Opinião

O preso brasileiro, seus direitos e as suas obrigações

O preso provisório, pela Constituição de 1988, é tido como inocente, porque para considerá-lo culpado há necessidade de que haja uma condenação criminal definitiva

Adeildo Nunes
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Adeildo Nunes
Publicado em 26/07/2023 às 21:58
SENADO/DIVULGAÇÃO
Preso, no Brasil, nem sempre foi sujeito de direitos - FOTO: SENADO/DIVULGAÇÃO

Antes de tudo, cumpre diferenciar a figura do preso provisório daquele já condenado. São diferentes no que tange à situação jurídica de cada um e, por consequência, em relação aos seus direitos e obrigações. Preso provisório é aquele que está detido por força de uma prisão provisória, temporária. Exemplo maior é aquele recolhido na prisão com base numa prisão preventiva.

O preso provisório, pela Constituição de 1988, é tido como inocente, porque para considerá-lo culpado há necessidade de que haja uma condenação criminal definitiva. Nota-se, de logo, que o preso provisório, dentro do estabelecimento prisional ou em prisão domiciliar, faz jus a todos os direitos inerentes a quem vive solto, exceto a liberdade.

Já o preso condenado, agora considerado culpado, é aquele que tem contra si uma sentença penal condenatória transitada em julgado, isto é, quando a sentença é definitiva e não cabe mais recursos judiciais contra a condenação.

Preso, no Brasil, nem sempre foi sujeito de direitos. Somente em 1957, com o advento da Lei Federal nº 3.274, sancionada pelo então presidente Juscelino Kubitschek, oportunizou-se ao detento se filiar à previdência social, contudo, sem recursos financeiros para arcar com as mensalidades previdenciárias, praticamente a lei ficou só no papel. Embora todas as Constituições Republicanas promulgadas de 1891 a 1946 tenham estipulado que o Estado deveria preservar a “integridade física e moral do recluso”, sabe-se que foi este o único direito assegurado ao preso.

Foi com a aprovação das Leis 7.209 e 7.210, em 1984, quando houve a sanção presidencial de uma nova parte geral para o Código Penal de 1940 e da Lei de Execução Penal, com as abrangentes reformas realizadas depois de vigentes, que finalmente o preso brasileiro viu-se reconhecido como sujeito de direitos, pois antes disso, como já registrado, preso era, somente, sujeito de obrigações. Aliás, durante as ditaduras de Vargas (1936) e Militar (1964), há registros históricos comprovando a morte, a tortura e os maus-tratos que comumente eram praticados contra presos políticos.

Significa dizer, bem por isso, que antes de 1984 o detento brasileiro não era equiparado a um ser humano, posto não sendo ele detentor de direitos, a sua situação jurídica por certo não era equivalente aos demais brasileiros que gozassem da liberdade.

Como já ventilado, a partir de 1984 a lei exigiu que houvesse a conservação, ao preso, de todos os direitos não atingidos pela perda da liberdade, impondo-se a todas as autoridades o respeito à sua integridade física e moral (art. 38, Código Penal). Embora se reconheça que o dispositivo aprovado, até hoje, não tenha sido aplicado na prática, é vero afirmar que em termos históricos foi uma grande conquista da humanidade,particularmente para os presos brasileiros.

Porém, foi a Lei de Execução Penal quem consagrou os efetivos direitos ao recluso, no momento em que estabeleceu que ao condenado e ao internado (doente mental) devem ser assegurados todos os direitos não atingidos pela sentença ou pela lei. Em síntese, cumprindo pena privativa de liberdade, o apenado só é obrigado a cumprir aquilo que esteja previsto na sentença condenatória ou na lei. Assim, sendo ele
condenado em regime semiaberto, é ilegal custodiá-lo no regime fechado, pois aqui, além do descumprimento do teor da sentença, estará consumado o excesso de execução.

O Estado sempre estará cometendo uma ilegalidade absoluta e um consequente abuso de autoridade, quando exige mais ou menos daquilo que esteja previsto na sentença condenatória. O detento, lado outro, é obrigado a cumprir as regras disciplinares que estão previstas na lei ou nos regulamentos internos de cada prisão. Um detento indisciplinado, além de se submeter a punições na ordem administrativa (advertência, repreensão, restrição de direitos, isolamento celular e até a sua inclusão em regime disciplinar diferenciado), pode, também, ser punido judicialmente, com a sua regressão de regime, perda de parte dos dias remidos conseguidos pela educação ou pelo trabalho, além da proibição para a aquisição de direitos.

Contudo, foi a Constituição Federal de 1988, de todas as normas constitucionais, a que mais, expressamente, definiu uma série de direitos ao preso. Vejamos alguns deles: a) nenhum preso pode ser submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante; b) escolha do seu culto religioso e da sua crença; c) inviolabilidade de correspondências e comunicações telefônicas; d) trabalho, assistência à saúde, jurídica, social, material e educacional; e) reunião pacífica; f) receber informações e peticionar junto aos órgãos públicos; g) individualização da pena; h) permanência com os filhos menores de 14 anos e o direito de amamentar para as mães presas; i) ampla defesa e recursos judiciais; j) advogado público ou particular; l) ser considerado inocente até o trânsito em julgado da sentença condenatória; m) prisão exclusivamente em flagrante ou por ordem judicial; n) se preso, sua família e o juiz devem ser comunicados; o) identificação de quem efetua a prisão; p) liberdade provisória, com ou sem fiança, dentre outros tantos (art. 5º, CF/1988).

Outros direitos existem no ordenamento jurídico nacional, mormente aqueles previstos na Lei de Execução Penal, em leis estaduais e em regimentos internos.

Adeildo Nunes, juiz de Direito aposentado, professor, doutor e mestre em Direito, advogado criminalista, sócio do escritório Nunes & Rêgo Barros – Advogados Associados.

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