão pertinente.

Trata-se do episódio das imagens de circuito de vídeo do 8 de janeiro, posicionadas no Palácio do Planalto, mostrando o Ministro-Chefe do Gabinete de Segurança Institucional em comportamento de aparente inação ante a sanha dos invasores depredadores. O Ministro pediu demissão, mas não saiu da berlinda. Precisa se explicar. Até que isso ocorra no bojo do devido processo legal, descabem os prejulgamentos. Enquanto o inquérito não encerrar, a sabedoria recomenda o silêncio prudente da espera.

A todos é assegurada a presunção de inocência e assim para que o Estado siga sendo de Direito e não de Exceção. Suspeitos não se tornam automaticamente réus, e, mesmo réus, não são por presunção culpados, fora o que fazem jus a uma apuração equidistante do instinto impulsivo das ruas e redes sociais. São inaceitáveis fogueiras inquisitoriais, linchamentos morais, cancelamentos. Não se trata de uma defesa de ninguém, mas de uma premissa inegociável para um processo justo. Ou todo mundo sai perdendo. Provada a culpa, pague-se por ela; caracterizada a inocência, que se tenha o direito de seguir em frente de cabeça erguida. Impunidade, nem pensar.

Gustavo Henrique de Brito Alves Freire, advogado

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