OPINIÃO

Sobre a igualdade salarial entre homens e mulheres

Emprestando todo o nosso apoio a qualquer política de igualdade entre os gêneros, assunto aqui debatido, esta é mais uma lei que movimenta mais a vida política que o mercado de trabalho propriamente dito.

FÁBIO ANDRÉ DE FARIAS
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FÁBIO ANDRÉ DE FARIAS
Publicado em 11/07/2023 às 0:00 | Atualizado em 11/07/2023 às 7:46
FREEPIK/BANCO DE IMAGENS
Mulher trabalhando - FOTO: FREEPIK/BANCO DE IMAGENS

Num debate como o da igualdade salarial entre homens e mulheres, ou qualquer outra política de paridade de remuneração, é sempre bom iniciarmos dizendo: somos a favor. Se a ênfase deve ser dada logo de começo é porque qualquer reflexão crítica sobre o tema tende a ser rechaçada antes mesmo que o leitor chegue ao final do texto. Dito isto, imaginamos que a Lei 14.611/2023, que dispõe sobre a igualdade salarial e de critérios remuneratórios entre mulheres e homens, é mais uma daquelas proposições que confundem os problemas e que, se auxilia no enfrentamento do que pretender combater, com absoluta certeza não adentra no cerne da questão.

Qualquer um que leve alimento para si ou à sua família por meio da atividade que implique na aplicação do Direito do Trabalho se fez as seguintes perguntas: mas essa igualdade jurídica não existia? O art. 5º., inciso I da Constituição não garantia tal direito ao dizer que todos são iguais perante a lei? O art. 7º. XXX não assegura isso quando fala da "proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil"? O que podemos deduzir do art. 461 da CLT onde já estava escrito: "sendo idêntica a função, a todo trabalho de igual valor, prestado ao mesmo empregador, no mesmo estabelecimento empresarial, corresponderá igual salário, sem distinção de sexo, etnia, nacionalidade ou idade"? Ou seja, no plano jurídico estávamos, como estamos, "prenhes" de normas que garantem a igualdade. O problema é que esta criança não nasce e provavelmente não virá à luz se não desafiarmos estruturas sociais que estão bem consolidadas. Expliquemos.

Se alguém imagina que um empregador no Brasil, no mesmo período de tempo e num mesmo estabelecimento paga salários diferentes para homens e mulheres, exceto quando autorizado para tal pela distância na data da contratação, com absoluta certeza vive num país diferente do Brasil. Se alguém encontrar a exceção é para confirmar a regra. Ao longo desses 30 anos no exercício de atividades jurídicas nunca nos deparamos com este fato nos milhares de processos que tivemos contato. Ou seja, dentro de uma mesma empresa esta norma não foi infringida, pelo menos que nos seja do conhecimento. Se existem homens ocupantes da função de, por exemplo, professor ensinando Educação Física percebendo mais que mulheres, professoras de Educação Física, trabalhando para empregadores diferentes esta lei não poderá ser reivindicada, o que demonstra sua inocuidade, seu vazio aplicativo.

O exemplo acima nos leva ao que entendemos ser o ponto nodal da questão o qual tentaremos resumir. É certo que homens brancos estão no topo da escala salarial, sendo seguidos por mulheres brancas, homens negros e mulheres negras. Acontece que esta distorção está no mercado de trabalho visto como um todo e não nas relações de emprego quando observados empregadores individualmente considerados e isso a lei não pretende solucionar, até porque envolve uma transformação mais global da sociedade.

Observemos o que nos diz a publicação Demografia Médica no Brasil de 2023, no quesito distribuição por sexo biológico: em 2000, tínhamos 35.8% de médicas contra 48,5% no ano 2022. Parece-nos razoável inferir que se tempo de trabalho implica numa melhor remuneração nesta atividade é mais provável encontrarmos mais médicos mpercebendo melhores salários que médicas e que, provavelmente, esta distorção venha a encontrar algum equilíbrio ou até inverter-se com o passar dos anos na medida em que as gerações anteriores de profissionais desta área venham a se afastar por morte, aposentadoria ou qualquer outra motivação e que e mercado de trabalho tenha mais mulheres que em tempos passados.

O que é importante verificar é que este equilíbrio salarial provavelmente terá uma relação maior com a quantidade de mulheres adentrando nos espaços de ensino do que propriamente uma equiparação salarial dentro das próprias empresas.

Se algum estudioso se dispuser a comparar profissões médicas com as dedicadas à enfermaria poderá encontrar uma quantidade maior de homens na primeira que na segunda, uma quantidade maior de enfermeiros e enfermeiras do que de médicos e médicas e um salário maior na primeira atividade de saúde que na segunda. A conclusão a que chegará nosso estudioso é que as mulheres percebem um salário menor, em média, que os homens no mercado de trabalho de saúde, no entanto, não poderá dizer que um mesmo empregador pague, num mesmo município e tempo de serviço, salários menores às enfermeiras ou médicas que aos enfermeiros ou médicos. Talvez, no caso da enfermaria, chegue-se à conclusão oposta, tendo em vista que a esta é uma profissão predominantemente feminina a muito mais tampo.

Emprestando todo o nosso apoio a qualquer política de igualdade entre os gêneros, assunto aqui debatido, esta é mais uma lei que movimenta mais a vida política que o mercado de trabalho propriamente dito.

Fábio André de Farias, desembargador e corregedor do TRT6

 

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