Eu tenho uma amiga chamada Teresa
Minha amiga Teresa é poesia e amor entalhadas em pedra...pedra preciosa. Dela diria da altura dos 103 anos, Edgar Morin: um ser uno e múltiplo, humanista acima de tudo.
Tenho várias, mas uma é especial: Maria Teresa Caminha Duere. Amizade, cumplicidade, comunhão de ideias: sólida convergência de afetos e, no nosso caso, improvável identidade na ação transformadora da política.
Observe, caro leitor, estou falando da Política movida por ações emancipadoras em relação a mais persistente e humilhante condição humana: a pobreza absoluta. Hoje, subsiste de forma mais grave do que em qualquer momento da História: a desigualdade, fenômeno atual, tão devastador quanto a emergência climática e nossa incapacidade de exercer uma governança adequada à dimensão desses desafios.
Pois bem, era membro da Operação Esperança com o integral apoio de Dom Helder, a quem ela se referia, respeitosamente, como o Dom, e sobre acusações infundadas da violência no campo, Teresa afirma: “A gente nunca pegou num facão, a não ser para cortar cana”.
Diante dos riscos da perseguição política, ouviu os conselhos paternos e “saiu pelo mundo”. São Paulo, Rio, o exílio no Chile e tangida para o México por conta da ascensão ao poder do General Pinochet. Com a ajuda de solidários amigos, fez o caminho de retorno ao Brasil, passando pelo Rio e, graças a Elvira Nogueira, admiradora de Dom Helder e mulher de Paulo Nogueira Batista presidente da Nuclebras, Teresa “semiclandestina” e uma “terrível guerrilheira” conseguiu emprego numa empresa considerada organização da área de segurança nacional. Beleza! Uma obra da alma gentil do Patropi.
Em 1979, fui escolhido Prefeito do Recife pelo Governador Marco Maciel. A mais “sutil” referência era a de “Prefeito Biônico”. Nascera pagão, ou seja, sem o batismo das urnas. Rebento do “sistema”. Eram as mais leves e bem-humoradas críticas com que era tratado, em especial, pela aguerrida oposição pernambucana.
Paciência! Tinha que trabalhar ainda mais. Formei uma equipe jovem e talentosa, nela incluído, o Secretario de Obras (o equivalente à área atual da mobilidade urbana) Pedro Duere, irmão de Teresa; o outro irmão é o atual Senador Fernando Duere, suplente do Senador Jarbas Vasconcelos.
Não era difícil encontrar excelentes quadros técnicos. Porém, precisava de gente com sensibilidade política, compromissos explícitos e convicções com uma gestão que assumisse prioridade para além do Recife, cidade-postal e chegasse com recursos suficientes para mudar o retrato da periferia, pendurada nos morros e mergulhada no charco da cidade anfíbia.
Consegui juntar mais de duas dezenas de pessoas comprometidas com políticas públicas que ouvissem a voz das ruas e se indignassem com as condições de vida das pessoas massacradas pela pobreza,
A ninguém, jamais cobrei convicções ideológicas num quadro de complexa transição política. Ouvi de gente mais experiente: você vai ter problemas com os órgãos de segurança. Marco Maciel segurou a barra,
Foi nesse ambiente que soube que Teresa queria voltar para o Recife. Pedi a Pedro um encontro com ela. Percebi a grandeza humana de Teresa. Não fez da militância um currículo. Fez, sim, uma opção de consciência: botar a mão na massa para uma luta sem trégua em benefício dos excluídos, com a condição de “que não fosse exigido nada politicamente”.
O tempo foi me mostrando que a casca era dura, mas a fruta era fina; a coragem de fazer atendia aos apelos da crença inabalável associada a uma inata prudência política (paciência, habilidade); ao assumir a gestão social das obras estruturadoras, avisou: “Prefeito, vou mobilizar uma porção de gente de esquerda”. E disse a um amigo comum: “Ele foi cobrado, mas não estava nem aí”.
A partir daí, criou sólidos alicerces e, com a sustentação deles, desmanchou a dicotomia esquerda x direita como uma bolha de sabão. Insubmissa, não fosse respeitado o anseio pelos resultados, no espaço em que atuasse: Executivo, Legislativo, Controle de Contas. Que o diga a respeitosa e intocada Política/Amizade com Jarbas Vasconcelos, Mendonça Pai e Filho, Marcos Vinicius Vilaça.
Minha amiga Teresa é poesia e amor entalhadas em pedra...pedra preciosa.
Dela diria da altura dos 103 anos, Edgar Morin: um ser uno e múltiplo, humanista acima de tudo.
Gustavo Krause, ex-governador de Pernambuco