25 de julho, Dia Internacional da Mulher Negra, Latino-Americana e Caribenha, é uma data-convite para repensarmos acerca da existência e resistência das mulheres negras nos diversos espaços da sociedade, seu protagonismo e como todas as pessoas podem e devem contribuir na luta contra o machismo e racismo na sociedade.
A mulher negra no contexto social brasileiro é vulnerabilizada tanto por seu gênero quanto por sua raça e se encontra na base da pirâmide social. Essa realidade se confirma por diversos índices, por exemplo: maior índice de analfabetismo, maioria das trabalhadoras, principais vítimas de violência doméstica e obstétrica. Também são minoria na alta administração das organizações, nos cargos de liderança em geral, nos cargos públicos eletivos, no sistema de justiça.
Falar de justiça social significa refletir sobre os espaços ocupados pelas mulheres negras em todos os segmentos da sociedade, inclusive no sistema de justiça. Se mulheres representam menos de 40% da magistratura brasileira, os números relacionados às mulheres negras merecem atenção especial. Segundo dados do CNJ: “os maiores percentuais estão entre juízas substitutas (16,3%) e juízas titulares (11,2%). E, ainda que sejam 12,1% de mulheres desembargadoras negras, percentual maior que o de desembargadores negros (7,8%), o número absoluto é menor que no grupo masculino: são 45 desembargadoras e 93 desembargadores”. A exemplo, o Supremo Tribunal Federal nunca teve uma ministra negra.
O poder de definir políticas públicas ou decidir conflitos sociais quase nunca está nas mãos de mulheres negras.
Exemplo disso está em uma decisão exarada há sete dias pela Justiça do Trabalho da Bahia que negou indenização a uma mulher negra de 53 anos que, desde os seus sete anos teria começado a realizar serviços domésticos da casa de uma família em Salvador. No total, ela passou mais de quatro décadas na residência, sem qualquer remuneração. São inúmeros os casos noticiados diariamente envolvendo racismo estrutural e trabalho escravo de mulheres negras em pleno século XXI.
Em relação ao papel das mulheres negras dentro do sistema de justiça, a dificuldade em identificá-las especialmente nos Tribunais ainda é flagrante, sejam locais ou superiores.
Diversos movimentos de juristas e não-juristas lutam para colocar uma mulher negra na próxima vaga a ser indicada para o STF, tribunal que nunca teve uma mulher negra em sua composição. Para além das mulheres que já fazem parte do sistema de justiça, há inúmeras mulheres negras com produção intelectual e atuação profissional compatíveis com o exercício da função, alinhadas à defesa dos direitos humanos e da democracia.
Estamos diante de uma oportunidade histórica no âmbito da Suprema Corte de nosso país de romper com anos de exclusão e desigualdade social.
O processo de ocupação precisa ser feito. A Justiça não pode se subtrair de sua missão de garantir igualdade de direitos e oportunidades para todas as pessoas.
Se é "verdade que a encruzilhada interseccional em que se encontram as mulheres negras lhes reserva um lugar de peculiar subalternização social, essa mesma encruzilhada é o espaço do encontro com a diversidade, do cruzamento de (outras tantas) identidades", como diz Lívia Sant'Anna Vaz.
É encontro de potência e transformação!
Em verdade, não são as mulheres negras que precisam da justiça, mas o contrário: a Justiça precisa das mulheres negras, pois somente assim efetivarão as metas do Pacto pela Equidade Racial e poderão ser o maior exemplo de inclusão e diversidade para legitimar a sua atuação constitucional e o seu dever de fomento e cobrança de práticas sociais antirracistas.
Ana Paula Azevêdo e Manoela Alves, diretoras do Instituto Enegrecer