Educação

"Um debate urgente"

Russel Jacoby (O fim dos intelectuais) já tinha nos advertido: os intelectuais estão, hoje, reclusos no fechado mundo universitário e abandonaram aquele espaço público de discussão de ideias que ficara marcado, no século passado, por gente como Zola ou Sartre!

Flávio Brayner e Cibele Rodrigues
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Flávio Brayner e Cibele Rodrigues
Publicado em 24/07/2023 às 18:48
Divulgação/Secretaria de Educação de Olinda
Já existe um grande acúmulo no campo das pesquisas em educação que precisam ser levadas em conta na hora discutirmos como pode ser essa escola - FOTO: Divulgação/Secretaria de Educação de Olinda

Russel Jacoby (O fim dos intelectuais) já tinha nos advertido: os intelectuais estão, hoje, reclusos no fechado mundo universitário e abandonaram aquele espaço público de discussão de ideias que ficara marcado, no século passado, por gente como Zola ou Sartre!

Acho que não preciso ficar repetindo para meus leitores que sou um defensor intransigente da educação pública: aquela que oferece a cada um de nós a possibilidade intelectual e moral de participar da comunidade humana.

Porém, mais do que pública, ela precisa ser também “republicana”: precisa “produzir” um espaço comum onde possa ser vista – como instituição- e ver o que ocorre na sociedade inclusiva.

Esse é o motivo pelo qual, agora que estou na pós-graduação em educação da Universidade Rural (como Professor Visitante), decidi oferecer um pouco de visibilidade pública sobre o que ocorre, o que que se faz ali e, sobretudo, qual a relevância social de seus feitos.

Solicitei, inicialmente, à professora e pesquisadora Cibele Rodrigues (Fundaj-UFRPE), do Mestrado de Educação, Culturas e Identidades que nos oferecesse um rápido panorama do tipo de atividade e pesquisa ali desenvolvidas. Recebi imediatamente o texto a seguir, que tomei a liberdade de adequá-lo às exigências e limitações de um artigo jornalístico.

* * *

“É motivo de comemoração a notícia que o Congresso aprovou (recentemente) do Projeto do Governo para ampliação das Escolas de Tempo Integral e, como apontou a senadora Teresa Leitão (PT-PE), é preciso agora discutirmos a qualidade dessa ampliação de horas.

Os rumos dessa discussão não podem se resumir à melhoria das notas nos resultados do IDEB que roubaram a cena da discussão sobre a qualidade. A proposta do governo federal é bem-vinda no sentido que prevê investimentos nunca antes vistos na história para essa ampliação do tempo na escola.

Já existe um grande acúmulo no campo das pesquisas em educação que precisam ser levadas em conta na hora discutirmos como pode ser essa escola. Pelo menos duas questões são importantes, as condições de trabalho para essa oferta e o currículo dessa jornada ampliada. Como está previsto no atual Plano Nacional de Educação, mais horas nas escolas inclui investir na melhoria dos espaços, nas condições de trabalho e na alimentação escolar.

Primeiro no que se refere às condições de trabalho significa a melhoria de salários, sobretudo para garantir a possibilidade de dedicação exclusiva - essa não é mera retórica, mas, como base em pesquisas que temos realizado na Fundação Joaquim Nabuco, no âmbito do Programa de Pós-graduação em Educação, Culturas e Identidades (associado à UFRPE).

A possibilidade de termos docentes trabalhando em uma só instituição potencializa seu envolvimento com o projeto político-pedagógico das escolas, dando possibilidades de maior acompanhamento às trajetórias dos/das estudantes.

Atualmente, para completar sua renda, docentes se desdobram trabalhando em diversas instituições, causando cansaço e adoecimento. Assim, reiteramos que o tema da valorização docente é fundamental ao tratarmos da escola em tempo integral.

Em pesquisa realizada na Fundaj em 2014, os resultados demonstraram que a ampliação da jornada escolar no ensino fundamental foi aprovada e se tornou desejada, segundo 92,9% dos gestores participantes.

A pesquisa envolveu 1.637 escolas (distribuídas em 861 municípios), sorteadas a partir de uma amostra probabilística (com erro amostral de 5%) que utilizou o cadastro cedido pelo Ministério da Educação, contendo as 45.492 escolas que estavam com o PROGRAMA MAIS EDUCAÇÃO funcionando naquele período, levando para as escolas de ensino fundamental, atividades de artes, esportes, português, ciências e matemática - ainda em caráter experimental e com limitações.

Em contexto de pobreza, a chegada de equipamentos para música e esportes representou uma grande novidade. Nas respostas dos 1.232 alunos entrevistados, ao serem perguntados sobre novidades aprendidas no Programa, 83,6¨% praticaram um novo esporte, enquanto 73,2% tiveram acesso às artes, 48,2% aprenderam a tocar um instrumento. E 82,1% deles respondeu que o Programa influencia na melhoria das suas notas escolares.

Além dessa pesquisa quantitativa nacional, fizemos entrevistas em 30 escolas que visitamos para fazer entrevistas foi o impacto das aulas de artes e esportes na melhoria da aprendizagem. Aulas de dança, música, as bandas fanfarras que tornavam a escola mais alegre.

Poderia enumerar diversos casos, no qual a escola se converteu em um equipamento cultural potente para bairros de periferia - sendo espaço de socialização, de produção de saberes e de lazer.

É importante ressaltar que existem concepções diferentes de educação em disputa em qualquer sociedade, mas as pesquisas apontam que as artes humanizam, prática de esportes contribuem para a aprendizagem e para despertar o desejo por aprender.

Como pesquisadora, posso afirmar que fui convencida desse impacto, ao ouvir os sujeitos e suas experiências. É um resultado incomensurável e extremamente importante. É do direito à educação que se trata de oferecer o melhor e não se contentar com o menos mal possível: não podemos concordar com a ideia de escolas pobres para os pobres”.

* * *

Convidarei, mais adiante, professores--pesquisadores da UFRPE para exporem publicamente, aqui no JC, aquilo que fazem e a importância do que fazem. Evito, dessa forma, aquela reclusão monástica a que se refere Jacoby. Ou como diria Goethe em suas últimas palavras “Mais luz, mais luz!”.

Cibele Rodrigues, pesquisadora e professora da Fundaj. Flávio Brayner, professor emérito da UFPE e visitante da UFRPE

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