OPINIÃO

Comunismo - o que é isso?

Podemos culpar "o imperialismo" pela capacidade nacional de jogar oportunidades no lixo?

TARCISIO PATRICIO DE ARAUJO
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TARCISIO PATRICIO DE ARAUJO
Publicado em 04/07/2023 às 0:00 | Atualizado em 04/07/2023 às 7:52
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O MPF pediu duas vezes que o denunciante complementasse a denúncia, sem sucesso. Cidadão não se manifestou - FOTO: Internet

Completo, no próximo dezembro, cinco anos de presença regular nesta coluna, afora contribuições esparsas em anos anteriores. O ponto de partida para a produção regular foi uma entrevista a Ângela Belfort (JC), em agosto 2016 ('Economista diz que até uma porta no lugar de Dilma faria a economia melhorar'). Laurindo me disse, então, que a peça havia 'viralizado', vocábulo que, para mim, era coisa recém-descoberta. Cerca de três semanas antes da consumação do impeachment da então presidente em 31/08. Aquela entrevista foi o marco-zero de minha vida de articulista, ao induzir convite para artigos regulares. Comecei a arriscar - acertando, errando, e aprendendo. Agora, a terceira e sucessiva conversa em que corro riscos maiores, sempre tentando fugir do formalismo de praxe da Academia universitária. O que segue é conseqüência - e complemento - dos dois últimos artigos sobre capitalismo.

Socialismo e comunismo são quase sinônimos, na retórica da direita tosca. [No Brasil, tal corrente é representada pelo presidente que se foi e, agora inelegível, ainda estará no palco por não se sabe quanto tempo].

Ora, socialismo - na interpretação marxista-leninista - deve ser entendido como o estágio entre o colapso do capitalismo e o advento do comunismo, no sentido de sociedade comunal. Não foi dado prazo para tal transição; seja por Marx, seja por Lênin. No socialismo seria abolida a propriedade privada e mantido, por certo tempo, o Estado regido pela ditadura do proletariado. Depois viria a sociedade sem Estado e sem classes, comunal e democrática, sem mercado e, quiçá, sem moeda. Nunca tivemos, nunca teremos isso - a História referenda tal resultado e não há perspectiva de algo parecido. Como já bem sabido, e aqui repetido, a social-democracia européia veio a ser o melhor dos mundos, principalmente na Escandinávia, assim se mantendo - a despeito da onda liberal desde os tempos de Thatcher, no Reino Unido (1979-90).

A história não foi generosa com Marx e tudo deu errado, desde o começo em 1917 (Revolução Russa); errado ponto de partida: de lugar e de estágio do capitalismo - a Rússia, em especial, sempre foi, e é, sociedade de czares, agora com Putin, czar "moderno". E, no flanco do capitalismo maduro, não se deu a ruptura prevista por Marx. Nas experiências de "socialismo", a ditadura do proletariado deu em ditadura de castas. E a democracia voou no pau.

Em cima de queda, o coice da microeletrônica - que traz mudanças rápidas e profundas, em particular no âmbito ideológico/comportamental, alma-mater da sociedade. No contexto de hoje, o que diabo significam "classes sociais" e "luta de classes"? A equação tornou-se mais complexa e luta de classes é conceito pouco útil para análises socioeconômicas. E proletariado, conceito apropriado ...ao século XIX, é essencialmente coletivo de trabalhadores industriais, personagem central na análise marxista, e hoje minoria da chamada classe trabalhadora. O coletivo de mão de obra é predominantemente de trabalhadores de comércio e serviços, embora a indústria seja, indiretamente, importante geradora de oportunidades e ocupações em diversas atividades não industriais. O MEI, o motorista de uber e congêneres (automóvel, motocicleta; transporte, entrega de encomendas), os prestadores de serviços em geral seriam componentes do "proletariado"?

E o que o Brasil tem a ver com isso, neste mundo tão diferente do projetado por bem-intencionados filósofos e humanistas de diversas áreas?

Este país é o de sempre, pelo menos desde as guerras comerciais. Para nós, desde a expansão ultramarina, como fala Celso Furtado, no livro Formação Econômica do Brasil. O que está por ser feito, no plano dos estudiosos, é interpretar o novo e moderno embrulho em que poder e domínio geopolítico continuam sendo fatores-chave. Visão de império, sim. Os principais são EUA, CHINA, RÚSSIA. 'Nosotros' somos pintos. Mas, podemos explicar nossas mazelas pela interferência do 'imperialismo'? É tudo culpa da CIA e dos EUA? Pois é, tenho amigos comunistas - já em idade provecta, como eu, e uso aqui um vocábulo não-moderno, politicamente esquecido - que jogam todos nossos males na conta do "imperialismo". E a CIA seria autor de peso.

O pressuposto que há muito defendo é: nossos males não podem ser atribuídos a um inimigo externo. Acredito que não se deve minimizar o potencial dos males resultantes da dominação por castas e da desigualdade, do atraso educacional, do fato de termos jogado fora muitas oportunidades. E isso que costumamos ver no Brasil, desde sempre. Ademais, no campo da política, o componente nefasto do uso da microeletrônica no jogo de desinformação e fake news, essa praga universal. Mundo muito mais complicado do que o do imperialismo via invasão pura e simples, coisa hoje desnecessárias, na maioria dos casos; basta a dominação cultural. Podemos culpar "o imperialismo" pela capacidade nacional de jogar oportunidades no lixo?

Tarcisio Patricio, doutor em Economia e professor da UFPE, aposentado.

 

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