OPINIÃO

Inteligência artificial na medicina

Ao contrário do que se possa imaginar, a inteligência artificial poderá devolver o médico à sua origem, oferecendo-lhe o tempo necessário para estar onde é insubstituível: ao lado do paciente, lugar de onde nunca deveria ter saído.

SÉRGIO GONDIM
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SÉRGIO GONDIM
Publicado em 19/05/2023 às 0:00 | Atualizado em 19/05/2023 às 13:48
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Qual é a linha tênue entre a uma conversação na vida real e a inteligência artificial? - FOTO: Pexels

São tempos de muita informação e comunicação, com menor conexão olho no olho. Por sinal, ao digitar a palavra olho nesse momento, antes de completá-la, aparece na tela a imagem de um olho humano, oferecendo-se para substituir o texto. Ao digitar vinho, no h, aparece um tinto. O sistema não considerou que poderia preferir um branco. Com remédio, surge uma cápsula, mas com a palavra hospital, juro, coincidentemente a digitação travou ao clicar na imagem.

Já dizia meu pai: "tenho um medo danado das coincidências".

É realidade, o cirurgião opera remotamente sem tocar o paciente, a tomografia computadorizada pode ser realizada aqui e laudada por especialistas da Índia ou mesmo dispensando o profissional. Algoritmos de diagnóstico e tratamento são testados quanto a eficácia e segurança em todo o mundo.

As aplicações da inteligência artificial (IA) são incontáveis e abrem novos horizontes para a medicina. Pode gerar modelos de casos para ensino, oferecendo bibliografia e explicações objetivas, pode ajudar pacientes a entender a ficha médica imediatamente, mesmo na ausência do médico. Pode identificar dados epidemiológicos antes invisíveis, mostrar sinais precoces de alarme e alocar recursos antes que infecções possam disseminar e devastar o mundo. Filtrando, agregando, classificando, extraindo informações geográficas e genéticas, acoplando dicionários de várias línguas, já tem sido possível identificar alguns surtos ameaçadores bem no início. Tem ajudado a identificar e enfrentar a resistência bacterina aos antibióticos. Poderá ser capaz de ler a mente humana através da análise do fluxo sanguíneo para as diferentes áreas do cérebro, como sugere um estudo publicado no jornal Nature Neuroscience?

Durante a pandemia houve um grande aumento de consultas virtuais, com questões genéricas ou específicas. O ChatGPT é capaz de escrever textos sobre vários assuntos, como os produzidos por humanos e em 65 dias passou a contar com mais de100 milhões de usuários. Não foi desenvolvido para questões médicas, mas até que ponto a IA pode ser uma fonte para respondê-las? O Jornal da Associação Médica Americana (JAMA) publicou o resultado de uma pesquisa comparando as respostas oferecidas aos pacientes em um fórum sobre problemas de saúde. Foi demonstrado que aquelas obtidas através de IA eram significativamente superiores às fornecidas por médicos, tanto em qualidade como em empatia. Os estudos prosseguem, visando definir qual será o impacto de tal constatação sobre a saúde das pessoas.

A probabilidade de palavras estarem juntas por análise de bilhões de fontes, oferecendo respostas imediatas se autocompletando com impressionante velocidade substituirá o médico com mais acertos e menor número de equívocos?

As pesquisas prosseguem aceleradas e muitos alertas estão na pauta, considerando que medicina envolve muito mais do que processar informações associando palavras e conceitos.

Se inicialmente a IA for direcionada para elaboração dos sumários de alta hospitalar, dos atestados médicos, pedidos de autorização de procedimentos aos planos de saúde, solicitações de internamentos e prorrogações, relatórios, laudos, guias e justificativas, se disponibilizar automaticamente a bibliografia referente a cada caso, bem como o resultado imediato de exames, se listar de pronto todas as atualizações disponíveis, se assumir a enorme burocracia que hoje ocupa o tempo do médico, já representará um grande avanço. Ao contrário do que se possa imaginar, a inteligência artificial poderá devolver o médico à sua origem, oferecendo-lhe o tempo necessário para estar onde é insubstituível: ao lado do paciente, lugar de onde nunca deveria ter saído.

Sérgio Gondim, médico

 

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